Em versão mais Tite e menos Diniz, Alcaraz volta a vencer
Quando Carlos Alcaraz perdeu o primeiro set da final de Wimbledon, lá em julho do ano passado, o ex-tenista John McEnroe, que comentava a partida no sinal internacional, disse que o espanhol teria grandes dificuldades para virar aquele jogo porque derrotar Novak Djokovic em Wimbledon exigiria uma disciplina tática que nunca foi o ponto forte de Carlitos.
Todo mundo sabe como terminou aquela tarde de domingo em Londres, mas McEnroe não estava equivocado em sua análise. O que o circuito mundial viu desde Wimbledon foi um Alcaraz talentosíssimo, mas com dificuldade para conquistar títulos. Um tenista que frequentemente tomava decisões erradas no meio dos pontos e que se via obrigado a ganhar pontos de maneiras mais complicadas do que o estritamente necessário.
Pois o Alcaraz que venceu Indian Wells neste fim de semana mostrou uma disciplina raramente vista em suas partidas. Sem deixar totalmente seu estilo naturalmente agressivo, o espanhol de 20 anos ainda produziu belas jogadas e protagonizou pontos espetaculares, mas não colocou-se em apuros como vinha fazendo. Foi mais comedido, mais pragmático - sobretudo na semifinal contra Sinner - deu menos pontos de graça e, principalmente, precisou executar menos bolas de baixa porcentagem.
Tennis of the HIGHEST Order ⚡@carlosalcaraz with utter brilliance!#TennisParadise pic.twitter.com/b6amNJsahq
-- Tennis TV (@TennisTV) March 17, 2024
Nenhuma subida à rede afobada, poucas curtinhas fora de hora e raros forehands kamikazes. Meus colegas do jornalismo futebolístico diriam que Alcaraz foi mais Tite e menos Diniz. E, às vezes, é isso que um atleta (ou um time!) precisa para alcançar o seu potencial - já falei sobre o caso de Federer no texto linkado acima. O Alcaraz de Indian Wells foi paciente, manteve-se em mais trocas do fundo de quadra, sempre usando bolas potentes e fundas e fez Sinner correr mais riscos. O italiano errou mais e, a partir do segundo set, o jogo foi inteiro do espanhol.
Na final, isso ficou menos evidente, mas só porque o jeito Medvedev de ser exige mais versatilidade e uma capacidade maior de improviso por parte do adversário. Alcaraz tem essas qualidades e um pouco mais. Forçou menos situações do que no US Open, cometeu menos erros (proporcionalmente falando) e, depois de um delicado tie-break, deslanchou até o título.
Coisa que eu acho que acho:
- Não acho que um maior pragmatismo tire brilho do tênis de Alcaraz. Carlitos sempre terá a capacidade de tirar da cartola bolas improváveis e espetaculares. O que ele precisa entender - e parece que vem entendendo - é que não precisa de tantas jogadas de efeito e improviso (e executadas quase que aleatoriamente) para vencer. Pelo contrário. A julgar pelo período desde Wimbledon até Indian Wells, elas mais atrapalharam do que ajudaram nos resultados.
- Tampouco acredito que um tenista (ou um time!) precise ser mais Tite ou menos Diniz para vencer ou alcançar o máximo de seu potencial. São visões diferentes de ver e viver a vida e o esporte, e ambas podem ter sucesso. No entanto, acredito que o momento de Alcaraz, assim como já aconteceu com Federer, pedia essa dose de tênis com mais razão e menos emoção. E "menos emoção" aqui não significa menos emocionante ou empolgante.
- Com o vídeo do ponto espetacular incluído neste post, tento ilustrar exatamente a capacidade de Alcaraz de continuar fazendo coisas extraordinárias. Porém, trata-se de um lance em que o espanhol é forçado por Medvedev a fazê-las. Não foi o próprio Carlitos que se colocou numa situação em que seria necessário executar bolas de baixa porcentagem para vencer o ponto. E isso, ao longo de dois, três, quatro sets, faz toda a diferença do mundo.
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