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Maqui Nóbrega

Melhem, não adianta silenciar as mulheres porque agora aprendemos a gritar

Marcius Melhem dá entrevista aos jornalistas do UOL Dolores Orosco e Mauricio Stycer - Reprodução
Marcius Melhem dá entrevista aos jornalistas do UOL Dolores Orosco e Mauricio Stycer Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

07/12/2020 12h56

Sexta-feira passada acordamos com a internet tomada pelo nome "Marcius Melhem". Uma matéria da revista Piauí revelou, em detalhes asquerosos, o que muita gente nos bastidores da rede Globo já sabia: Marcius, chefe do departamento de humor da emissora, era acusado de abuso sexual e moral por diversas mulheres.

Eu poderia entrar em vários assuntos aqui -o silêncio e conivência da Globo, a coragem da Dani Calabresa, como nós, mulheres, lemos a matéria sem surpresa nenhuma-, mas eu quero falar de um momento da entrevista que Marcius deu ainda na sexta-feira para o UOL.

O vídeo tem pouco mais de uma hora e é uma aula didática sobre o discurso do homem abusador. Ele admite erros, mas nunca fala quais são. Diz que está em um ano de desconstrução, que apoia a luta do feminismo, mas mesmo assim não consegue entender porque um grupo de mulheres assediadas adotou a estratégia de procurar a imprensa antes da Justiça.

Confessa que foi um homem tóxico, mas fala no passado, porque na visão dele, já não é mais. Ele chora, minha gente, porque está sendo tudo muito doloroso e injusto. Como assim não é Marcius que está controlando a narrativa do caso? Como ousam as mulheres controlarem qualquer coisa?

Mas o momento que mais me marcou da entrevista está no minuto 57. Melhem diz que recebeu um texto de algumas amigas (eu adoraria o link desse texto, inclusive), em que uma mulher escreve para homens acusados de abuso. Nesse momento, ele começa a chorar pela segunda vez (não preciso lembrar vocês que ele é um ator, né?), e relembra o suposto texto.

"Ela fala assim: é muito difícil para um homem ser acusado de abuso e assumir que em algum momento pode ter sido abusivo, porque a gente acha que pessoas abusivas são pessoas más. Mas a maioria das pessoas que comete algum abuso, são pessoas boas que fizeram coisas ruins. E pessoas boas fazem coisas ruins. E você não é o que você fez".

MINHAS AMIGAS, o homem passou a entrevista inteira tentando nos convencer de que ele não é um abusador por diversas coisas que ele fez ou deixou de fazer, mas ter abusado moral e sexualmente de seis mulheres não define quem ele é?

Se você não é o que você faz, Marcius Melhem, você é O QUÊ? Ou essa afirmação só vale quando o que você fez foi cometer crimes? Se você fez algo legal, então aquilo é quem você é. Mas se expôs seu pênis ereto para uma mulher, aí não, foi apenas um ato ruim de uma pessoa boa.

O que você faz é EXATAMENTE quem você é. Você foi incapaz de assumir qualquer erro simplesmente porque você não acredita que errou. Você acha que todas as mulheres são burras e é do alto dessa arrogância e ignorância que você afirma que essas acusações deveriam ser tratadas em segredo de justiça e não no Instagram.

Não, o segredo acabou para vocês, abusadores. A gente vai tratar desses casos em público, porque a mudança precisa ser na sociedade inteira, todo mundo precisa saber que essas coisas acontecem. Guarda em segredo com os teus parças as merdas que você faz, porque nós, mulheres, não aguentamos mais o silenciamento. Sempre que possível, a gente vai gritar pra todo mundo ouvir, porque só assim alguma coisa tem a chance de mudar.

É difícil ter a vida interrompida e exposta, né Marcius? Agora você sabe um pouquinho como mulheres abusadas se sentem todos os dias. Sugiro mergulhar na sua própria lama por mais um tempo e talvez ficar por lá, porque você ainda não aprendeu nada e, pelo visto, nem está disposto a aprender.