Decadência com elegância: Cuba sofre com deserções antes do Pan 2023
Os porta-bandeiras de Cuba nos Jogos Pan-Americanos de Santiago serão a judoca Ydalis Ortiz e o boxeador Julio Cesar de la Cruz. Juntos, eles possuem seis medalhas olímpicas — três de ouro, duas de prata e uma de bronze — mas seu melhor momento já passou. Paris-2024 será a despedida de ambos.
Essa escolha reflete o atual momento esportivo cubano: ainda há atletas de nível mundial e grandes revelações, mas os tempos de grande potência já se foram.
Há duas semanas, Ariel Sainz fez uma previsão realista das pretensões de Cuba nos Jogos Pan-Americanos, que serão disputados em Santiago. Ele prometeu "muita luta em cada competição" e algo em torno de 18 a 22 medalhas de ouro, 8 a 12 de prata e 36 a 40 de bronze.
Se considerarmos a previsão mais otimista — 22 de ouro, 12 de prata e 40 de bronze, totalizando 84 medalhas — e compararmos com o Pan de Lima, em 2019, teremos uma queda acentuada. Em Lima, Cuba conquistou 35 medalhas de ouro, 27 de prata e 38 de bronze, totalizando 98 medalhas. Isso representa uma queda de 14% no total e 37% nas conquistas de ouro.
Com as medalhas previstas por Sainz, Cuba teria ficado apenas em oitavo lugar em Lima, quando o quinto lugar já mostrava uma decadência.
Sainz colocou o dedo na ferida e mostrou as causas: "Houve muitas deserções, inclusive de pessoas que poderiam vencer. Há também atletas que não abandonam as delegações no exterior, mas que pedem para deixar a seleção, de maneira natural. Em 2022, foram registradas 100 saídas e em 2023, 78". Ele citou 33 baixas que impactariam no quadro de medalhas.
Os exemplos são claros e dolorosos. Em 2021, nas Olimpíadas em Tóquio, Cuba ganhou sete medalhas de ouro. E quatro dos vencedores não competem mais pelo país: Andy Cruz, boxeador, foi um dos muitos que se profissionalizaram e Roniel Iglesias foi substituído por Javier Cuellar. Mijain Lopez, o lendário lutador de estilo greco-romano e quatro vezes campeão olímpico, talvez lute em Paris no próximo ano, mas não estará em Santiago. Além disso, Cuba não terá participantes na canoagem velocidade C2-1000m, pois Serguey Torres se aposentou e Fernando Jorge desertou — eram rivais de Isaquias Queiroz.
Mas as baixas não são apenas de atletas medalhistas de ouro. Juan Manuel Hechevarria conquistou a prata no salto em distância nas últimas Olimpíadas, com 8,41m. Yaimé Perez conquistou o bronze em Tóquio e Denia Caballero conquistou o bronze no Rio, ambas no lançamento de disco. Todos deixaram a Ilha. Maikel Massó, bronze no salto em distância em Tóquio, rompeu os ligamentos e ficará fora por um bom tempo.
No último Mundial de Atletismo, realizado este ano em Budapeste, Lázaro Martinez conquistou a prata no salto triplo, com 17,41m. Christian Napoles conquistou o bronze, com 17,40m. Ambos estarão em Santiago, mas os cubanos Pedro Pichardo (que compete por Portugal), italiano Yunior Diaz e espanhol Jordan Diaz, todos com saltos acima de 17,60m, não estarão presentes. Os dois "Diaz" conquistaram a prata e o bronze em Lima-19.
Fuga de cérebros
Cuba também sofre com a evasão de treinadores que vão trabalhar em outros países com aval do governo. Marileidy Paulino, dominicana e campeã mundial dos 400m, é treinada por Yasser Pérez, cubano. Yulimar Rojas, a venezuelana campeã olímpica e mundial do salto triplo, é treinada por Ivan Pedroso. Ambos moram na Espanha.
E por que os atletas desertam? Por falta de afinidade ideológica, mas principalmente por dinheiro. Cuba mudou sua política e agora permite que os prêmios em dinheiro fiquem com os atletas, mas mesmo assim não conseguem propor cifras parecidas. No boxe, por exemplo, ganha-se muito mais dinheiro em Miami do que ingressando no profissionalismo agenciado pelo governo cubano, através do Inder (Instituto Nacional de Deporte e Recreación).
No último Mundial, Cuba ganhou apenas uma medalha de ouro, com Yoenlis Hernandez. Na viagem de volta do Cazaquistão, ela parou no Panamá e desertou. Menos mal para Cuba, já que sua categoria — 75 quilos — não faz parte dos Jogos Olímpicos nem dos Jogos Pan-Americanos.
Mesmo com deserções, o boxe cubano é forte? Nem tanto. Perdeu o primeiro lugar geral para a Colômbia nos Jogos Centro-Americanos e do Caribe. Outro motivo para o rendimento fraco em Santiago é a ausência cubana em 193 provas de 41 esportes disputados, seja por não conseguir índice ou por serem esportes não praticados em Cuba.
Com tantos problemas, será possível ver alguns atletas cubanos de altíssimo nível. Luís Horta, campeão olímpico na luta greco-romana nos 60 quilos, agora foi campeão mundial nos 67 quilos. Leyanis Perez, com 14,98m, e Liadagmis Povea, com 14,93m, no salto triplo, estão se aproximando da mítica marca dos 15 metros e como não terão concorrência de Yulimar Rojas, podem ganhar a prova. Na canoagem, deve reinar Yarisleydis Cirilo, de 21 anos, que venceu o C1-200m em agosto no Canadá. Como ela é deputada na Assembleia cubana, é difícil pensar em deserção.
O império esportivo cubano está frágil, mas até antes da queda do Império Romano havia ótimos gladiadores lutando.
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