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Setembro Amarelo: como reconhecer sinais autodestrutivos nos seus filhos

É preciso prestar atenção na saúde mental de crianças e adolescentes  - Getty Images
É preciso prestar atenção na saúde mental de crianças e adolescentes Imagem: Getty Images

Juliana Tiraboschi

Colaboração para o Universa

20/09/2020 04h00

Estamos na época do Setembro Amarelo, uma campanha de prevenção ao suicídio promovida pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM). Com o confinamento provocado pela covid-19 e toda a incerteza, insegurança e medo que a pandemia pode causar, é ainda mais importante neste ano cuidar da saúde mental de crianças e adolescentes.

Segundo Bruno Mader, psicólogo do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e doutorando em educação, uma boa saúde mental é construída, principalmente, a partir de quatro pilares: diálogo com a família, convivência com amigos, prática de esportes e de atividades culturais expressivas.

Família fortalecida

O diálogo em família deve existir desde sempre. Para Mader, é fundamental que os pais se interessem genuinamente pela vida dos filhos e os ouçam com atenção, sem menosprezar problemas e angústias que pareçam bobos para os adultos. Esse interesse deve ser demonstrado não para manter controle sobre a vida do filho, mas para entender como ele se organiza, como ele se relaciona com os amigos, com a escola e com os interesses amorosos. Isso ajuda o jovem a se interessar por ele mesmo e entender como ele é importante, fortalecendo a autoestima. E também provoca uma abertura para que os filhos consigam se abrir sobre os problemas com os pais. "É importante que o adolescente saiba se estiver enfrentando algum problema ele vai chegar em casa e ser acolhido", diz o psicólogo.

Os pais podem e devem ter conversas pontuais sobre temas como autocuidado, depressão, bullying, sexualidade, uso de álcool e drogas, mas é a abertura para o diálogo no dia a dia que vai construir e fortalecer a confiança do adolescente neles.

Amizades saudáveis

O segundo pilar, a convivência com os amigos, é algo que vai se construir de maneira saudável a partir da experiência em família. Segundo Bruno Mader, o adolescente, que ainda não tem sua maturidade totalmente desenvolvida, vai formar sua identidade a partir da identificação com o grupo, com sua "tribo". E a relação com os pais vai estabelecer padrões para as relações fora da família. "Se o jovem tem liberdade de expressão em casa e passar a se relacionar com alguém que o oprime, ele vai achar isso esquisito", diz o psicólogo. Ou seja, uma relação familiar saudável vai construir as bases para que os adolescentes desenvolvam amizades construtivas, que não sejam tóxicas ou abusivas. E nem precisar ter "um milhão de amigos", como diz a música de Roberto Carlos. "Às vezes, se o jovem tiver uma boa amizade, já é saudável", diz Mader.

Outras dicas do psicólogo é que os pais contem histórias de como foi sua própria adolescência e que tenham empatia com os problemas dos filhos. Um rompimento de amizade ou de namoro pode abalar fortemente a autoestima do adolescente e fazê-lo questionar seu próprio valor. É aí que entra o apoio e o acolhimento dos pais, que devem ouvir sem julgamentos apressados e ajudar o filho a lidar com esse sentimento, ajudando-o a perceber, com delicadeza, se pode haver um certo exagero nas reações à rejeição e mostrando que ele é importante para várias outras pessoas.

Por fim, para o psicólogo os pais também devem perceber quando eles podem dar mais autonomia para os filhos e quando é hora de intervir em suas relações. É importante o jovem ter privacidade. Mas se os cuidadores perceberem que os filhos têm contatos novos nas redes sociais ou na vida presencial que eles não conhecem, o psicólogo recomenda que conversem com o adolescente e questionem quem são aquelas pessoas. "Os pais têm direito de saber o que os filhos estão fazendo, se estão em risco", diz o psicólogo.

Esporte e arte

"Uma mente sã em um corpo são" é outro lema da boa saúde mental. E, para desenvolver uma mente e um corpo saudáveis, o psicólogo Bruno Mader recomenda a prática de esportes e de atividades culturais expressivas. O esporte promove diversos benefícios às crianças e adolescentes, como estimular a socialização e o trabalho em grupo, entender como funcionam regras, aprender a lidar com a frustração e combater a obesidade infantil, além de estimular a produção de endorfina, hormônio que provoca sensação de bem-estar.

Já as atividades culturais e artísticas podem variar desde algo muito simples, como desenhar em casa, até frequentar um curso de teatro, dança ou ter aulas de música. Elas ajudam na construção da identidade e também oferecem um espaço seguro para a expressão dos sentimentos. "Nem sempre é fácil identificar nossos sentimentos. Esse tipo de atividade serve para expressá-los de forma segura, 'disfarçados' de arte e com menos julgamento de outras pessoas", afirma o psicólogo Bruno Mader.

Sinais de alerta

Mesmo com todos os cuidados com a saúde mental das crianças e adolescentes, é importante que os pais fiquem atentos a sinais de alerta que podem revelar comportamentos autodestrutivos e, talvez, indicar o início de uma depressão ou algum outro distúrbio mental. O mais importante é que, ao analisar o comportamento dos filhos, os pais os comparem com eles mesmos em outros momentos, e não com outras crianças e adolescentes. Por exemplo, se uma pessoa é extrovertida, falante, e de repente fica calada por vários dias, isso pode ser um sinal de alerta. Mas, se o jovem é naturalmente tímido e introvertido, esse comportamento não é necessariamente preocupante.

Quando os pais sentem que perderam o controle da situação e não têm mais repertório para lidar com os problemas e angústias dos filhos, é hora de buscar um profissional para orientar a família.

Veja outros possíveis sinais de alerta:

- Isolamento social;

- Tristeza excessiva;

- Irritabilidade exacerbada, a ponto de interferir nas relações sociais, e que foge da rebeldia e questionamento que são naturais na fase da adolescência;

- Agitação excessiva, de um modo que atrapalhe na realização de atividades cotidianas;

- Dificuldade de expressar os sentimentos ou de lidar com afetos;

- Interesse exacerbado por temáticas de risco, como violência, agressão, autolesão e suicídio;

- Verbalizar que não gosta de si mesmo;

- Comportamento sexualizado em desacordo com a idade. Por exemplo, quando a criança fica se esfregando em outras pessoas, abaixa a calça ou invade o corpo do outro e fala sobre sexo com frequência. Isso não inclui a curiosidade normal das crianças, que surge, por exemplo, quando elas perguntam como nascem os bebês, ou o interesse pela sexualidade que surge na adolescência, que é natural;

- Sofrimento e inquietação sobre a própria sexualidade;

- Uso de álcool ou drogas, especialmente se for feito não por curiosidade, mas como uma forma de escapar da realidade.