'Acho lindo que mulheres engravidam e se sentem bonitas. Não foi meu caso'

"Estava na Itália terminando um trabalho e dali partiria para uns dias de férias na Holanda. Eu queria engravidar e sabia que tinha a ligeira possibilidade de já estar grávida quando saí do Brasil. Estava no aeroporto esperando o voo para Amsterdã e toda a minha equipe de trabalho já tinha saído para o Brasil. Decidi comprar o teste e o resultado foi "incinta", que é grávida em italiano. Liguei para meu marido na hora para contar e decidimos esperar até eu voltar ao Brasil para contar para a família toda.

Desliguei o telefone com ele, esqueci o combinado e liguei correndo para minha mãe: eu precisava contar para ela! Passei alguns dias nesse começo viajando sozinha. Dizem que a gravidez dura nove meses, mas para mim esse período foi de anos. De volta ao Brasil, eu passava mal todos os dias, vomitando e me sentindo mal por estar me sentindo mal. Essa foi minha primeira culpa materna. Minha mãe me ajudava a não pensar em coisas negativas. Ao mesmo tempo, eu pensava na potência da criação. Meu corpo estava fabricando órgãos!

Emocionalmente falando, eu achava que as pessoas poderiam ficar com dó de mim. Engravidei aos 22 anos porque eu quis, achava que era um bom momento. Mas fiquei pensando como o roteiro era pré-fabricado para as pessoas: se formar, trabalhar, casar e ter filhos. É estranho quando você sai do scritpt mesmo com total consciência do que está fazendo.

Não havia nenhum motivo pra sentirem dó de mim, mas eu percebia isso.

Eu achava que era a grávida mais feia da história. Usava pijama, tinha muita estria e acne, como se meu corpo não tivesse gostado dos hormônios da gravidez. Acho lindo que mulheres engravidam e se sentem bonitas, mas não foi meu caso.

Trabalhava de casa e isso foi ótimo! Vi todos os documentários de parto e sabia demais. Por isso, tinha a sensação de que algo ia dar errado. Ficava muito louca achando que a qualquer momento escutaria que o coração da Clarice havia parado. Nada disso: foi tudo muito saudável. Acho que essa sensação tem a ver com o incontrolável: as coisas estão na sua mão, mas tudo está fora do controle.

Comecei o pré-natal com uma médica, mas achei o acompanhamento meio desleixado. Ela esqueceu, por exemplo, de pedir o exame para ver a anatomia do coração nas 28 semanas. Só lembrou quando eu estava com 33 e não era mais possível ver com precisão. Além disso, tive hipotireoidismo e decidi mudar para outra médica no fim da gestação, já que poderia ser preocupante para o bebê.

Para controlar a ansiedade, eu pensava que a gravidez era natural — há milhões de anos existem mulheres que estão gestando e parindo e o corpo é capaz de fazer isso. Claro que não impediu minha irritação na reta final — azia, dor na lombar e muito cansaço com 41 semanas e nada de Clarice querer vir.

Tentei maneiras naturais de indução: de acupuntura a óleo de rícino, que funciona como laxante e provoca um movimento de intestino que desencadeia no útero o trabalho de parto. O meu levou 30 horas, com uma pausa de seis horas nas contrações quando entrei na banheira quentinha do hospital e a dor parou. Foi um parto normal do jeito que eu queria, uma dor alucinante, sem descanso entre uma contração e outra: não tinha pausa, apenas uma dor contínua.

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Chegou o momento em que cansei e comecei a pedir uma cesárea. Eu só dizia: tira o bebê de dentro de mim. A médica sugeriu a analgesia e eu, depois de anestesiada, voltei a fazer piada. Estava rindo, sem dor, fui para a banqueta sem sentir contrações, mas fiz o que mandavam. Ao fazer força na hora certa, Clarice nasceu em 20 minutos. Como as mulheres conseguem relaxar com a dor que a gente sente? Mas, depois da analgesia, relaxei totalmente.

Se eu tiver outro filho, gostaria de tentar sem tomar nada, para manter a sensação de contração e sentir o bebê saindo. Depois disso, foi muito simples: ela veio para o meu colo, mamou logo de cara. Toda aquela angústia da gravidez foi embora."

Luiza Geiling, 26 anos, analista de mídias sociais, mãe de Clarice, 4 anos

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