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Centenárias, Warner e Paramount buscam fusão e 'desmonte' para sobreviverem

Posicionadas antes dos filmes, as vinhetas de Warner Bros. Pictures (com a famosa caixa d'água) e da Paramount Pictures (com a memorável montanha) marcaram a vida dos amantes da cultura e do entretenimento. Acontece que, em 2024, estas marcas centenárias estão em busca de um caminho que garanta a sobrevivência pelo próximo século — ao menos da forma como estamos habituados.

Hoje, ambas foram ressignificadas como nomes de grupos de mídia gigantescos: Warner Bros. Discovery e Paramount Global. São grandes engrenagens que se movimentam como um elefante: de forma lenta e desajeitada. Isso em um ambiente cada vez mais dinâmico, transformado diariamente pelas mudanças na forma como consumimos conteúdo.

Uma montanha de dívidas

A Paramount é aquela que parece mais próxima de fazer uma grande movimentação para poder se reencontrar. O conglomerado atual é resultado de uma série de aquisições, fusões, divisões e novas fusões que vêm da segunda metade dos anos 1960. Desde a década de 1980, é controlado pela National Amusements, que começou como uma rede de salas de cinema e é de propriedade da família Redstone.

Shari Redstone, a atual presidente, tentou reposicionar a companhia mídia para o novo milênio, orquestrando uma nova grande mudança organizacional e criando o streaming Paramount+.

Para resumir a história, basta dizer que eles continuam patinando. Pior: a National Amusements, apesar de ter 77,4% do poder de voto no conselho, possui apenas 9,76% das ações. Por isso, a pressão dos outros acionistas é grande e o mercado está desconfiado. Os papéis da companhia, negociados na bolsa, acumulam uma queda de 52% em 12 meses. Em três anos, o tombo é de 73%. No balanço, há cerca de US$ 14 bilhões em dívidas e empréstimos devidos.

A iniciativa de plataforma própria de streaming não engrenou, com um total de 67,5 milhões de assinaturas. É a quinta, muito atrás de Netflix, Prime Video, Disney+ e Max. Para piorar, o serviço perdeu US$ 1,6 bilhão em 2023. Em um panorama de consolidação desse mercado, corre o risco de não justificar a sua existência em um futuro próximo.

Ao mesmo tempo, a companhia ainda tem uma importante divisão de TV paga, com marcas como Nickelodeon, MTV e VH1. Nenhuma delas conseguiu fazer a transição para a internet, e veem o número de assinantes caírem mês a mês. Hoje, a programação dos canais é marcada por reprises e reality shows com baixo custo de produção, diminuindo o valor de nomes tão conhecidos das gerações passadas. Sem falar que o contrato com a Charter, maior operadora deste mercado nos EUA, vence agora em abril.

Ainda fazem parte desse bolo o canal aberto norte-americano CBS e um pouco mais de doze emissoras locais. Uma rede que conserva a sua relevância, mas que não performa mais como no passado - e que traz uma série de restrições legais em um caso de fusão ou aquisição.

O copo meio cheio

Nem tudo está perdido. A Paramount é mais que um nome, um logo e uma vinheta: possui um enorme catálogo de produções que foram grande sucesso, de "MacGyver" a "Jornada nas Estrelas", além de ter franquias que faturam bem nos cinemas hoje em dia, como "Top Gun" e "Missão: Impossível". No streaming tem a plataforma Pluto TV, que é um caso de sucesso, com conteúdo gratuito em canais lineares atingindo cerca de 80 milhões de usuários únicos por mês.

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Isso sem falar nos icônicos estúdios em Hollywood, ocupando 62 acres (ou 250 mil metros quadrados) em um dos espaços mais valorizados e charmosos do mundo.

Por esse motivo, o mantra do mercado tem sido "fatiar para sobreviver". O fundo de capital privado (private equity, em inglês) Apollo Global teria, de acordo com The Wall Street Journal, oferecido US$ 11 bilhões para comprar apenas as divisões de cinema e TV da Paramount, incluindo o seu enorme catálogo. A transação dividiria o conglomerado em duas partes, deixando os streamings de fora. Não está claro se a proposta incluiria os canais de TV, mas é provável que não.

Com a primeira recusa dos controladores, o fundo aumentou a proposta para US$ 26 bilhões pelo grupo todo, mas o negócio não foi selado mais uma vez. Agora, de acordo com The New York Times, a Apollo está buscando o apoio da Sony, que já tem a Columbia Pictures, para fazer a aquisição em conjunto.

Shari Redstone, presidente da National Amusements, tem outros planos. A executiva abriu negociações para vender a Paramount Global para a Skydance Media, fundada por David Ellison, com quem já tinha um acordo para o lançamento de filmes — incluindo aí a própria franquia "Missão: Impossível". A estratégia, no entanto, pode envolver um "jeitinho": como Redstone não tem a maior parte das ações do grupo de mídia, a transação incluiria a venda da acionista controladora, justamente a National Amusements.

O posicionamento está deixando os outros acionistas irritados. Fontes ouvidas pela Reuters dão conta que eles podem processar Redstone caso ela venda o controle acionário.

A vez da Warner

Em dezembro, os CEOs de Paramount Global e Warner Bros. Discovery (WBD) — Bob Bakish e David Zaslav — teriam discutido a possibilidade de união entre as duas companhias, de acordo com o site de notícias Axios. Esse acordo, no entanto, esfriou pouco depois.

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Seja como for, a WBD está saindo agora do período que a proibia realizar uma nova fusão ou aquisição, resultado do acordo anterior, entre Warner e Discovery. O conglomerado está livre para decidir o seu futuro.

Não será fácil: a companhia vem de uma série de decisões questionáveis — desde que a provedora de internet AOL adquiriu a então Time Warner, em 2000. Em 2016, veio a desastrosa venda para a operadora AT&T, que, na prática, repassou tudo para a Discovery em 2022. Não é um histórico auspicioso para os futuros negócios.

O grupo também tem seus pontos altos e baixos. De um lado, inclui o centenário estúdio Warner Bros. Pictures, dono de franquias como "Harry Potter", "Senhor dos Anéis", "Mad Max", "Máquina Mortífera", "Duna" e diversas outras. Há também o braço de distribuição de TV, com títulos como "Friends" e "The Big Bang Theory" em seu catálogo. Para fechar, tem sob o seu guarda-chuva a DC Comics, que começou nos quadrinhos e é dona de personagens como Superman, Mulher-Maravilha e Batman.

No streaming, a Max está no meio-termo: ainda que não tenha o mesmo volume de espectadores de Disney+, Prime Video e Netflix, a plataforma consegue aproveitar bem todo essa biblioteca que tem em mãos.

Ao mesmo tempo, a WBD se vê presa ao mercado de TV paga tradicional, com canais que herdou da aquisição da Turner, ainda nos anos 1990. São marcas fortes (como CNN, TNT e Cartoon Network) que seguem gerando uma boa receita publicitária, mas que não conseguiram migrar de forma bem-sucedida para o digital e que perdem assinantes dia a dia, junto com as operadoras de televisão.

Por isso, a solução poderia incluir a venda de algumas dessas emissoras, a transformação delas em negócios separados ou, em atitude mais drástica, o encerramento de alguns dos canais menos rentáveis. Foi o que fizeram com a emissora aberta The CW, uma joint-venture entre Warner e Paramount que foi vendida para a Nexstar Media Group em 2022.

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Uma outra fusão também é possível. Além da Paramount, a WBD teve conversas com a NBCUniversal, dona do estúdio Universal Pictures e de propriedade da Comcast. Um acordo desses é complicado, envolvendo a aprovação das autoridades competentes, além de criar diversas dúvidas. Por exemplo: Warner, CBS e NBC possuem suas próprias emissoras de notícias 24 horas (CNN, CBS News e MSNBC), que certamente se sobrepõem e podem gerar uma preocupação anti-monopólio em caso de união, ou ainda problemas com sindicatos.

Como vemos, a sobrevivência pelos próximos 100 anos envolve um jogo de xadrez para lá de complicado.

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Reportagem

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