15 bebês reborn e coleção avaliada em R$ 28 mil: 'Fui chamada de maluca'
Elaine Alves, 37, mora em São Paulo e coleciona bebês reborn — aquelas bonecas que se assemelham muito com bebês reais — há quase 20 anos. Produtora de conteúdo, ela contou recentemente em suas redes sociais que foi abordada de forma preconceituosa por uma mulher em um shopping. "Ela queria me indicar um psicólogo", contou a Universa.
"Coleciono bebês reborn há 18 anos. Sempre gostei de bonecas e tinha uma coleção de Barbies. Quando reuni cinco bebês, comecei a produzir conteúdo sobre esse universo", disse. Hoje, ela tem cerca de 15 bonecos.
Seu canal no YouTube conta com cerca de 21 mil inscritos. No TikTok, o número chega a 223 mil seguidores. Como tem parcerias com "cegonhas" — nome dado às artistas que produzem as bonecas manualmente —, costuma passear com itens da sua coleção na rua, o que chama bastante a atenção do público.
As pessoas me abordam, querem entender, eu explico a arte e falo sobre meu trabalho na internet. Andar com as bonecas é uma forma de divulgação. Sempre penso pelo lado profissional, Elaine Alves
Contudo, em uma visita recente ao shopping, ela foi alvo de uma abordagem agressiva e desrespeitosa por parte de uma mulher.
"Estava na praça de alimentação com minha mãe e minha tia. Parei em frente à escada rolante porque chama mais atenção — foi estratégico. Muita gente veio falar comigo, tirar foto, fazer perguntas. Mas uma senhora foi muito ríspida, extremamente preconceituosa comigo", conta.
A mulher a abordou perguntando por que ela estava andando com uma boneca. Antes mesmo que Elaine conseguisse explicar, ouviu que "não era certa da cabeça".
"Expliquei que era um hobby, algo comum entre mulheres adultas, e que não tratamos as bonecas como bebês de verdade. Ela disse que eu precisava de ajuda psicológica e tentou indicar um profissional. Virou as costas e saiu dizendo que eu só podia ser maluca", relatou.
É uma coleção
Segundo Elaine, ela não brinca com as bonecas, apenas simula situações como troca de fraldas, alimentação e troca de roupas para gravações. Quando não está filmando, os bebês reborn ficam guardados no armário. Segundo a produtora de conteúdo, sua coleção está avaliada em R$ 28 mil.
Os bebês não são baratos, então é necessário fazer manutenção. Só pego neles quando vou limpar ou gravar. Como são feitos manualmente, qualquer coisa pode manchar. Os cuidados são como os de qualquer outra coleção. Se fosse um homem com carrinhos, ele também precisaria limpá-los.
E os valores realmente impressionam. A colecionadora explica que o preço varia conforme o tipo de enxoval, os itens que acompanham o boneco, o acabamento do cabelo (pintado ou implantado fio a fio), além da origem — nacional ou importada. Os preços vão de R$ 1.500 a R$ 30.000, quando o bebê é feito de silicone e importado.
Elaine é mãe de uma menina de cinco anos, que adora os bebês e se diverte quando a mãe sai com eles. "Deixo ela à vontade para brincar, mas ela não liga muito. Prefere Barbies e Pollys", conta.
Haters em todo lugar
Seja por comentários virtuais ou pessoalmente, Elaine se incomoda com o preconceito em torno de sua coleção. "É chato ver as pessoas tirando conclusões sobre sua vida inteira por vídeos de um minuto.
Recentemente, um youtuber gravou um vídeo reagindo ao conteúdo que Elaine havia postado. "Foi muito mal-educado. Disse que sair com os bebês para divulgar meu trabalho era desculpa. E ainda comparou: 'Quer dizer então que prostituta tem que sair com a bunda de fora?'", lembra.
Por conta do desgaste psicológico, ela decidiu não processar. E, mesmo diante das adversidades, nunca pensou em desistir de divulgar seu amor pelos bebês reborn.
Sofro preconceito desde que comprei minha primeira boneca. Quem quiser falar, vai continuar falando. Não importa o que você faça, sempre haverá julgamentos, Elaine Alves
Não há problema em colecionar
Será que, se Elaine colecionasse itens de um universo diferente, sofreria o mesmo tipo de julgamento? Carla Cavalheiro Moura, psicóloga clínica e coordenadora do grupo de dependências tecnológicas do AMITI (Ambulatório dos Transtornos do Impulso) do IPq HCFMUSP (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP), acredita que não.
"O bebê reborn carrega um estigma próprio. Existem mulheres que têm essas bonecas para suprir ou amenizar a dor de não poderem ter filhos, ou de terem perdido um. Esse, sim, é um comportamento que pode ser preocupante. No caso da Elaine, parece ser um hobby dentro da normalidade", afirma a especialista.
A psicóloga clínica Elenice Moraes, que atua no Ambulim (Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares) do Hospital das Clínicas, também concorda. Para ela, há um comportamento coletivo de transformar tudo em doença, sem considerar o contexto.
"Me parece que ela tem uma coleção como qualquer outra. Tem uma vida, uma história, é casada, tem uma filha. Nada sugere um transtorno psiquiátrico. Existe hoje uma tendência de patologizar tudo", afirma Moraes.
Também pode haver uma visão machista em torno do hobby de Elaine. "Se fosse um homem colecionando carros, seria considerado legal. Mas, como é uma mulher com bonecas, colocam-na em um contexto doentio", aponta Moraes.
O hobby só se torna patológico quando compromete o cotidiano. "Quando se percebe que alguém está fora da realidade e o comportamento causa prejuízos à vida, aí sim é necessário buscar ajuda", conclui Moura.