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Mustang do Tik Tok é bom em tudo, mas sem a personalidade que o nome exige

O Mustang Mach-E é mais barato e rápido do que a versão do carro a combustão de mesmo nome disponível no Brasil - Mach 1, que está em processo de substituição pela GT Performance, que chega em breve com nova geração.

Totalmente elétrico, o SUV da Ford também só é oferecido no mercado nacional em sua configuração voltada à performance, igualmente chamada de GT. Custa R$ 486 mil e acelera de zero a 100 km/h em 3,8 segundos.

Já o Mustang Mach 1 sai por R$ 576 mil e vai de zero a 100 km/h em 4,2 segundos. Em breve, ele dará lugar à nova geração do carro, cujas primeiras unidades já desembarcaram no Porto de Vitória, no Espírito Santo. Preço e detalhes ainda não foram divulgados (mas a tabela deverá ser mais alta do que a do Mach 1) e a estreia está prevista para abril.

De volta ao Mach-E, temos um modelo que nasceu para ser a leitura do Mustang para os novos tempos. Tanto que traz desenho de grade, faróis e lanternas inspirados nos do icônico muscle car. Por falar nisso, ele também tem "músculos" - vincos pronunciados que garantem uma aparência atlética e fazem parte do DNA deste Ford.

Então temos um carro com ótimo desempenho, preço mais baixo, visual de linhas típicas do Mustang e algo mais: o Mach-E é bom de curvas. E olha só: historicamente, essa aptidão nunca foi o forte do Mustang original. Mas, na atual geração, esta do Mach 1, as coisas mudaram, e o modelo também passou a se destacar pela estabilidade.

Só que as semelhanças param aí: uma análise da essência dos dois carros mostra que, apesar do mesmo nome, eles têm apenas um parentesco distante. Isso porque o Mach-E, na verdade, é o anti-Mach 1 (e demais versões do cupê).

O produto elétrico vai contra tudo o que o Mustang representa. Ainda assim, surgiu como um instrumento para levar a herança do original para as novas gerações. Mas, diante dessa realidade, eu me pergunto: será que para o Enzo, Helena, Maria Eduarda, Olivia e Miguel - nomes comuns das crianças no Brasil atualmente - Mustang será o carro que está nas fotos desta página, e não o bom e velho queimador de gasolina?

Entendendo o Mach-E

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Imagem: Rafaela Borges/UOL
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O que um carro precisa ser hoje para vender bem não apenas no Brasil, mas no mundo todo? Em primeiro lugar, ser SUV.

Uma central multimídia decente não pode faltar também - nesse caso, não apenas para a turma do Enzo e do Tik Tok, mas até mesmo para minha geração, Millenial, de nascidos nas décadas de 80 e 90.

SUV com multimídia é o novo "ar, direção, vidro e trava". Ou seja: essencial. E, quanto mais caro o carro, maior é a exigência de coisas que antes não faziam diferença, como conectividade e entretenimento a bordo.

Pois o Mach-E traz uma multimídia com tela imensa e cheia de firulas. Android Auto, Apple CarPlay e câmeras 360 graus são alguns itens que ela traz, além de uma seção que permite ao usuário escrever e salvar notas, pintar, desenhar e até jogar.

Mustang é carro para quem gosta de dirigir? Para os fãs de Porsche, pode até não ser. Mas, para o norte-americano médio, é, sim. O Mach-E cumpre bem esse papel, mas com um toque que não pode faltar em um produto premium do mundo atual que está de olho nas gerações do futuro: sistemas semiautônomos de condução.

Afinal, muitos dos que idolatram os Tesla são atraídos pelo Autopilot, o piloto automático da marca californiana de carros elétricos. De fato, é com os produtos da Tesla com os quais o Mach-E concorre. Não com o Chevrolet Camaro.

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Ruptura

Mach-E traz sofisticada central multimídia
Mach-E traz sofisticada central multimídia Imagem: Rafaela Borges/UOL

Assim, o Mach-E é tudo o que um carro precisa para despertar idolatria nas novas gerações, como acontece com os modelos da Tesla

Mas, sendo como é, rompe com tudo o que o Mustang original representa desde a década de 1960, quando surgiu.

Em primeiro lugar, a eletrificação tira a essência do Mustang: o barulho o motor V8 5.0 a gasolina aspirado.

Os V8 estão cada vez mais raros. Os que ainda existem são, geralmente, turbo, e bem menores. Aspirado? Praticamente uma peça de museu. Imagine então um carro assim e que é, ao mesmo tempo, um cupê grandalhão, de duas portas.

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Com quatro lugares, é fato, mas sem espaço suficiente para quem viaja atrás ir com conforto. Além disso, o Mustang original é um carro baixo, coisa que o cliente tradicional de SUV - atualmente, a maioria - não gosta.

As dimensões e os músculos tornam o Mustang a combustão difícil de estacionar em algumas vagas. Ou seja: a praticidade passou longe dele, e esta é mesmo sua proposta.

A do Mach-E? Ser prático, espaçoso, fácil de usar e com bom porta-malas. Uma ruptura.

Representação do passado

Espaço traseiro e porta-malas reforçam aptidão prática do Mach-E
Espaço traseiro e porta-malas reforçam aptidão prática do Mach-E Imagem: Rafaela Borges/UOL

É claro que o Mustang evoluiu - muito mais do que o Camaro, aliás - para se adequar às demandas de cada tempo.

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Porém, até a chegada do Mach-E, essa evolução foi feita sem nunca romper com o passado e sua essência. Isso o transformou em carro de nicho, mas ninguém queria que fosse diferente. Nem a Ford, nem os fãs do cultuado modelo.

Só que agora a indústria está passando por aquela que talvez seja a maior mudança de sua história. A Ford, que nunca deixou o Mustang morrer - e conseguiu mantê-lo desejável ao longo das décadas -, sabe que desta vez o futuro é curto.

Não há planos de tirar o Mustang convencional de linha. A geração que chega ao Brasil agora é recente, de 2022. E há até espaço para desenvolvimento de inovações para o próprio motor V8. Afinal, ele é usado no veículo mais vendido do segundo maior mercado do mundo, os EUA: as picapes da Série F, que inclui a Ford F-150.

Mas, se o mundo vai mesmo ser dominado pelo carro elétrico, uma hora o bom e velho Mustang terá de sair de cena. Pode ser em dez anos. Ou 20, em uma perspectiva muito otimista. Mas vai acontecer.

A sobrevivência do nome está garantida. A do legado? Não! Por seis décadas, o Mustang vem sendo um carro peculiar, que investe no purismo dos automóveis do passado em adaptações a cada época. Evoluindo, mas jamais rompendo com a essência.

Por isso, o muscle car é um automóvel com muita personalidade. Só que o mundo está passando por uma grande ruptura com o conceito tradicional de carro. Assim, o Mach-E também rompe quase totalmente com o produto que homenageia.

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Quando o Mustang original deixar de existir, a turma do Tik Tok ficará com o Mach-E. Que é eficiente, bonito e rápido, mas é também só mais um carro como tantos outros elétricos da Tesla, BYD, etc.

Talvez um dia a Helena e o Enzo decidam visitar um museu de carros. Só assim eles saberão quem foi o Mustang de verdade. Um carro que marcou, com sua personalidade forte e única, a geração de meus avós, meus pais e a minha. Não apenas mais um na multidão.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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