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João de Deus: MP-GO faz nova denúncia contra médium por venda de passiflora

Rafaela Polo e Gabryella Garcia

de Universa, em São Paulo

31/03/2023 12h01

O médium João de Deus completou três anos de prisão domiciliar nesta sexta-feira (31) e não há previsão de voltar à cadeia —ele foi condenado por crimes sexuais após denúncia de cerca de 300 mulheres. Uma nova ação do Ministério Público de Goiás, entretanto, o denunciou por vender passiflora vencida e por não ser possível checar a origem da água da Casa Dom Inácio de Loyola, onde ele atendia.

A jornalista Cris Fibe conversou com exclusividade com o promotor Luciano Mirando Meireles, do MP-GO, e trouxe detalhes sobre o caso e a nova acusação contra o médium durante o "Sem Filtro" desta sexta.

Se somadas as condenações, João de Deus pode pegar 271 anos de prisão. Meireles reforçou para Fibe que há um pedido do órgão e de advogadas das vítimas para que ele volte à cadeia. "Um indivíduo que consegue contrair matrimônio, consegue estabelecer um relacionamento, ainda em prisão domiciliar, tem todas as condições físicas e psicológicas para cumprir pena na cadeia", diz, referindo-se ao casamento do médium com a advogada Lara Cristina Capatto em abril de 2022.

João Teixeira de Faria foi preso no final de 2018 mas, apesar das condenações, ficou apenas 15 meses na prisão. O médium foi liberado assim que se iniciou a pandemia de covid-19 e, desde então, cumpre prisão domiciliar.

Cris Fibe: 'Vítimas sentem prisão domiciliar como um tapa na cara'

João de Deus cumpre sua pena em uma mansão localizada em Anápolis que conta com vários andares, cama de cristal, sala de cinema, chafariz e um quintal enorme. Diante da situação, Cris apurou em conversa com o promotor do MP-GO e também com as vítimas, que elas sentem isso como uma espécie de "derrota".

As vítimas sentem isso como um tapa na cara, porque a condenação foi muito comemorada como um processo de cura e um atestado de que elas não estavam loucas e estavam falando a verdade. É um tapa na cara delas, além do risco que eventualmente possam correr, embora o Ministério Público diga que não há nenhum relato de vítimas terem se sentido intimidadas pelo fato de João Teixeira de Faria estar em casa. Cris Fibe

Ainda durante o programa, a jornalista falou sobre uma rede de proteção para proteger o médium e que essa rede permitiu que ele pudesse cometer os crimes durante quase 40 anos. "A gente imagina que houvesse uma rede de proteção para perpetuar o silenciamento dessas vítimas que não conseguiam reparação, então eventuais cúmplices não estão sendo investigados, olhados e processados", disse.

A prisão domiciliar para um sujeito que tem muito boas condições financeiras não é considerada uma prisão. Ele tem plenas condições, apesar de ter mais de 80 anos, de cumprir a pena em cárcere. Cris Fibe

Semayat Oliveira diz que silenciamento acontece de forma natural em ambientes religiosos

A jornalista Semayat Oliveira conversou com duas especialistas em estudos de fé e violência de gênero e compartilhou suas impressões durante o programa Sem Filtro. Apesar de a maioria das pessoas religiosas no Brasil serem mulheres, a violência de gênero acaba acontecendo nesses ambientes devido a uma estrutura que coloca homens, geralmente brancos, nas posições de poder.

Magali Cunha, que é jornalista, doutora em ciências da comunicação e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião, afirmou que as mulheres são maioria mas acabam ocupando lugares na base, muitas vezes como auxiliadoras de homens brancos que são vistos como "uma representação de Deus".

São vistos como intermediários entre Deus e a comunidade e em algumas igrejas são até relacionados a anjos de Deus, então a gente entra em um campo simbólico em que essa mulher, que já está em uma situação social e estrutural de desigualdade, lida com uma liderança que não pode ser questionada. É uma pessoa que precisa ser acolhida e defendida o tempo todo. Um dos principais pontos é olhar para essa estrutura e como esse silenciamento acontece naturalmente. Semayat Oliveira

A teóloga e mestre em ciência da religião, Valéria Vilhena, também afirmou para Semayat que essa hierarquia dentro dos ambientes de fé também faz com as mulheres tenham dificuldades de denunciar algum tipo de violência. Por isso, reforçou que o primeiro passo para combater a violência é fazer um serviço de pastoral, uma espécie de rede de apoio, para ouvir e acolher essas mulheres e, em seguida, entender o encaminhamento mais cabível e necessário, como ir até uma delegacia, por exemplo.

Assista ao Sem Filtro

Quando: às terças e sextas-feiras, às 14h.

Onde assistir: no YouTube de Universa, no Facebook de Universa e no Canal UOL.

Veja a íntegra do programa: