Fiat Linea LX melhora argumentação, mas sedã segue ignorado
Há casos em que excesso de expectativa atrapalha e, como na história que vamos contar agora, empaca o desempenho. Em setembro de 2008, a Fiat lançou o sedã Linea com preços, equipamentos e propaganda (que escalava até Michael Schumacher, heptacampeão da Fórmula 1 e então funcionário da Ferrari e, consequentemente, do grupo Fiat) para retornar ao segmento dos médios e brigar forte com os líderes Honda Civic, Toyota Corolla e Chevrolet Vectra. O carro, no entanto, nunca decolou.
Linea LX é configuração básica do sedã: as rodas da foto, por exemplo, são opcionais
Na prática, público e crítica notaram que o sedã tinha qualidades, mas pertencia a um patamar inferior, o dos compactos premium -- e UOL Carros apontou esta discrepância de espaço interno (mais apertado que o dos rivais visados) e acabamento (com falhas individuais, embora o conjunto fosse bom) em duas oportunidades: durante o lançamento, há um ano e meio, e com a avaliação da versão com motor turbo (T-Jet), já em 2009.
Em sua linha 2010, lançada em maio do ano passado, o Linea passou por um choque de realidade: o preço geral foi reduzido e a Fiat passou a entregá-lo também numa versão mais barata, a LX, menos potente, menos equipada e mais... "pé no chão". Os compradores, no entanto, não se empolgaram: no primeiro trimestre deste ano, 3.063 unidades do Linea foram vendidas. Só para comparar, o Corolla (que tornou-se líder entre os médios no último ano) vendeu 12.731 unidades no mesmo período, o Civic emplacou 8.467, e o Vectra, 5.143. A conta segue ruim mesmo alinhando o modelo aos compactos premium: o líder é o Honda City, com 7.351 unidades, seguido de Volkswagen Polo, com 3.630.
DOIS LADOS DA VERSÃO
Motor da versão LX , com 127 cv, é mais fraco que o das outras versões aspiradas do Linea, com seus 132 cv (com etanol); ainda assim, mantém esmero com bela capa plástica...
... Ao passo que coifa do câmbio insistiu em se soltar, sobretudo no engate da ré.
Atrás do Linea, só modelos com algum "porém" na lista de especificações: o coreano Kia Cerato (2.727 unidades) não é flex; Citroën C4 Pallas (2.521 unidades), montado na argentina, é flex, mas já saiu do auge; e o também argentino Ford Focus (1.739 unidades) aderiu ao motor flex com muito atraso.
No configurador virtual da Fiat, o Linea LX com câmbio manual de cinco marchas e três anos de garantia custa R$ 57.450. O preço, válido para São Paulo (SP), inclui airbag frontal duplo, ar-condicionado, computador de bordo (com seis medições e duas contagens), direção assistida, CD Player com MP3 e faróis de neblina, mas troca rodas de liga leve por rodas de aço com calotas, o revestimento parcial de couro por tecido, e corta o ABS dos freios e alguns cavalos do motor 1.9 16V, que passa a ter 127 cv de potência máxima com gasolina/etanol no tanque (o que permite vendê-lo para deficientes físicos com isenção do IOF), contra 130/132 cv das outras versões aspiradas. O torque máximo do Linea LX segue o mesmo, com 18,6 kgfm.
IMPRESSÕES
UOL Carros testou a versão LX manual durante a última semana e voltou a sentir o misto de expectativa alta e tropeços inesperados que acabam justificando o desempenho de mercado apenas regular do Linea. A primeira surpresa foi o "excesso" de itens encontrados na unidade testada, recheada com todos os opcionais disponíveis: rodas de liga leve aro 15 (R$ 1.207), freios com ABS (R$ 767), couro para os bancos (R$ 2.070) e o sistema integrado de entretenimento, telefonia Bluetooth e navegação por GPS com reconhecimento de voz (o Blue&Me Nav custa R$ 2.249, mas inclui o volante multifuncional revestido de couro). Com eles, o modelo fica R$ 7 mil mais caro e vai a R$ 64.672, mas ganha em atratividade por ficar tão equipado quanto e bem mais em conta que a versão Absolute (R$ 69.030), a mais cara da linha aspirada.
A configuração, no entanto, nos parece irreal (do ponto de vista prático) por suscitar a pergunta: Quem compraria a versão mais barata de um carro para equipá-la com todos os opcionais? A resposta fica mais complicada para o Linea ao considerarmos que a configuração intermediária do rival Honda City, no caso a EX manual, é mais barata (R$ 64.200) e entrega piloto automático, controle digital para o ar, repetidores de seta nos retrovisores e rodas aro 16, ainda que não converse com o motorista.
Outra derrapada foi apontada pelo fotógrafo Murilo Góes, autor das fotos que ilustram este texto e do álbum que acompanha a avaliação: o Linea LX parece lento em acelerações e retomadas, mesmo quando comparado a outras versões do Linea. A explicação pode estar na alteração que derrubou alguns cavalos de potência desta versão, embora torque, relação de marchas e do diferencial tenham sido mantidas. O fato tem desdobramentos problemáticos: o motorista realiza trocas mais constantes de marchas, que sempre saem truncadas por causa da imprecisão dos engates, sobretudo para quarta e quinta marchas; e força o trabalho do motor em rotações mais elevadas, o que aumenta o nível de ruído percebido na cabine e o consumo de combustível.
Painel de mostradores do Linea teve leitura melhorada; no canto superior direito, destaque da tela do computador de bordo com Blue&Me Nav acionado: sistema interativo é um dos melhores do país e chega a conversar com o usuário, mas, como dissemos em 2009, GPS segue uma boa ideia que precisa ser aperfeiçoada
Após 403 quilômetros percorridos, anotamos um consumo de 4,5 km/l (com etanol), enquanto o computador de bordo apontou a média de 4,9 km/l. No restante do teste dinâmico, o Linea teve boa performance em frenagens e ausência de grandes oscilações no contorno de curvas em velocidades altas ou baixas, algo exemplar para sedãs.
O excesso de ruído interno, porém, apenas atesta a ambivalência também do quesito acabamento. Todo o revestimento parece ter melhorado, pelo menos aonde a vista alcança, em relação às unidades dirigidas (e criticadas) durante o lançamento. Alguns detalhes, aliás, demonstram esmero na apresentação até mesmo de partes escondidas, como a forração interna do porta-malas que se estende até a porta onde o nome Fiat aparece em alto-relevo, ou na bela capa do motor coberto que traz o nome Linea e o escudo da fabricante. Ainda assim, no carro testado, a coifa do câmbio insistia em se soltar do encaixe, sobretudo ao engatarmos a ré.
No final, fica clara a divisão de vendas do modelo, que separa o menor quinhão para a versão mais barata -- 25% para a versão LX (manual e Dualogic agrupadas), 40% para a HLX (também manual e automatizada juntas), 30% para a Absolute (só Dualogic) e 5% para a T-Jet. E também a reação desfavorável do mercado. Afinal, mesmo que o Linea saiba falar com seu público, parece que ainda sente falta de algo relevante para dizer.
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