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Julio Gomes

REPORTAGEM

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Com Taffarel no gol, Atlético já jogou fora vantagem de 4 a 0 em uma final

Goleiro Taffarel durante treino do Atlético-MG nos anos 90 - Paulo Giandalia/Folha Imagem
Goleiro Taffarel durante treino do Atlético-MG nos anos 90 Imagem: Paulo Giandalia/Folha Imagem

14/12/2021 15h43

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Dia 19 de dezembro de 1995. Um dia histórico para duas torcidas: a do Rosario Central, da Argentina, e do Atlético Mineiro. Foi o dia em que o Central conquistou seu único título internacional, a Copa Conmebol - antecessora da atual Copa Sul-Americana. E o dia em que o Galo desperdiçou uma vantagem que nunca um time havia desperdiçado em uma final deste porte. E que agora ele tem novamente.

Nesta quarta-feira, em Curitiba, o Atlético tem a chance de conquistar o título da Copa do Brasil. Para isso, basta defender a vantagem construída no jogo de ida, com os 4 a 0 impostos para cima do Athletico Paranaense. É a chance de repetir o que fez o rival Cruzeiro em 2003, ganhando Brasileiro e Copa do Brasil no mesmo ano.

Este é o repeteco dos sonhos. Mas há também a possibilidade de um repeteco dos pesadelos, que o torcedor do Galo não gosta nem de lembrar. Em 1995, na final da Conmebol, o Atlético fez 4 a 0 sobre o Rosario Central no jogo de ida. Para levar outros 4 a 0 na volta e perder o título nos pênaltis. Contarei mais sobre essa história mais adiante (com vídeo).

O time atual foi montado com alto investimento dos mecenas que assumiram o Galo. Tem Hulk, tem Nacho, tem jogadores de várias seleções, da brasileira e sul-americanas. O de 95 não era assim tão glamouroso - como a Copa Conmebol também não era. Mas o time tinha Cláudio Taffarel, goleiro tetracampeão do mundo com a seleção um ano antes.

A Conmebol foi criada em 1992 para ser uma versão sul-americana da Copa da Uefa, ou seja, a segunda mais importante do continente. Os clubes se classificavam em função do que faziam nos campeonatos nacionais.

O Galo foi campeão logo de cara da primeira edição, em 1992. Enquanto São Paulo, campeão brasileiro, e Criciúma, campeão da Copa do Brasil, foram para a Libertadores-92, a primeira Conmebol teve as participações do Grêmio, vice da Copa do Brasil, Bragantino, vice do Brasileiro, Atlético e Fluminense, que haviam sido eliminados nas semifinais do Brasileirão do ano anterior.

O Galo passou pelo Flu, Junior (COL), El Nacional (EQU) e ganharia a final contra o Olimpia, com dois gols de Negrini na vitória por 2 a 0 na ida (depois, perderia por 1 a 0 no Paraguai).

Como detentor do título, o Atlético voltou à Conmebol em 93 e caiu para o Botafogo na semifinal - depois de vencer por 3 a 1 em BH na ida, levou em 3 a 0 na volta. O Botafogo conquistaria o título contra o Peñarol, nos pênaltis.

Em 94 foi a vez de o São Paulo ganhar usando seu time reserva, o chamado "Expressinho" que Muricy Ramalho comandava, enquanto Telê Santana cuidava do time principal.

Em 1995, o Atlético voltou ao torneio, pois havia chegado à semifinal do Brasileirão de 94. Estavam também no torneio o Corinthians, algoz do Galo e que perderia a final para o Palmeiras, o Guarani, outro semifinalista do BR-94, e o Ceará, que havia perdido a final da Copa do Brasil para o Grêmio.

Na campanha até a decisão, o Atlético passou pelo Guarani, pelo Mineros, da Venezuela, e pelo América de Cali, da Colômbia, nos pênaltis. Chegou a final contra o Rosario Central, um clube centenário, dos mais antigos da Argentina, mas que nunca havia conseguido uma glória internacional.

O primeiro jogo foi um passeio no Mineirão. Diante de 55 mil torcedores, o time comandado por Procópio Cardoso goleou por 4 a 0, com gols de Ézio, Cairo, Paulo Roberto e Silva. Naquele time do Central jogava Coudet, que foi técnico do Inter e hoje está no Celta.

Havia sido uma temporada cheia de altos e baixos para o Galo. Foi campeão mineiro, eliminado nas quartas da Copa do Brasil e, no Brasileiro, fez um primeiro turno ridículo, mas um segundo turno bom, ficando a um ponto de se classificar para as semifinais. Havia tido quatro técnicos no ano - Levir Culpi, Mussula, Gaúcho e Procópio - com ele, o time carregava este bom momento do Brasileiro para a final.

Aí, veio a tragédia no Gigante Arroyito, que estava abarrotado com 45 mil pessoas. O Galo foi a campo para aquela partida com Taffarel no gol; Dinho, Ademir, Ronaldo e Paulo Roberto; Carlos, Doriva, Éder Lopes e Leandro Tavares; na frente, Renaldo e Ézio. Com 23min, o Rosario abriu o marcador, um gol de Da Silva. Mas o problema foi o "apagão" nos minutos finais do primeiro tempo, quando o Galo levou dois gols - Carbonari (de falta, em frango engolido por Taffarel) e Cardetti. No segundo tempo, após muita pressão, o Rosario chegou aos 4 a 0 com um gol de Carbonari, aos 43min.

A disputa acabou indo para os pênaltis - um ano antes, Taffarel havia sido campeão da Copa após a disputa de pênaltis contra a Itália. Logo de cara, Doriva e Tavares perderam cobranças para o Atlético. Taffarel salvou o primeiro match point anotando o gol em uma cobrança e, em seguida, salvou o segundo defendendo o chute de Colusso. Euller, que havia entrado durante a partida, salvou o terceiro match point: 3 a 3. Mas, no quarto, não teve jeito. Da Silva superou Taffarel e fechou a disputa em 4 a 3 para o Central, fazendo o Arroyito explodir.

Foi a única vez em que um time abriu 4 a 0 em uma final de campeonato a dois jogos e ficou sem título. O Galo voltaria a conquistar a Conmebol em 1997, vencendo o Lanús na final. Foi uma redenção para Taffarel, antes de voltar para a Europa e jogar pelo Galatasaray.

O Santos seria campeão no ano seguinte. Entre 92 e 99, portanto, foram cinco títulos brasileiros em oito edições, que só teve uma final sem times do país. A Copa Mercosul, criada em 1998 e que teve apenas quatro edições (três delas vencidas por brasileiros), meio que substituiu a Conmebol. E aí, a partir de 2002, de forma definitiva, foi criada a Sul-Americana, que perdura até hoje.

Se rolasse uma "unificação" dos títulos destas competições, o Atlético estaria no topo da lista com duas conquistas, ao lado do próprio Athletico-PR, do São Paulo e dos argentinos Boca Juniors, Independiente, Lanús e San Lorenzo. Mas o Galo poderia ter três. Não fosse o derretimento sofrido em Rosario, exatos 26 anos atrás. Derretimento que o técnico Cuca, logicamente, tentará evitar nesta quarta, na Arena da Baixada.