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Lições da pandemia e como lidar com os sentimentos ruins que ela gerou

Do VivaBem, em São Paulo

13/10/2020 19h50

A Semana da Saúde Mental VivaBem começou hoje (13), com um painel que discutiu os impactos da pandemia nos transtornos mentais, como ansiedade, depressão, pânico e tristeza.

Os números não mentem. Os casos de depressão dispararam em 50% e os de ansiedade em 80%, nos meses de março e abril, segundo uma pesquisa do Instituto de Psicologia da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro).

A médica psiquiatra Carmita Abdo, que é doutora e livre-docente pela FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), disse que, segundo a ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), essa categoria de médicos passou a receber, em média, 60% a mais de consultas nesse período.

Para Abdo, a explicação para esse aumento está não só no confinamento, mas na insegurança econômica, no medo de adoecer, no luto em família e no acúmulo de tarefas em casa.

"As pessoas que mais sofrem são aquelas que já estavam em tratamento por alguma fragilidade, além das crianças, por falta de suporte escolar, e dos profissionais da saúde, que lidam com a doença no dia a dia e enfrentam o medo de contrair a doença e levar o vírus para casa", afirmou a psiquiatra.

Para lidar com todo esse medo gerado pelas incertezas, Lucas Veiga, psicólogo e mestre em psicologia clínica pela UFF (Universidade Federal Fluminense), disse que é importante tentar entender e falar sobre o que se está sentindo, como um exercício de autopercepção. "Isso ajuda a compreender o que se está passando internamente, para, a partir daí, buscar estratégias individuais para lidar com a situação."

Foi o que fez Bianca Rinaldi com as filhas gêmeas, Beatriz e Sophia, 11 anos. A atriz contou que buscou uma rotina mais rigorosa no início da pandemia, mas que acabou flexibilizando com o tempo, para aproveitar melhor o período com a família e tornar o dia a dia mais fácil.

Mudança para todos

Mas não foram apenas as crianças impactadas com as alterações na rotina. Enquanto alguns adultos precisaram se adaptar com o home office, e os pais, com as tarefas da escola, os idosos que moravam sozinhos se sentiram mais abandonados. "Não têm mais aquela rotina de ver a família, de estar em contato. Agora, são visitas curtas, à distância, e com ausência do contato físico e da presença das pessoas queridas", disse Abdo. A psiquiatra disse ainda que a dificuldade em usar a tecnologia é um agravante. "Mas um telefonema substitui uma visita."

Para Veiga, entretanto, toda essa mudança coletiva teve um lado positivo: fez muitos olharem para a realidade do outro de uma maneira mais aproximada. "As interações sociais se intensificaram porque sentimos uma sensação grande de vulnerabilidade".

Com pequenos gestos é possível minimizar os impactos, seja com uma ligação telefônica, como sugeriu a psiquiatra, seja com encontros online. "Vale também os pais aproveitarem a oportunidade para curtirem mais os momentos com seus filhos", disse ela.

Bianca Rinaldi, por exemplo, disse que criou momentos em família, como assistir a filmes aos finais de semana ou brincar com jogos de tabuleiro. Mas ela também contou com sessões de meditação para se acalmar.

Flexibilização, mais um desafio

Se o confinamento trouxe uma grande oportunidade de autoconhecimento, a flexibilização está colocando tudo isso à prova. Veiga disse que, antes de se tomar uma decisão por impulso e achar que está tudo liberado, é preciso que cada um avalie as possibilidades, condições e limites, sempre cuidando de si e das outras pessoas que estão em volta. "Chegou a hora de negociar e identificar o que precisamos sem perder aquilo que construímos até agora".

Segundo ele, desde junho tem se notado uma exaustão, cansaço, esgotamento do formato da vida dentro de casa, sem poder circular. Agora, é um momento de avaliação de necessidades. "Preciso mesmo correr na praia ou visitar tal pessoa? Isso me coloca e coloca outros em risco? Posso realizar isso sem aglomerar? É muito saudável que a gente possa gradativamente voltar a circular, ver uma pessoa ou outra, tomar sol, mas que a gente não perca nesse momento de saída a segurança que estávamos mantendo. É uma fase de redução de danos", disse.

Se esse processo de flexibilização deixar a pessoa ainda mais ansiosa ou deprimida, é o caso de buscar uma ajuda especializada. Aliás, na opinião do psicólogo, a popularização do autocuidado tem ganhado mais espaço durante a pandemia, reduzindo os estigmas pela procura por terapia.

As lições da pandemia

Confira o que cada convidado do debate tira como aprendizado desse momento:

- "Ficar mais em casa com a família me fez perceber que a necessidade de sair não é mais a mesma. Também passei a valorizar ainda mais o entretenimento e a cultura, tão escassos nesse momento." — Bianca Rinaldi

- "Precisamos estar unidos e compartilhar nossas emoções, não deixar para amanhã aquilo que precisa ser dito a alguém ou fazer algo que gosta. Devemos privilegiar as coisas que nos fazem bem para manter a saúde em dia." — Carmita Abdo

- "É hora de entender que o cuidado com a saúde mental deve ser algo contínuo e não pontual. E perceber o que te faz bem."— Lucas Veiga

:: SEMANA DA SAÚDE MENTAL VIVABEM ::

O objetivo da Semana da Saúde Mental VivaBem é apresentar caminhos para manter o equilíbrio da mente, principalmente neste momento de tantas mudanças que estamos enfrentando por causa da pandemia, além de combater estigmas e o preconceito (e seus impactos) que cercam transtornos mentais cada vez mais comuns na população, como ansiedade, depressão e estresse agudo.

Os painéis e entrevistas serão transmitidos pela home do UOL e pelos canais do UOL e do VivaBem no YouTube, Facebook e Twitter. Você pode interagir ao vivo e enviar perguntas por meio dessas plataformas. Além disso, pode acompanhar a íntegra dos painéis e os principais destaques de cada dia no VivaBem e em nossas redes sociais. Confira abaixo a programação completa do evento.

Quarta-feira (14), às 16h
Transtornos mentais: mitos e verdades e quando é hora de procurar ajuda
Mediação: Gabriela Ingrid, apresentadora do Sem Frescura, do VivaBem
Especialistas: Táki Cordás (psiquiatra) e Rossandro Klinjey (psicólogo)
Convidada: Priscila Fantin (atriz)

Quinta-feira (15), às 16h
Os jovens estão sofrendo mais com transtornos mentais? Como conversar sobre o assunto e ajudá-los?
Mediação: M.M Izidoro (produtor de cinema e colunista do UOL Ecoa)
Especialistas: Sandra Quero (psicóloga), José Paulo Fiks (psiquiatra) e Daniel Barros (psiquiatra)
Convidada: Mariana Goldfarb (modelo e apresentadora)

Sexta-feira (16), às 15h
Entrevista com o filósofo e historiador Leandro Karnal
Entrevistadora: Mariliz Pereira Jorge (jornalista)

Sexta-feira (16), às 16h
As perguntas que você tinha vergonha de fazer sobre saúde mental, respondidas por especialistas
Mediador: Jairo Bouer (psiquiatra)
Especialista: Cristian Dunker (psicanalista)
Convidada: Amanda Ramalho (jornalista e influenciadora digital)