Maria Ribeiro

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Opinião

Levei meu filho para ver a Madonna e as minorias se expressando sem medo

Eu não ia na Madonna. Por um misto de preguiça com mansidão, tinha decidido ver pela televisão. Pelo menos foi assim que fiz minha cabeça e nada como dar aquela força para o cérebro, trocando ansiedade por aceitação.

Eu gosto de sofá, eu não fui sorteada pelo banco, não fui convidada, tenho fobia de multidão, vou aproveitar do mesmo jeito. Eu já estava muito feliz.

Mas a vida é como outra pessoa, tão imprevisível quanto única, e tudo muda o tempo todo - como diz nosso Lulu. Foi assim que, diretamente da estrada onde cantava "Holiday", recebi a mensagem que me colocou em um trem imaginário que fez o circuito Ouro Preto-Petrópolis-Copacabana. Um itinerário inédito e mágico que me deu, no mínimo, mais vinte anos de vida.

"Amor, quer ver a Madonna?". Uma grande amiga, que está fora do Brasil, tem outra grande amiga, que trabalha no Itaú, e que tinha visto minha coluna anterior, onde eu dizia não saber se iria a Copacabana, e fez a pergunta que acordou a adolescente dos anos 90 que agora vos fala. "Quer?".

Eu nem sei como eu consegui. Não lembro do metrô lotado, da caminhada ate a entrada do show, dos passos ate o metro quadrado que abraçou meus 48 anos de existência. Quando eu vi, eu já estava ali, e como é bom a gente ter coragem de ouvir o acaso e recalcular as rotas.

Antes disso dois dias, a passagem de som já havia me dado um presente adiantado de dia das mães: mostrar pro meu filho caçula a importância da artista mais revolucionária dos séculos 20 e 21.

"Mas, mãe, eu tenho prova de física." Bento, qualquer coisa você explica para o seu professor que você foi ver um bairro tomado por minorias que, por alguns dias, foram maioria. E que por isso puderam se expressar sem medo. Que você foi ver a cidade parar para ver uma mina de 65 anos que em toda a sua trajetória deu voz a quem não tinha, e que até hoje corre riscos e se expõe em nome de causas que permitem, por exemplo, que o sexo feminino não seja visto como um gênero inferior. Isso sem falar na comunidade LGBTQIA+, que tem em Madonna uma aliada histórica.

Mostrar para o meu garoto que as nossas lutas devem ser as dele, que não estamos contra os homens e sim precisando que eles estejam conosco, foi meu gol de bicicleta de 2024.

Assim como foi emocionante ver o William Bonner apresentando o JN diretamente de uma Porto Alegre devastada, ou assistir ao empresário que trouxe o show pro Brasil chorando de emoção em uma entrevista supostamente formal. Homens que choram, homens que chegam junto em momentos cruciais, homens que cuidam, que são vulneráveis - a isso, chamamos de força.

A propósito, aos que colocam o evento da popstar americana como adversário da tragédia do Rio Grande do Sul, um lembrete: não houve verba alguma da União no épico espetáculo oferecido por Madonna à bandeira do Brasil, e reservas de alegria são necessárias para uma nação.

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Nação, essa, que agora se resume à um único estado, e aos seus moradores: vamos a eles e aos votos nas próximas eleições.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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