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Ademara sobre encontro de influencers com Lula: 'Não foi viagem de férias'

De Universa, em São Paulo

24/02/2023 04h00

A atriz, comediante e influenciadora Ademara Barros ganhou seu primeiro papel de protagonista da carreira com a série "Sem Filtro", da Netflix. E já brilha: a produção, que estreou em 15 de fevereiro, está entre as produções mais vistas no país na plataforma de streaming.

A pernambucana, que começou a produzir vídeos de comédia para as redes sociais em 2020 e ganhou fama com os personagens "esquerdomacho" e "sudestina", empresta sua experiência como criadora de conteúdo à personagem Marcely, que resolve trancar a faculdade de economia para tentar a carreira de influenciadora.

Personagens da série 'Sem Filtro' - Natalia Odenbreit/Netflix - Natalia Odenbreit/Netflix
Personagens da série 'Sem Filtro'
Imagem: Natalia Odenbreit/Netflix

Na conversa com Universa, a atriz criticou quem tem o plano de fazer carreira nas redes sociais. "Muita gente acorda e quer ser influencer. Talvez seja esse o erro da intenção: a influência tem que ser a consequência", diz.

A atriz também falou do encontro de influenciadores com o presidente Lula (PT) no Palácio do Planalto no dia 8 de fevereiro, pelo qual foi criticada. Ela afirma não enxergar nenhum problema ético no encontro que, segundo a comediante, teve como objetivo discutir estratégias para combater a desinformação.

"Não era uma viagem de férias. Era uma reunião e nada garantia que você ia concordar com o que estava ouvindo ali."

Confira a entrevista.

UNIVERSA: Você diz que sua personagem, Marcely, não poderia ser mais diferente de você. Por quê?
Ademara:
A Marcely tem uma impulsividade que controlo melhor. Venho também de uma perspectiva financeira e social diferente da dela, o que não me faria pensar em trancar uma faculdade, por exemplo.

Terminei minha faculdade de jornalismo com 21 anos. Lembro que em vários momentos pensava em trancar para fazer só teatro. Mas não tinha certeza de que conseguiria me sustentar. Sabia que seria atriz, mas eu não tinha o tamanho de segurança que a Marcely em me jogar tão cedo assim.

Sua personagem larga a faculdade para se tornar influencer, um sonho que adolescentes têm cada vez mais cedo. O que você acha disso?
Essa narrativa de virar influenciador é muito parecida com a narrativa de jogador de futebol. Muita gente parou os estudos para se dedicar à bola. A Marcely se frustra tanto e coisas dão errado para ela porque a intenção dela é ser influenciadora e não ser criadora de conteúdo. Ela já está começando pelo final porque a influência é uma consequência de qualquer outra coisa que você faz.

Muita gente realmente hoje acorda e quer ser influencer. Às vezes, a intenção é só ser amado, venerado, chamado de ícone, é querer criar uma legião de fãs.

O que você trouxe da sua experiência como influenciadora para esta personagem?
Minhas vivências, sentimentos. Minha relação com a minha mãe, todos os desafios e a dificuldade de aceitação que tive em algum momento da minha vida, não só em relação a ser criador de conteúdo, mas em relação a várias escolhas da minha vida.

Você citou a sua mãe. O que sua carreira de influencer tem a ver com ela?
Vim de uma cidade em que a gente não tinha uma situação confortável [Igarassu, a 27km de Recife]. Decidi ser artista e sempre deixei isso muito evidente. Apesar de ser uma pessoa supercautelosa. Isso gera uma apreensão absurda em uma mãe. Como é que meu filho quer ser artista, se isso realmente não foi feito para a gente?

Você participou de um encontro de influenciadores com Lula (PT) no começo de fevereiro. Houve quem criticou esta reunião, comparando com o encontro do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) com influenciadores conservadores. Qual a diferença dessas situações?
A diferença crucial é que foi um encontro pela democracia, não foi pela persona do presidente. Não foi para falar sobre o Lula, não foi para defendê-lo, não foi para trabalhar em prol dele.

Foi uma reunião para falar sobre como a gente pode ajudar a fortalecer a informação, a apuração das informações e combater esse surto de desinformação que tá gerando outras consequências pro Brasil como um todo.

As viagens foram pagas pelo governo?
Não fomos bancados para estar ali. Quem foi, foi literalmente pelo interesse no coletivo: pagamos nossas passagens, nossa hospedagem. Eu mesma nem paguei a hospedagem, voltei no mesmo dia justamente para não gastar dinheiro com isso. E se alguém tivesse ganhado uma passagem para estar conversando com o Lula naquele momento, qual seria o problema disso? Quem quer ir para Brasília hoje em dia? Não era uma viagem de férias. Era literalmente uma reunião, e nada garantiria que você ia concordar com o que você estava ouvindo ali.

No governo Bolsonaro, influenciadores foram pagos para fazer campanha para o Ministério da Saúde. Você acredita que há algum limite na atuação de um influencer na política?
Acho que o limite é: você ser pago para concordar, para lutar por uma coisa na qual você simplesmente nem acredita. Depende do objetivo da campanha. No caso do encontro com Lula, nosso objetivo enquanto articulação era combater a desinformação

Entre as críticas sobre a série "Sem Filtro" surgiu o apelido de "Zorra Total da geração Z", em referência a um programa de comédia da Globo. A comparação te incomodou?
Tem coisas que li que me surpreenderam pelo simples fato de que talvez as pessoas realmente não estão acostumadas a ver um sotaque diferente na tela. A Marcely não é uma personagem caricata. As pessoas têm que parar e entender qual é o estranhamento que elas estão tendo antes de fazer tanta crítica.

Pode criticar também. Sei o que é ter hater. Estou bem tranquila, mas acho que é bom uma reflexão na cabeça das pessoas sobre o porquê dessa série gerar tanto estranhamento, que tipo de reprovação é essa.

Você, como atriz e comediante, acha que fazer humor é subestimado?
Definitivamente, inclusive porque o humor está muito banalizado. Quem trabalha com internet já entendeu qual é a fórmula que viraliza e a fórmula que vai manter o engajamento. É uma máquina de meme que, inclusive, está gerando uma repetição e um problema de direitos autorais surreal. O conteúdo audiovisual brasileiro ainda é muito subestimado no nosso país. Sinto que existe uma resistência de uma parcela do público simplesmente pelo conteúdo ser nacional.

O que você filtra e deixa de publicar nas redes?
Não é pouca coisa, não. Tem muito da minha vida pessoal que eu não gosto de compartilhar. Meus relacionamentos, por exemplo. O maior filtro é sobre a minha vida pessoal mesmo. Meu Instagram e o TikTok são plataformas de trabalho para mim, que desde o início a minha intenção era criar uma vitrine para as minhas habilidades enquanto atriz.