Por que maior transferência de Maradona custou 10% da ida de Neymar ao PSG
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
A morte de Maradona causou uma comoção no mundo e na Argentina por ser uma personagem que marcou uma era do futebol. Uma época anterior à expansão da comercialização do esporte que o transformou em um negócio de entretenimento global. Justamente por isso, a maior transferência do jogador argentino representou uma pequena fração da grande transação do "novo futebol".
Ressalte-se primeiro que Maradona não foi um jogador vendido por qualquer preço: era reconhecido como um dos maiores craques dos anos 80 e valorizado de acordo com essa qualificação. Não foi barato para o Barcelona lhe tirar do Argentino Juniors e do Boca Juniors (que o dividiam e o negociaram por US$ 7 milhões). E foi ainda mais caro para o Napoli levá-lo para brilhar na Itália.
Tomemos essa última transferência como referência. Segundo o ex-presidente do Napoli, Corrado Ferlaino, em entrevista ao jornal "AS", a transação com o Barcelona custou ao clube entre US$ 10 milhões e US$ 11 milhões a valores da época. Um cálculo da inflação no período na moeda americana atualiza o valor para US$ 27 milhões (ou 22,6 milhões de euros).
Bem, com se sabe, Neymar deixou o mesmo Barcelona pelo PSG pela multa de 222 milhões de euros. Essa cifra ainda não foi quebrada, embora tenha se tornado relativamente comum o pagamento de multas acima de 100 milhões de euros em transações europeias.
E como se chegou a essa discrepância de valores? Na década de 90, portanto quando Maradona estava perto do final da carreira, as competições europeias foram reformuladas. A Champions League, como a conhecemos hoje, surgiu em 1993 em uma parceria da UEFA com a empresa de marketing Team. Um ano antes, a revolução no futebol inglês levou à criação da Premier League, basicamente idealizada por motivos capitalistas, de algum de dinheiro.
A transformação das competições provocou uma explosão das receitas com televisão, marketing e ingressos. Atualmente, a Champions League gera 3 bilhões de receitas anualmente, sendo dois terços distribuídos aos clubes.
Desde então, o futebol europeu e mundial vive uma aceleração de receitas e, por consequência, do dinheiro destinado à formação de times. Levantamento da empresa Deloitte mostra que o clube mais rico do mundo em 2004/2005, o Real Madrid, ganhara 275 milhões de euros. Na última temporada, o mesmo relatório apontou que o Barcelona, clube com maior arrecadação, atingiu 841 milhões de euros de receita. Ou seja, triplicou-se a receita de clubes em 15 anos.
O Napoli, casa italiana de Maradona, teve renda de 200 milhões de euros no último ano do futebol europeu. Ou seja, teria dinheiro para comprar nove Maradonas. Quando contratou o argentino, a transação foi um enorme esforço financeiro do clube e de seu jogador.
Apenas nos últimos sete anos, triplicou-se os valores gastos com contratações no futebol mundial. De 2012 para 2019, esse montante saltou de US$ 2,7 bilhões para US$ 7,3 bilhões, segundo o relatório de transferências anual da Fifa.
Até o futebol brasileiro e sul-americano tem experimentado uma expansão de receita nos últimos dez anos, especialmente depois que a Libertadores passou a ter uma lógica mais comercial.
A era em que Maradona foi protagonista é a primeira em que as transferências de jogadores atingem os milhões de dólares e que o continente europeu passa a atrair os craques sul-americanos em maior número. A seleção brasileira de 1982 teve uma debandada de seus craques irem parar em times italianos. Mas a revolução comercial que se seguiu esse movimento faz com que aqueles brilhantes jogadores tenham preço no máximo de atletas medianos no futebol atual.
Em um artigo no "New York Times", o jornalista Rory Smith defendeu que a perda de Maradona foi tão sentida porque ele foi o símbolo de uma era anterior ao futebol corporativo atual. "Maradona, e tudo que ele representa, estariam relegados ao passado. Ele se tornaria, em seus últimos anos, um avatar do que o futebol foi um dia, para inspirar nostalgia do que perdemos."
A comparação entre as transferências de Neymar e Maradona, com 33 anos de diferença, demonstra que o seu ponto está correto. E a morte de Maradona talvez represente o epílogo desse futebol romântico antes de executivos o transformarem em um grande negócio, para o bem ou para o mal.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.