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Mentiroso, Dani Alves deve ser o 1º a pagar caro por desrespeitar mulheres

Lado a lado, na capa do UOL, duas notícias me deprimem pelo mesmo motivo: "Diretoria do Corinthians vai se reunir com organizadas e sugerir nome de Cuca" e "Sócio de boate, em julgamento de Dani Alves: 'Ela queria sair e não podia'".

Ah, um teve sua condenação anulada por questões processuais e o outro não foi condenado ainda. Lá vem você, a juíza que condena como bem entende! Justiceira! Dona da verdade!

Bom, o caso Cuca você pode entender melhor aqui, mas em resumo: ele foi condenado pelo estupro de uma menina de 13 anos e teve essa condenação anulada recentemente porque o julgamento à revelia não é mais permitido na Suíça (na época, réus podiam ser julgados mesmo sem advogados presentes). O mérito não foi avaliado, portanto, ele não foi inocentado.

Daniel Alves está de fato em julgamento e não é ainda um homem condenado por estupro. Mas já sabemos que o lateral levará ao tribunal sua quinta versão sobre o caso. Quinta.

Primeiro, numa entrevista à televisão em janeiro de 2023, ele disse que nem sequer conhecia a vítima. No mesmo mês, em depoimento à polícia, afirmou que nada tinha acontecido e, depois, que ocorrera sexo oral consentido. Em abril, em depoimento à Justiça, admitiu que houvera penetração na relação sexual.

Agora, a estratégia é dizer que Alves estava bastante embriagado.

Enquanto isso, a vítima manteve a sua versão, fez de tudo para permanecer no anonimato e abriu mão de dinheiro a que teria direito, reforçando sua busca por aquilo que mais importa: justiça. Ela, pessoas próximas e funcionários da boate já depuseram, todos reforçando o que indicam a denúncia e as evidências, incluindo imagens da noite em questão.

Ainda assim, há quem diga que se trata de mais uma aproveitadora e quem mandou aceitar convite para área VIP com jogador de futebol. Como se qualquer argumento pudesse justificar um estupro. Como se o "não" fosse relativo — ao contexto, aos envolvidos, ao momento em que é proferido. Como se denúncias falsas ocorressem no mesmo volume que crimes de violência sexual.

Por que a palavra do homem segue valendo tanto? Mesmo diante dos números absurdos de estupro (o Ipea estima que no país ocorram 822 mil por ano, ou quase 2 por minuto) e feminicídio (com 4 por dia, o Brasil ocupa a quinta colocação no ranking mundial de país com mais mortes violentas de mulheres). Mesmo diante de mentiras expostas publicamente?

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Mesmo diante de uma vítima que só teve seu nome divulgado pela família do suposto estuprador — a mãe de Daniel Alves expôs fotos da jovem em suas redes sociais — e que nunca quis saber de compensação financeira. Mesmo diante de evidências, como no caso de Cuca, que teve seu sêmen encontrado no corpo da criança estuprada.

A nossa palavra sempre vale menos. O nosso conhecimento. Nossos feitos. Já perdi as contas de quantas vezes fui instada por homens a provar que entendia de futebol, não satisfeitos com o fato de eu dizer que sim, nem com o fato de eu ser contratada por dois dos maiores veículos de comunicação do país para falar de futebol. Sem falar nas vezes em que meus nãos foram atropelados.

É difícil manter a esperança quando o noticiário reflete uma realidade tão torpe. Quando o que está ruim sempre pode piorar.

Daniel Alves deve ser o primeiro de sua estirpe a pagar caro por desrespeitar uma de nós (caso julgado culpado). Oxalá não seja o último.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.