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Pele, autoestima e saúde mental: por que dermatologia precisa de inclusão

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Imagem: Getty Images

De VivaBem, em Salvador*

29/04/2025 05h30Atualizada em 29/04/2025 12h01

Quando falamos de saúde da pele, muita gente ainda pensa apenas em estética: uma mancha, uma espinha, uma ruguinha aqui ou ali. Mas, conforme afirma Hanane Saidi, diretora geral da divisão L'Oréal Beleza Dermatológica no Brasil, a questão é muito mais profunda. "Existem problemas de pele que vão muito além da pele", diz ela.

Se a pessoa tem uma acne severa, por exemplo, a autoestima baixa de maneira tremenda. Você desenvolve depressão, se sente excluído e se autoexclui da sociedade.

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Essa conexão entre pele e saúde mental, conhecida como psicodermatologia, é uma das frentes que começam a ganhar força no Brasil —um país cuja diversidade de tons e tipos de pele ainda não é refletida como deveria na medicina.

E o futuro não é somente olhar uma mancha, uma espinha, é um pouco o impacto de tudo isso sobre a saúde global da pessoa. E se o dermatologista não é capaz de diagnosticar isso também sobre uma pele mais escura, diversa, então temos um problema.

Brasil: uma pele diversa, mas pouco estudada

Segundo Hanane, entender quem são os brasileiros é o primeiro passo para mudar esse cenário. "Mais de 2/3 da população brasileira tem uma pele mais escura, um cabelo mais cacheado", destaca. "É o que precisamos conhecer dentro do país para atender de verdade o consumidor brasileiro."

Apesar dessa realidade, faltam estudos científicos e materiais que representem essa diversidade. Isso gera um problema grave: muitos médicos não são treinados para identificar doenças de pele em tons mais escuros.

Melanoma, por exemplo, é muito mais difícil de detectar em uma pele escura do que em uma pele clara. Se você não tem essa expertise, não consegue diagnosticar direito. Hanane Saidi, diretora geral da divisão L'Oréal Beleza Dermatológica no Brasil

O problema não para na formação dos profissionais. O acesso também é um desafio enorme. O Brasil, mesmo com uma média de 11,1 dermatologistas por 100 mil habitantes, ainda enfrenta desigualdades regionais, e o cuidado não é igualitário.

Segundo dados levantados pela We Cancer, em parceria com a La Roche-Posay, por aqui, 71,6% dos pacientes oncológicos percebem sintomas dermatológicos durante o tratamento, porém apenas 22,6% conseguem evoluir para o atendimento com um especialista em dermatologia. Além disso, só 31,5% das pessoas encaminhadas para o serviço de dermatologia realizam o tratamento pelo SUS. E, segundo Hanane, isso não acontece só por questões financeiras. "Muita gente não acha que um problema de pele vai ser grave, acha que vai dar certo. E muitos se automedicam, tentam resolver sozinhos."

Hanane Saidi, diretora geral da divisão L'Oréal Beleza Dermatológica no Brasil Imagem: Divulgação

O grupo L'Oréal reconhece o Brasil como um "laboratório a céu aberto", estratégico para o desenvolvimento de novas tecnologias. A L'Oréal conduziu um estudo que revela que o Brasil concentra 55 dos 66 tons de pele mapeados globalmente, reafirmando a importância do investimento em pesquisa para atender às necessidades específicas da beleza brasileira.

O conhecimento científico já permitiu à empresa desenvolver produtos muito assertivos para a diversidade da população brasileira. Porém é necessário ainda mais ciência e conhecimento sobre pele e cabelos da população negra.

Apesar de o Brasil ser um país com diversidade de pele e cabelo único, dados indicam que 44% dos dermatologistas brasileiros sentem-se pouco ou parcialmente preparados para diagnosticar e tratar adequadamente todos os tons e tipos.

Educação é o começo de tudo

Para realmente transformar a dermatologia no Brasil, o esforço precisa começar cedo, ainda na formação dos futuros médicos. "Para mudar isso, precisamos atuar desde o início, dentro dos estudos científicos", reforça Hanane. "Hoje não temos material que representa a população brasileira, e isso é complicado."

A L'Oréal vem trabalhando para disponibilizar bibliografias mais inclusivas e colaborar com universidades para integrar essa diversidade no currículo médico.

O assunto também perpassa pela formação médica, se há pouca literatura disponível, os futuros médicos também não serão treinados em identificar problemas em peles de tons diversos.

Prêmio Dermatologia Mais Inclusiva: uma iniciativa que veio para ficar

Um exemplo concreto dessa mudança é o "Prêmio Dermatologia Mais Inclusiva", promovido pelo Grupo L'Oréal no Brasil e criado para incentivar pesquisas focadas na diversidade da pele brasileira. O programa é parte da plataforma "Sua Pele, Nossa Especialidade'', que busca levar informação acessível e confiável para todas as peles brasileiras.

"Sentimos falta de ter uma premiação de uma dermatologia muito mais inclusiva", conta Hanane. "Queremos pessoas pesquisando, aumentando o conhecimento de verdade sobre a nossa população."

Vencedoras do Prêmio Dermatologia Mais Inclusiva Imagem: Divulgação

A 1ª edição do Prêmio Dermatologia Mais Inclusiva premiou quatro pesquisadoras brasileiras com bolsas no valor de R$ 50 mil durante o Congresso Brasileiro de Cirurgia Dermatológica, realizado de 24 a 27 de abril em Salvador. As vencedoras tiveram seus estudos reconhecidos por contribuírem significativamente para o avanço de uma dermatologia mais inclusiva, ampliando o conhecimento sobre peles negras e seus cuidados específicos.

Perfis das premiadas em 2025

Nadia Tavares El Kadi - médica, pesquisadora e professora universitária, mestre em medicina pela UERJ e doutoranda na UFF. Sua pesquisa foca em alopecias cicatriciais, especialmente em mulheres negras. Autora de artigos e capítulos de livros, foi premiada como jovem pesquisadora internacional no 13º Congresso Mundial de Pesquisa em Cabelo. Pesquisa: Estudo Do Couro Cabeludo Negro E Das Hastes Capilares Em Mulheres Saudáveis Através Da Dermatoscopia. Padronização Do Método E Normas Para Parâmetros Mensuráveis.

Luciana Mattos Barros Oliveira - doutora em endocrinologia pela USP, com pós-doutorado em endocrinologia reprodutiva pela Universidade Harvard. Professora de fisiologia na UFBA, coordena o Ambulatório Transexualizador do HUPES-UFBA e supervisiona a residência em endocrinologia e metabologia. Também integra o Comitê de Atenção à Saúde LGBT da Bahia. Pesquisa: Uso De Dermocosmético Inovador No Tratamento De Acne Vulgar Em Homens Transgêneros Negros: Um Ensaio Clínico Duplo Cego.

Sandra Eliza Fontes De Avila - professora no Instituto de Computação da Unicamp desde 2017 e doutora em ciência da computação pela UFMG e Sorbonne Université. Suas pesquisas focam em inteligência artificial aplicada ao bem social, incluindo aprendizado de máquina, visão computacional e processamento de linguagem natural, com ênfase em saúde e mídias sensíveis. Recebeu diversos prêmios, como o Google Latin America Research Awards e o Google Awards for Inclusion Research. Também foi reconhecida entre os 2% cientistas mais influentes do mundo (Stanford/PlosOne/Elsevier) e coorganiza o projeto Meninas Super Cientistas, incentivando mulheres em STEM. Pesquisa: Peles Negras Importam: Modelos De Inteligência Artificial Para Análise De Lesões De Pele Negra.

Ellen Maria Sampaio Xerfan - médica, dermatologista, doutora em medicina translacional pela Unifesp, com pesquisa focada em vitiligo, sono e inflamação. Pós-doutoranda no Departamento de Psicobiologia da Unifesp, estuda os impactos dos distúrbios do sono na pele e em doenças cutâneas. Membro titular da SBD, possui mais de 30 artigos publicados e atua ativamente em congressos nacionais e internacionais. Pesquisa: Vitiligo Na Pele Negra: O Papel Da Vitamina D E Do Sono Como Coadjuvantes Na Proteção Da Pele E Na Indução À Repigmentação Cutânea Pela Fototerapia UVB.

E a boa notícia é que o prêmio não é algo pontual: novas edições já estão previstas para este ano e os próximos. "É uma plataforma longeva. Não é uma iniciativa apenas desse momento", garante.

No fim das contas, cuidar da pele é também cuidar da identidade e da saúde integral de cada pessoa. "Nossa pele conta nossa história", resume Hanane. Uma história que, no Brasil, é feita de muitas cores, texturas e desafios —e que agora começa a ser escrita de forma mais inclusiva.

*A jornalista viajou a convite da L'Oréal.


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