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André Rocha

Nem Ceni pode ser comparado aos bons técnicos estrangeiros em times grandes

Rogério Ceni comanda o Fortaleza em partida do Campeonato Brasileiro de 2019 - Thiago Ribeiro/AGIF
Rogério Ceni comanda o Fortaleza em partida do Campeonato Brasileiro de 2019 Imagem: Thiago Ribeiro/AGIF

Colunista do UOL Esporte

19/10/2020 11h18

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O Fortaleza enfiou 2 a 0 no pouco que sobrou do Palmeiras de Vanderlei Luxemburgo. Mais uma boa atuação do time de Rogerio Ceni. Intenso, organizado, versátil e rápido nas transições ofensivas com Yuri César, David e Osvaldo. Mais uma bela combinação de desempenho com resultado dentro do contexto, assim como foi o empate por 3 a 3 com o São Paulo na ida das oitavas da Copa do Brasil e a vitória por 2 a 1 sobre o Atlético Mineiro. Ambos com um homem a menos.

O time cearense ocupa a sétima colocação com um jogo a menos. Pode se colocar como candidato real a uma vaga na Libertadores porque é competitivo quase sempre. Méritos de Ceni, que amadurece o trabalho retomado depois da breve "aventura" no Cruzeiro.

Hoje é o treinador brasileiro com potencial para duelar quase em igualdade de condições com os melhores estrangeiros no país, que comandam grandes equipes. Eduardo Coudet do Internacional, Jorge Sampaoli do Atlético Mineiro e Domènec Torrent no Flamengo. O trio que lidera o Brasileiro ainda pode ganhar a companhia de Miguel Àngel Ramírez, com contratação bem encaminhada pelo Palmeiras.

O Fortaleza venceu Inter e Galo, perdeu para o Flamengo. Mas Ceni nunca tem a obrigação de fazer sua equipe agredir esses adversários mais poderosos e, consequentemente, ceder espaços. Pode ser reativo até em seus domínios, sem culpa. É sempre franco-atirador. Qualquer ponto conquistado nesses confrontos é lucro. Porque o técnico é rei em Fortaleza. Participa da gestão como uma espécie de manager informal.

Mas nos jogos em que ficou na condição de protagonista teve mais dificuldades, como nos empates com Coritiba e Atlético-GO. E sofre com o jogo reativo de Guto Ferreira nos clássicos contra o Ceará. Natural pelas características dos jogadores, dentro da oscilação em um campeonato de contexto único na pandemia e, claro, também parte do processo de amadurecimento do trabalho de Ceni.

Como seria, por exemplo, uma volta ao São Paulo, com toda pressão por títulos, mesmo considerando a idolatria da torcida por um dos maiores ídolos da história do clube, senão o maior? A cobrança seria por resultados, mas também um estilo agressivo, ofensivo, com toques de espetáculo. O jovem treinador estaria preparado?

Ainda não temos como saber. Mas podemos testemunhar a evolução nos trabalhos dos dois argentinos e do catalão que disputam a ponta da principal competição nacional. Só Coudet desde o início do ano, resistindo ao calvário dos Grenais e, depois do empate no último, emendando quatro vitórias. Sampaoli ainda teve a pré-temporada antes da volta do futebol e Dome nem isso, assumindo a responsabilidade de suceder Jorge Jesus a menos de uma semana da estreia.

E chegando ao final do turno suas equipes já sobram, com as digitais de seus técnicos, claramente. Nos pontos corridos, fórmula que quase sempre premia os trabalhos mais consistentes. Onde a competência fica mais clara, sem a máscara de uma atuação mais ou menos feliz que pode mudar a percepção do todo.

Se Ramírez chegar e fizer o Palmeiras também combinar desempenho e resultados, o cenário ficará ainda mais complexo para os treinadores brasileiros. Não só pelo produto final em campo, mas também nas ideias e nos métodos para aplicá-las. Gargalo, por exemplo, de Fernando Diniz e Roger Machado.

Não é questão de vir de fora, como Jesualdo Ferreira, Edgardo Bauza, Paulo Bento e outros já deixaram bem claro. É claro que pontualmente um brasileiro pode criar problemas para um "forasteiro". Hoje mesmo, com Mano Menezes fazendo o Bahia negar espaços ao Galo de Sampaoli no jogo que encerra a rodada. Mas no longo prazo fica clara a diferença de quem sabe fazer seguindo o que se aplica nos principais centros.

Rogerio Ceni vive essa transição, mas ainda não parece pronto. Estariamos diante de um fenômeno se já estivesse. Mas o caminho, embora longo, é promissor.