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Dome e Coudet vão de "melhor jogo do Brasileiro" a adeus em duas semanas

Domènec (e) e Coudet conversam antes daquele que foi apontado com um dos melhores jogos do Brasileirão 2020 - Pedro H. Tesch/AGIF
Domènec (e) e Coudet conversam antes daquele que foi apontado com um dos melhores jogos do Brasileirão 2020 Imagem: Pedro H. Tesch/AGIF

Alexandre Araújo, Bernardo Gentile e Marinho Saldanha

Do UOL, no Rio de Janeiro e em Porto Alegre

10/11/2020 04h00Atualizada em 10/11/2020 09h37

Dois dos principais candidatos ao título do Campeonato Brasileiro, Internacional e Flamengo vivem situação curiosa no início do segundo turno da competição. Há três rodadas, as equipes protagonizaram o que foi considerado o melhor jogo da temporada até aqui. Mesmo assim, mesmo que com motivos distintos, os dois clubes se viram na obrigação de trocarem os treinadores.

Sim, mesmo com campanha próxima dos 60% de aproveitamento, o líder Internacional e terceiro colocado Flamengo perderam seus comandantes. O Colorado não teve o que fazer, já que o argentino Eduardo Coudet apenas informou que havia aceitado oferta do Celta de Vigo, da Espanha. Já o Rubro-Negro vinha de uma série de desgastes internos e viu a situação explodir após as goleadas sofridas para São Paulo e Atlético-MG como determinantes para a demissão de Domènec Torrent.

No mercado, os clubes agiram rapidamente. O Flamengo já anunciou Rogério Ceni como seu novo treinador. O Inter tem um acordo encaminhado com um ídolo, Abel Braga.

Foi doloroso para o Inter não ganhar do Flamengo, que arrancou empate já nos acréscimos. Mas o resultado não teve absolutamente nenhuma influência no que aconteceu nos dias que seguiram. O rendimento do time foi comemorado internamente. Bater de frente com uma equipe cujo investimento é bem maior e que conquistou grandes títulos na temporada anterior fez os comandados de Coudet "ganharem respeito" e saírem fortalecidos.

O problema é que o relacionamento entre o comandante argentino e a diretoria nunca foi dos melhores. E a explicação é fácil. Coudet queria mais reforços, mas esbarrava frequentemente nos pés do chão da cúpula do futebol colorado, que precisou falar firme em diversos momentos. Portanto, a relação não era fácil e foi piorando com o passar do tempo. Principalmente pelas declarações públicas do treinador.

Eduardo Coudet tenso durante empate do Internacional contra o Coritiba  - MAX PEIXOTO/DIA ESPORTIVO/ESTADÃO CONTEÚDO - MAX PEIXOTO/DIA ESPORTIVO/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: MAX PEIXOTO/DIA ESPORTIVO/ESTADÃO CONTEÚDO

Após vitória com time reserva sobre o Atlético-GO fora de casa, pela Copa do Brasil, Coudet fez críticas em tom de brincadeira. "É como eu mandar você ao mercado para comprar coisas para um churrasco sem dinheiro, e mandar outro com dinheiro. É natural que quem tenha dinheiro faça o melhor churrasco", disse.

Nada disso pegou bem, até porque essa não havia sido a primeira reclamação. Veio o jogo contra o Corinthians, e depois do novo duelo com Atlético-GO, em Porto Alegre, o ápice da turbulência.

De praxe, Coudet citou que "o grupo é curto" e que adversários tem mais "jogadores de hierarquia". Foi além e não se mostrou empolgado com a chegada de Maurício para o meio-campo, único reforço que receberia nesta janela de transferências. Sendo que ele havia pedido publicamente ao menos quatro novos jogadores. Desta vez, a resposta foi imediata. O diretor executivo Rodrigo Caetano pediu a palavra e mandou alguns recados ao treinador, que se sentiu isolado.

Diante desse cenário, Coudet recebeu uma sondagem do Celta de Vigo, da Espanha. Desbravar o mercado europeu sempre foi um objetivo. A decisão de sair do Inter ficou mais fácil com a falta de apoio nos bastidores e, claro, o fato de estarem em páginas distintas em relação à montagem do elenco. Após o jogo contra o Coritiba, domingo (8), informou os dirigentes, que foram pegos de surpresa. Irredutível, comunicou que estava de saída.

O Flamengo, por sua vez, jamais navegou em mares tranquilos após a saída de Jorge Jesus. A escolha por Domènec Torrent se mostrou duvidosa desde os primeiros jogos do catalão pelo Rubro-Negro. Havia um consenso entre diretoria e nova comissão técnica que o melhor caminho seria fazer uma transição tranquila da forma de jogar com o português e que deu tanto certo em 2019. Porém, nada disso aconteceu.

Dome comanda o Flamengo diante do Junior Barranquilla, no Maracanã - Alexandre Loureiro/Conmebol - Alexandre Loureiro/Conmebol
Imagem: Alexandre Loureiro/Conmebol

Convicto, Dome fez mudanças logo de cara e o time piorou. Tais crenças, inclusive, geraram um desgaste interno entre elenco, diretoria e o treinador. O entendimento coletivo é que a filosofia do novo comandante precisaria de tempo e muito treinamento para dar certo - o que está em falta no futebol brasileiro. Neste cenário, era esperado uma mudança de postura de Dome, mas ela jamais aconteceu. Parte da diretoria, inclusive, já estava insatisfeita com ele antes mesmo das históricas goleadas sofridas para são Paulo e Atlético-MG recentemente.

No entanto, o diretor de futebol Marcos Braz teve papel fundamental na manutenção de Dome por mais tempo no Flamengo. Contra o Inter, um jogo decisivo pela liderança do Brasileiro, um resultado heroico. A percepção, porém, é que tudo aconteceu mais na base do coração do que pelo jogo coletivo. Mesmo assim, o empate espantou uma pressão ainda mais precoce. Durou pouco.

A verdade é que Dome não se ajudava. Apesar de querido por todos, ele não conseguiu colocar em prática suas ideias. Além disso, insistia em opções que se mostravam erradas a cada partida. Como, por exemplo, insistir em Gustavo Henrique, mesmo diante falhas em sequência e não utilizar o jovem Thuler, bem avaliado internamente.

Com as goleadas sofridas para São Paulo e Atlético-MG o clima ficou insustentável. Redes sociais, torcida, alta cúpula e grupos políticos pressionavam pela demissão que se concretizou na última segunda-feira (9).