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"É só tesão": elas contam como aprenderam a separar química sexual de amor

"Por mais que doa, nenhum sexo vale a sua saúde mental", comenta Joyce, que tem uma amizade colorida há 9 anos - Arquivo pessoal
"Por mais que doa, nenhum sexo vale a sua saúde mental", comenta Joyce, que tem uma amizade colorida há 9 anos Imagem: Arquivo pessoal

Júlia Flores

De Universa

07/05/2021 04h00

Rita Lee canta que "amor é isso, sexo é aquilo". Para algumas pessoas, porém, separar envolvimento amoroso do que é 100% tesão não é uma tarefa fácil - sem contar as vezes em que a química entre o casal é tão boa que gera até uma certa dependência física, com sintomas parecidos com o de uma paixão. Na internet, esse comportamento virou meme e ganhou até nome.

Esse tipo de amor em que a pessoa se apaixona pela performance sexual do parceiro pode acontecer entre dois desconhecidos ou entre dois amigos e - normalmente - é um relacionamento que não evolui para uma relação mais séria, como um namoro.

Ellen Senra, psicóloga especialista em terapia cognitiva, explica que do ponto de vista comportamental, é possível que você se apaixone pelo sexo com uma pessoa: "É uma forma de matar a carência, muitas vezes estamos com tesão, com a libido alta e não queremos recorrer a masturbação para resolver o problema. É bom ter uma pessoa da sua confiança para recorrer quando se encontra nesse estado".

"O problema é que se apaixonar pelo outro é um perigo que você sempre está correndo nesse tipo de relacionamento", adverte Ellen. Mas, então, o que fazer quando o amor de tesão fica? Como diferenciar esse sentimento de algo mais sério? Ouvimos relatos e conversamos com especialistas para tentar chegar a uma conclusão. Leia:

"Há 9 anos não consigo tirar o crush da cabeça"

Joyce Caroline, 24 anos, atendente, está desde o ano passado em um relacionamento casual com o crush dos sonhos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Joyce Caroline, 24 anos, atendente, está desde o ano passado em um relacionamento casual com o crush dos sonhos
Imagem: Arquivo pessoal

Conheci o meu crush há 9 anos, quando estava no ensino médio. Desde então, sempre quis ficar com ele. Só que eu achava que nunca teria uma chance. Autoestima baixa, sabe? E demorou um tempo para eu me declarar. Um dia, bêbada, me declarei e pedi para ele ficar comigo.

Ele disse que não, porque tinha acabado de terminar um relacionamento e ainda estava naquele processo do fim. Falei: 'Tranquilo, se um dia a gente se encontrar de novo e você estiver melhor, a gente fica'. Pouco tempo depois reagi a um story dele e decidimos nos ver. Ficamos e foi ótimo.

A primeira vez que transamos foi em novembro de 2020. A gente sempre se vê de mês em mês, quando ele resolve aparecer. Em abril desse ano ele sumiu de todas as redes sociais e eu já tinha desistido quando ele reapareceu reagindo a um story. Nos encontramos na sexta-feira passada e continua tudo normal.

Sigo querendo ficar com ele e sei que é 'um amor de pica', porque tenho certeza que não quero namorar com ele.

Sem dúvidas, o sexo com ele é o melhor da minha vida. Quando ele some, eu até fico com outros caras, mas não é a mesma coisa, por isso sempre volto

Rola um carinho, ele me trata muito bem, mas não crio expectativas. Não vejo características que me fariam namorar com ele. Ele é muito inteligente, esforçado, mas eu o admiro como se fosse um amigo. Com esse crush é só sexo mesmo. Não quero apresentá-lo para minha família, não quero que ele seja o pai dos meus filhos e já deixamos isso claro um para o outro.

Sem dúvidas, o sexo com ele é o melhor da minha vida. Quando ele some, eu até fico com outros caras, mas não é a mesma coisa, por isso sempre volto. A situação em que estamos é confortável, mas se começasse a me fazer mal, me afastaria. Por mais que doa, nenhum sexo bom vale minha saúde mental." Joyce Caroline, 24 anos, atendente

"Levei 5 anos e 6 meses para superar o sexo com o meu ex"

Jaqueline Reis, analista jurídica para questões imobiliárias, 27 anos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Jaqueline Reis, analista jurídica para questões imobiliárias, 27 anos
Imagem: Arquivo pessoal

"Conheci meu PA (pau amigo) em uma festa da faculdade. Era uma loucura, porque nós não podíamos nos ver em algum lugar que sempre nos pegávamos, até que virou um namoro. Após dois anos de relação, nós terminamos.

Um mês depois do término começamos a ter várias recaídas. 100% carnal, nada de sentimento. Fomos ficando e quando eu disse para ele que não queria voltar, passou dois dias e ele assumiu o namoro com outra menina. Ficamos dois anos sem nos falar e um dia resolvi mandar mensagem convidando ele para um encontro de amigos.

Quando me dei conta, já estava transando com ele. Foi uma das melhores noites que já tivemos. Tínhamos uma química inexplicável. Nos damos muito bem na cama, não dá para negar. Tudo que vivemos antes e depois do namoro foi puramente carnal, quase uma necessidade física

Do primeiro beijo até esse encontro levou mais de 5 anos. Depois disso, resolvi deixar essa história para trás. Lembrei de algumas atitudes erradas dele e decidi esquecê-lo. Não concordo que um amor de pica substitui o outro, porque quanto mais você camufla, pior fica a situação." Jaqueline Reis, analista jurídica para questões imobiliárias, 27 anos

Como superar essa dependência sexual?

A sexóloga e colunista de Universa Ana Canosa diz que este tipo de dependência sexual é comum: "Podemos gostar muito de um sexo, mas não acho que isso sempre vira um amor, diria que é mais um 'apaixonamento' de química. As pessoas podem se confundir um pouco, sim, mas só o tempo para dizer o que a relação vai virar, se existe algum sentimento ali".

Ellen Senra reforça que sexo não pode ser usado como uma armadilha para tentar prender o parceiro e que tentar camuflar o sentimento que você nutre pelo outro como algo puramente carnal é "perigoso": "Muitas pessoas usam o tesão para justificar o fato de estar apaixonada por um boy lixo, porque não quer assumir, quer falar que está no controle da situação, está usando o outro; quando na realidade ela só está se iludindo, ela gosta e gostaria de namorar".

A especialista diz que muita gente também se envolve nesse tipo de relação na intenção de mudar o outro e isso tem tudo para não dar certo. "Pensam 'vai que o sexo é bom e ele se apaixona por mim?'. Está errado. Se uma das partes começa a sentir afeto, é importante jogar limpo. Tem que deixar claro para o parceiro/parceira o envolvimento romântico e o outro tem que ser sincero, sem medo de perder a 'transa certa'".

Seja amor ou seja sexo, a psicóloga destaca a importância de ser um relacionamento saudável. "É importante estabelecer limites através do diálogo para ninguém se magoar". Se der errado? Basta substituir. "Não diria que seja substituição de amores, é substituição de parceiro sexual. Quando é amor, a coisa é um pouco mais profunda, e não vai ser só transando com outro que vai passar. A substituição do sexo é simples, se por alguma razão não deu para continuar, eu troco de parceiro e tudo certo."

Na opinião de Ana Canosa, o término pode ser um bom termômetro para entender se naquele relacionamento existe algo além de tesão. "Esse tipo de relação pode deixar saudade, mas é mais fácil de superar", comenta a sexóloga, que acrescenta: "Acho que não tem uma fórmula para superar o seu 'amor de pica'. A vida é assim: você vai ter pessoas com quem terá afinidade sexual e com outras não. Acho que precisamos nos acostumar a ter saudades das pessoas e que, tudo bem, isso vai passando". É como canta Rita Lee: "Sexo vem dos outros e vai embora; amor é da gente e demora".