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'Quem estava de uniforme sofria preconceito na rua', diz RH de hospital

Daniel Moreira Calderaro tem 43 anos e é supervisor de RH na Santa Casa de São José dos Campos - Roosevelt Cássio/UOL
Daniel Moreira Calderaro tem 43 anos e é supervisor de RH na Santa Casa de São José dos Campos
Imagem: Roosevelt Cássio/UOL

Giulia Granchi

Do VivaBem, em São Paulo

09/10/2021 04h00

Quando entrou na Santa Casa de São José dos Campos (SP) pela primeira vez, em 1997, para trabalhar como office boy, Daniel Moreira Calderaro não imaginava que ali, naquele mesmo lugar, enfrentaria uma pandemia.

Passados 23 anos, hoje formado em administração e pensando em cursar direito, ele atua como supervisor de RH (recursos humanos) na instituição que atende gratuitamente a população. Com o surgimento das primeiras infecções pelo coronavírus (Sars-CoV-2) e a preocupação crescente de quem frequentava o hospital dia após dia, ele viu uma rotina já bem estruturada perder suas bases.

"As mudanças não foram fáceis. Começamos pensando se o atendimento ao funcionário seria presencial ou à distância e, pouco a pouco, fomos aprendendo os cuidados necessários. No começo, alguns chegavam sem máscaras, por exemplo. Hoje isso já não acontece. A gente acaba se acostumando com a demanda, mas ainda não é fácil. Cair na rotina traz o risco de relaxar nos cuidados, o que não podemos fazer", diz.

Daniel Moreira Calderaro, personagem de SJC - Roosevelt Cássio/UOL - Roosevelt Cássio/UOL
Imagem: Roosevelt Cássio/UOL

Nos primeiros meses, Daniel conta que, quando as pessoas notavam o uniforme da Santa Casa ao vê-lo em lugares públicos, olhavam de forma estranha ou se afastavam, como se assumissem que ele passaria a doença.

"Muita gente saia de casa sem uniforme, para pegar o transporte público, e se trocava no hospital [algo que antes da pandemia não era comum]. Recebemos aqui no RH o depoimento de uma técnica de enfermagem que recebeu agressões verbais dentro do ônibus e ela não foi a única —outros sofreram preconceito na rua", lembra.

Responsável por supervisionar seis funcionários, Daniel e sua equipe atendem, diariamente, profissionais de diferentes áreas do hospital, inclusive alguns que atuam na linha de frente contra a covid-19.

Eles ficaram mais estressados e coube a nós compreender. Acabamos aprendendo a ser mais pacientes com as pessoas, a demonstrar empatia e tranquilidade nas conversas. Se para nós, do DP (departamento pessoal), já é muito difícil, imagine para eles que estão acompanhando casos todos os dias. Havia um nervosismo e nós não estávamos aqui para adicionar ainda mais carga, temos que lembrar que todos têm família.

O medo de infectar os familiares, inclusive, Daniel conhece bem: "Fiquei três semanas fora da minha casa, onde moram minha esposa, minha sogra e meu filho de oito anos. Passei esses dias em um cômodo no fundo da casa da minha mãe, só com um quarto e banheiro. Minha família toda se reunia com frequência, mas meus pais já têm certa idade, então a distância foi nosso jeito de cuidar um do outro", diz ele, que até agora foi um dos poucos da família que não teve covid-19.

Daniel Moreira Calderaro, personagem de SJC - Roosevelt Cássio/UOL - Roosevelt Cássio/UOL
Imagem: Roosevelt Cássio/UOL

Durante a pandemia, contratações aumentaram

Daniel conta que, em certo momento, houve 70 funcionários afastados com sintomas de covid. Três colegas morreram e, em meio às dúvidas, muitos ainda pediram demissão por preferirem ficar longe do ambiente hospitalar.

"Foram quase 90 contratações só por causas relacionadas à pandemia. Precisei trabalhar nos fins de semana porque nos dias normais de trabalho não dava para fazer tudo. Era documentação, entrevistas, crachás... As integrações, que antes ocorriam duas vezes ao mês, passaram a ser semanais", conta.

A vida não voltou ao normal, mas continua

Hoje, quando chega em casa e o filho corre para abraçá-lo, Daniel ainda precisa parar o menino: "Espera, o papai está de uniforme", lembra. É só depois de tomar banho e separar as roupas usadas que passa a ter contato com a família.

Para o pequeno, o pai foi explicando sobre o risco aos poucos, e, na pandemia, puderam passar bastante tempo juntos. "A gente joga muito videogame, gostamos de assistir a desenhos, ver filmes... Até hoje ele questiona, pede para ver os amigos, ir na casa da madrinha, dos colegas. Era muito ativo, fazia futebol, natação, então, para ele, foi difícil se adaptar", explica.

A chegada das vacinas e os números de internações baixando nos hospitais deram a Daniel mais esperança de que dias melhores estão por vir. Aliás, esses não são todos os motivos. Sua esposa, professora, está grávida de cinco meses, e o casal espera saber o gênero do bebê em breve.

Daniel Moreira Calderaro, personagem de SJC - Roosevelt Cássio/UOL - Roosevelt Cássio/UOL
Imagem: Roosevelt Cássio/UOL