Futebol brasileiro testa reinvenção à la Tite após rejeitar modelo Osorio
A sequência da seleção de Tite na Copa do Mundo passa pelo duelo contra um nome que os torcedores brasileiros conhecem bem. O enfrentamento da próxima segunda-feira (2), contra o México, recoloca Juan Carlos Osorio em evidência diante de um público com o qual teve relação intensa há três anos. Muito questionado sobre seus métodos pouco usuais, o colombiano reviveu a sina do técnico estrangeiro em território nacional e foi o grande expoente de um modelo de renovação que foi rejeitado. Na Rússia, fará o embate justamente com a proposta de reinvenção que mais emplacou no Brasil pós 7 a 1.
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Em 2015, quando o país buscava conhecimento na esteira dos vexames da Copa em casa, Osorio chegou ao São Paulo. Na época, o clube procurava abertamente um nome fora do mercado nacional, tentando trazer "frescor" ao seu banco de reservas. Mentor intelectual do Atletico Nacional que seria campeão da Libertadores no ano seguinte, o colombiano se encaixava perfeitamente no conceito de "ousadia" que o clube propunha. Era, na verdade, ousado até demais para os padrões nacionais.
Saída de bola sem medo de errar, goleiro adiantado, mudanças de sistema tático, o famigerado "rodízio" de jogadores entre uma partida e outra... Osorio foi quase sempre o tema dos debates, com o time vencendo ou não. Boa parte dos jornalistas que acompanhava o São Paulo à época aprovava as transformações, mas as críticas sempre existiram, e não só da imprensa.
Então presidente são-paulino, Carlos Miguel Aidar enviou uma mensagem privada para Osorio com o seguinte conteúdo: “Pare de inventar”. Uma frase curta, revelada pelo próprio treinador em entrevista coletiva, simbolizou a dificuldade de clube, torcida, imprensa e o futebol brasileiro como um todo para aceitar a linha de trabalho proposta. O episódio em si, o cenário muito refratário às suas ideias e os problemas políticos do São Paulo criaram um cenário de instabilidade que tornou-se insustentável quando a proposta do México chegou. Quatro meses depois, ele se foi.
Osorio deixa fãs, mas estrangeiros não emplacam
Osorio se foi, mas deixou para trás uma relação sólida com o São Paulo e uma legião de fãs. Já visitou o Morumbi como torcedor, é tratado com carinho por boa parte da torcida e deixou admiradores na diretoria. Fora do clube, conquistou analistas interessados em seu pensamento heterodoxo e a disposição intensa de rever conceitos. Sua influência foi tanta que até Rogério Ceni, após só 18 jogos de convivência, se rendeu.
"Aprendi muito no treinamento diário, com conceitos de campo. Foi aí que vi que não estava tão preparado quanto imaginava. Foram quatro meses de muito aprendizado. Do que aprendi e escutei ao longo da carreira, vi treinadores que, comparativamente, faziam eu me sentir preparado para seguir a carreira pós [vida de] atleta. Osorio mudou isso", disse Ceni no fim de 2015, quando pendurou as luvas e foi estudar para ser técnico.
Embora tenha plantado sua semente na discussão futebolística nacional, Osorio não conseguiu seguir por aqui, e tampouco o fizeram outros treinadores estrangeiros. A ideia de que alguém de fora renovaria o futebol após o 7 a 1 abriu as portas, ao longo de quatro anos, para nomes como Ricardo Gareca, Juan Carlos Osorio, Edgardo Bauza e Reinaldo Rueda. Em diferentes medidas, todos sofreram com a falta de resultados e um certo preconceito por não serem brasileiros.
Não é coincidência que todos tenham saído do país direto para as seleções de Peru, México, Argentina e Chile, respectivamente. As melhores cabeças do continente, atraídas para o mercado nacional depois de bons trabalhos em clubes estrangeiros, saíam do país sem marcar suas passagens com títulos. Que três deles tenham optado pelo rompimento sem serem demitidos só amplia o problema. Hoje, passada a febre, Diego Aguirre, no mesmo São Paulo, é o único gringo no comando de um clube da primeira divisão. A onda agora é apostar em técnicos estudiosos, de perfil discreto e eficientes. Como Tite e Fabio Carille, seu pupilo.
Tite puxa a fila e Carille mostra novo caminho no país
Quando Juan Carlos Osorio chegou ao Brasil, em 2015, Tite já era campeão de tudo e o treinador mais popular do país. Foi a ascensão à seleção brasileira, porém, que o colocou à frente da verdadeira "reinvenção" do futebol brasileiro pós 7 a 1.
No comando de Neymar e companhia, Tite levou o Brasil à liderança das Eliminatórias Sul-Americanas, renovou a relação da seleção com a torcida e recolocou o país na elite mundial. Paralelamente, viu seu sucessor no Corinthians, Fábio Carille, seguir a linha de trabalho para levar o Corinthians de 2017 ao mesmo título brasileiro que o "mentor" havia conquistado dois anos antes.
Hoje, cinco dos 20 treinadores da Série A (Jair Ventura, Thiago Larghi, Mauricio Barbieri, Osmar Loss e Odair Hellman) construíram suas carreiras a partir de um papel inicial como interinos. No começo do torneio, ainda tinham a companhia de Zé Ricardo, Alberto Valentim e o próprio Fábio Carille, cujo sucesso foi o maior argumento dos dirigentes na busca de um treinador "prata da casa". Todos esses repetem a mesma história: surgiram há cerca de dois anos, têm perfil discreto e exaltam os estudos.
Não é coincidência que tudo isso se assemelhe à postura de Tite, abertamente uma inspiração para a maior parte desses nomes. Até o São Paulo, hoje o único que ainda aposta em um estrangeiro, também prepara André Jardine para a ascensão em um futuro próximo.
Copa do Mundo será palco do aguardado Tite x Osorio
Em um novo país, Osorio também convive com questionamentos parecidos, mas ganhou prestígio por alguns feitos. Somou 16 jogos de invencibilidade [perdida por uma humilhante goleada de 7 a 0 contra o Chile], obteve uma vitória histórica como visitante nos Estados Unidos, impôs 1 a 0 na campeã mundial Alemanha... E tudo isso sem abdicar da ousadia. Uma das excentricidades de seu time é deixar sempre três jogadores no ataque quando o adversário tem escanteio para bater na área mexicana.
O modelo Osorio foi comentado por Casemiro, que respondeu com bom humor sobre como reagir à estratégia. “Você quer que eu entregue o ouro para o México, pô [risos]. Não vou falar, mas nós sabemos que ele é um treinador que sempre surpreende. Ele é um grande treinador e tem o respeito de todos nós. Ele vai querer fazer algo”, comentou.
“Se eles tiverem o propósito de tentar jogar, vai ser melhor. Que eles tenham a qualidade. Eu diria que essa pergunta é difícil porque o treinador deles é muito esperto. Ele trabalhou no São Paulo. Não podemos cair nesta armadilha. Tenho certeza que ele vai tentar surpreender”, concluiu ainda Casemiro.
O duelo que se apresenta para as oitavas de final define, em primeira instância, a vida das duas seleções. Em segundo plano, porém, também é um embate sobre as duas filosofias, dado o contexto interno de cada país e o peso da Copa do Mundo. Uma derrota acachapante tem o poder de fragilizar tanto Osorio como Tite, assim como as filosofias de trabalho que eles representam.
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