Publicidade, audiência, streaming: por que a 'TV Globinho' não volta ao ar?
Weslley Neto
De Splash, em São Paulo
14/07/2022 04h00Atualizada em 15/07/2022 13h28
A pergunta que "persegue" os apresentadores das manhãs da Globo voltou na manhã de ontem. Patrícia Poeta foi questionada pelo baterista de Di Ferrero sobre o retorno da "TV Globinho" ao vivo no "Encontro". Mas afinal, por quais motivos a atração nunca retornou?
O questionamento já rendeu momentos engraçados envolvendo os funcionários da emissora. Fátima Bernardes, que comandou o programa de variedades matinal por 10 anos, comentou o assunto ao vivo.
"Eu dei uma aposentadoria para o Bob Esponja, foi ótimo. E continuo aqui, carregando o saco de areia. Há pessoas com mais de 30 anos que continuam questionando sobre isso", brincou em março durante conversa com o ator Paulo Vieira.
Manoel Soares, que chegou ao "Encontro" neste mês com Patrícia Poeta, também lembrou uma situação que envolve o programa infantil durante coletiva de imprensa promovida pela TV Globo.
Estávamos fazendo uma reportagem e um grupo de jovens nos cercou. 'Você é da Globo? A gente tem um assunto para tratar com vocês'. Pediram para abaixar a câmera. 'A gente quer fazer uma pergunta séria para fazer olho no olho, papo de homem. E aí, vai voltar a 'TV Globinho'?
Manoel Soares
Questões publicitárias, a concorrência e a audiência estão entre os fatores que atrapalhariam um retorno da 'TV Globinho', que deixou de ser diária em 2012 e permaneceu semanal até 2015. Splash entrou em contato com a TV Globo, que ainda não se posicionou oficialmente sobre o tema.
Proibição
Segundo a resolução nº 163 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) aprovada em 2014, é proibida a veiculação de propagandas direcionadas ao público infantil em todos os meios de comunicação.
Com isso, manter anúncios publicitários em um programa de TV voltado para crianças renderia punições às emissoras.
"Considera-se abusiva, em razão da política nacional de atendimento da criança e do adolescente, a prática do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança, com a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer produto ou serviço", diz um trecho da resolução.
Os canais não correm este risco mantendo a veiculação de propagandas durante o "Mais Você" e o "Encontro", por exemplo, por não se tratarem de atrações voltadas ao público infantil.
Em nota enviada a Splash, a ABRAL (Associação Brasileira de Licenciamento de Marcas e Personagens) afirma que a resolução do Conanda, que é um órgão consultivo, não proíbe publicidade infantil porque não é uma lei, mas vem sendo interpretada como tal, "o que gerou um declínio impressionante na veiculação da produção de conteúdos infantis em programas na TV aberta".
'Público não estava ali'
Fátima Bernardes também comentou sobre o assunto durante na "Press Award", premiação realizada nos EUA em que a apresentadora foi homenageada em 2018.
"Quando sugeri o horário da TV Globinho foi porque eu fiz uma análise da manhã da Globo. A gente começava com o telejornal local, para adulto, o telejornal de rede, 'Bom Dia Brasil', para adulto, o 'Mais Você', para adulto, o programa de saúde, 'Bem-Estar', para adulto. Onde você acha que estavam as crianças até essa hora? Não estavam ali né?", disse a apresentadora em entrevista coletiva.
"A programação infantil, com o grande número de TV a cabo, gadgets, tablets, foi ficando muito enfraquecida. Achava que existia um buraco que poderia ser preenchido por uma programação adulta", concluiu Fátima.
Aposta no streaming
A oferta de conteúdos infantis em plataformas de streaming também pesa contra um retorno da "TV Globinho" às manhãs da emissora carioca. Os desenhos, antes concentrados na programação diária, agora podem ser encontrados de diferentes formas.
Segundo coluna da jornalista Cristina Padiglione, divulgada pela Folha de S. Paulo em 2018, o objetivo da Globo é fazer com que o público consuma os conteúdos infantis no Globoplay.
Além de atrações do Gloob, canal do Grupo Globo na TV a cabo, a plataforma de streaming também oferece desenhos de diferentes épocas. "Dragon Ball", sucesso no Brasil desde a década de 1990, foi incorporado ao catálogo em junho deste ano.
Este caminho também é seguido por emissoras concorrentes. O SBT, por exemplo, disponibiliza novelas infantis via Netflix. O canal removeu da programação o tradicional "Bom Dia & Cia" em abril deste ano.