O Lênin do fim do mundo
Durante a história, a arte muitas vezes foi usada como forma de mostrar poder. Uma representação artística de um líder em um lugar era sinal de conquista. A arte como meio de carimbar a tomada de algum lugar. Era um aviso a quem chegasse a estas terras que agora elas estavam sob novo comando. Não importa quão distante ou pouco habitado fosse esse lugar. Até mesmo a Antártida tem uma estátua para marcar um território.
Uma arte soviética em uma área que hoje não tem mais ligação alguma com qualquer país do bloco. Localizado no continente antártico, em um lugar que leva o sugestivo nome do Polo da Inacessibilidade, segue em pé um busto do líder da revolução soviética, Vladimir Lênin. A história desse pedaço de arte em lugar remoto - 2 mil quilômetros distantes de qualquer costa - começa em 1957.
Em dezembro daquele ano, 32 exploradores soviéticos partiram da base costeira rumo ao ponto mais remoto do continente, o Polo da Inacessibilidade. Com a Guerra Fria am andamento, a União Soviética queria superar os EUA, que tinham estabelecido uma base no Polo Sul um ano antes. Dez tratores modificados com trenós foram enviados em um comboio através da neve levando a estátua e a estação de pesquisa a ser instalada no lugar mais inacessível do mundo.
A travessia completa levou praticamente um ano, com a missão enfrentando um inverno mais rigoroso que o esperado. Foram 2,1 mil quilômetros de gelo e neve, mais longe que o trajeto de São Paulo a Salvador. No local foram instaladas as cabanas e foi construída uma pista de pouso para aviões. Para coroar o local, o busto de Lênin foi instalado estrategicamente acima da cabana de rádio e virado para Moscou. A estação foi usada por apenas 12 dias e teve as atividades suspensas por causa de sua localização remota.
Desde então, poucas pessoas pisaram ali e puderam observar o busto voltado para Moscou. Foram mais duas missões soviéticas, uma dos EUA e mais três de turistas e aventureiros. Todas passagens de poucos dias e a última realizada no ano passado, quando só o busto de Lênin seguia visível, com toda a estação coberta de neve. Quem quiser se aventurar terá que enfrentar a barreira de temperaturas de 50 graus negativos e mais de 2 mil quilômetros até a base mais próxima. Tudo para ver a arte mais inacessível que possa existir. Não à toa, no Polo da Inacessibilidade.
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