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Kelly Fernandes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Qual o tamanho da sua pegada de carbono?

Renato Stockler/Folhapress
Imagem: Renato Stockler/Folhapress

Colunista do UOL

17/03/2023 04h00

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Antes de avançar na reflexão sobre a Pegada de Carbono, é importante explicar o que significa esse termo e como ele surgiu. O termo Pegada Ecológica, que também mede a Pegada de Carbono, foi cunhado na década de 1990 por dois pesquisadores canadenses, Mathis Wackernagel e William Rees, como uma metáfora para o impacto da humanidade no planeta. Mas quem criou a primeira calculadora de emissões individuais para medir a Pegada de Carbono foi uma companhia petrolífera britânica, o que é minimamente curioso, não?

Portanto, o termo Pegada de Carbono originalmente está relacionado com campanhas de publicidade com o objetivo de tirar uma companhia petrolífera do foco da responsabilização do uso de combustíveis fósseis diante do agravamento da mudança climática, individualizando uma pauta que é social.

Um dos problemas desse discurso é que coloca o foco no consumidor genérico, tira o foco da marca e preserva a reputação das empresas a despeito dos danos ambientais causados. Contudo, a verdade é que atualmente cerca de 100 empresas são responsáveis por 70% das emissões globais.

Isso não significa que você, enquanto indivíduo, pode ir dormir tranquilo logo após a leitura desta coluna e, muito menos, tirar o carro da garagem sem peso na consciência. Em tempos como esses, como bem lembrou uma amiga: a única energia limpa é aquela que você não gasta. Vale considerar também que uma parcela importante do volume de emissões que precisamos reduzir para desacelerar o aquecimento global está relacionada com decisões individuais, sobretudo as relacionadas com o consumo.

Certamente, pessoas que vivem na mesma cidade têm padrões diferentes de consumo. Em algumas cidades brasileiras, a diferença pode ser bastante contundente. Por exemplo, enquanto algumas pessoas sobrevivem com menos de US$ 2,15 - aquelas que estão em situação de extrema pobreza -, outras pagam R$ 1 mil por uma garrafa de vinho em um jantar cotidiano.

De acordo com a pesquisa "Desigualdade de Carbono em 2030" realizada pela Oxfam - instituto que surgiu em Oxford, na Inglaterra, como um Comitê para Alívio da Fome -, "emissões de carbono do 1% mais rico do mundo será 30 vezes maior que o limite de 1,5°C". Uma matéria publicada no site do instituto ressalta que, para alcançar a meta determinada no Acordo de Paris, cada um de nós teria que emitir em média 2,3 toneladas de CO² por ano até 2030, o que é cerca da metade da média de emissões atuais.

Mas se olharmos para cada extrato social, as pessoas empobrecidas seguem emitindo menos que o nível médio proposto; já os 1% pelo extrato mais rico emitem 30 vezes mais. Sendo assim, para atingir o nível proposto, está população mais abastada precisa reduzir sua Pegada de Carbono em 97%, os 10% mais ricos 9 vezes mais.

Até aqui, temos um evidente desequilíbrio entre o volume de emissões de grandes empresas, pessoas mais ricas e o restante da população. Portanto, taxar empresas intensivas em emissões e modos de vida inimigos do meio ambiente é medida necessária para a reorientação do modelo de desenvolvimento cujos desdobramentos estão transformando o meio ambiente e colocando a vida na terra em risco.

Alinhando a pauta climática e a pauta social, que nem sempre caminham juntas - mas deveriam -, é preciso determinar e perseguir padrões mínimos de vida que garantam à população acesso a direitos tão básicos como: alimentação, moradia, saúde, transporte, educação, lazer e recreação. Ou seja, a tudo que já está previsto na Carta Internacional de Direitos Humanos.

Falando mais especificamente de mobilidade urbana, os períodos de desenvolvimento econômico são comumente acompanhados do aumento da taxa de motorização em função da ampliação do acesso a compra de veículos.

Na história brasileira, especificamente, esse mercado tem relação direta com a redução de impostos sobre a produção de veículos e estímulo à indústria do automóvel. Para uma possível próxima onda de desenvolvimento, é preciso manter as pessoas utilizando meios de transporte sustentáveis, de preferência coletivos, assim como atrair para esses meios a maioria das pessoas que utilizam carros e motos - o que só é possível através de investimento em infraestrutura acessível, pública e de qualidade.