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'Bolsonaro valoriza mulher': o que pensam as 'tias do zap' em evento no RS

Apoiadoras de Bolsonaro no evento "Mulheres Pela Vida e Pela Família" - Acervo pessoal
Apoiadoras de Bolsonaro no evento "Mulheres Pela Vida e Pela Família" Imagem: Acervo pessoal

Franceli Stefani

Colaboração para Universa, de Novo Hamburgo (RS)

04/09/2022 19h13

"Nosso presidente é família, valoriza e respeita a mulher. As pessoas gostam de encontrar rótulos porque ele é autêntico." É com essa frase que a empresária Natalí Schimitz, 38 anos, que vive em Porto Alegre, justifica sua participação no evento "Mulheres Pela Vida e Pela Família", que aconteceu neste sábado (3), em Novo Hamburgo (RS), com a participação de Jair Bolsonaro, a primeira-dama, Michelle, a nora do presidente, Heloísa Bolsonaro, entre outras apoiadoras do candidato à reeleição.

Cerca de 4 mil mulheres chegaram já nas primeiras horas da manhã na parte externa do pavilhão da Fenac vindas de ônibus, lotação e trem, e logo formaram uma longa fila na expectativa de ver o "mito" de perto. Enquanto muitas empunhavam bandeiras do Brasil, cartazes ou faixas, havia quem comprasse produtos relacionados à campanha do candidato do PL, como camisetas estampadas com o rosto do capitão e tênis verde e amarelo.

Difícil era encontrar quem destoasse da dobradinha de cores que dominava as roupas das participantes: mantas, jaquetas, blusões e até enfeites de cabelo. Moradora de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, a dona de casa Edelma Matos da Silva, 62 anos, levava uma faixa amarrada na cabeça e estava ansiosa para o início do evento. "Estou aqui porque me apaixonei pelo nosso presidente, por ele ter Deus, família e pátria. Pelos bons costumes. Ou é Jair ou já era", enfatizou enquanto aguardava para entrar no pavilhão.

Adepta aos valores pregados pelo candidato à reeleição, Edelma enfatizou que Bolsonaro é rotulado por não gostar de mulher, o que é mentira. "Além de demonstrar apoio a ele, esse evento é importante para mostrar que o que falam não é verdade." Questionada por Universa sobre frases e atitudes misóginas que partem do presidente, ela garantiu: "Machismo, racismo, feminismo não existem. É tudo ideologia da esquerdalha. Tudo isso serviu para dividir o povo".

Na mesma linha, a empreendedora do ramo imobiliário, Valesca de Almeida, 43, moradora de Porto Alegre, diz que o machismo é invenção. "Vivemos em uma sociedade dominada durante anos. Temos nessa família a representatividade cristã, a essência daquilo de mais precioso que temos: o lar."

Apoiadoras de Bolsonaro no evento Muleres Pela Vida e pela Familia - Franceli Stefani - Franceli Stefani
"Michelle é a melhor primeira-dama que o Brasil já teve. Ela representa todas nós. É uma mulher de fé e nos passa a verdade" diz Leda Maria Bettineli
Imagem: Franceli Stefani

A corretora de imóveis, Leda Maria Bettineli, 65, moradora de Caxias do Sul, veio até Novo Hamburgo para bater uma foto com o presidente, embora exibisse uma faixa pedindo o registro do candidato do PL ao governo gaúcho. "Acho importante este tipo de evento para mulheres. A Michelle é a melhor primeira-dama que o Brasil já teve. Ela representa todas nós. É uma mulher de fé, coerente, tranquila e nos passa a verdade." Enquanto aguardava o início da programação, disse que não sofre com o machismo. "Até acho que existe, que outras mulheres sofrem, mas é só saber se colocar no seu lugar que não tem", acredita.

Passava das 11h quando começou a ser exibido, no palco, o vídeo da primeira-dama e começaram os burburinhos na plateia formada por mulheres majoritariamente brancas. A exibição é a mesma que aparece em uma inserção veiculada na TV, em que a mulher do presidente enaltece uma obra da transposição do Rio São Francisco —ela se dirige às nordestinas, justamente a região onde o candidato tem menor aceitação. "Acredito muito nesse governo. Sou profissional e durante a pandemia tive apoio do auxílio emergencial. Apesar de ele ser um presidente que é julgado como se não gostasse das mulheres, ele dá muito apoio, a exemplo dos títulos de terra", defende a pedagoga e massoterapeuta Eva Ramos, 60, que sustenta a reeleição do político.

No espaço destinado aos homens que foram junto com suas mulheres, localizado nos fundos do galpão, onde a programação era exibida por um telão, os comentários foram imediatos. "Ele fez esse evento só para as mulheres, para não ficarem dizendo que ele não gosta delas. Olha aí", ressaltou um dos acompanhantes. Outro, inclusive, pontuou que a prova de que ele gosta é que está no terceiro casamento.

Michelle Bolsonaro fala em evento para mulheres em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul - Franceli Stefani - Franceli Stefani
Michelle Bolsonaro fala em evento para mulheres em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul
Imagem: Franceli Stefani

Durante sua fala no evento, Jair Bolsonaro evitou entrar no assunto envolvendo o tema. Não conversou com a imprensa e manteve um discurso político. No palco, decorado também em tons verde e amarelo, posicionado em frente a um painel com a imagem da bandeira do brasil, disse que o relacionamento com Michelle é baseado no respeito e que tem a voz útil e a entrega na companheira. Mesmo com a rotina corrida, sempre encontra apoio. "Temos uma filha maravilhosa, fizemos em conjunto", citou.

As tias do zap

Uma faixa preta instalada no alto galpão chamou atenção: "As tias do zap". Assim são intituladas aquelas mulheres que passam boa parte do tempo defendendo o governo e o presidente nas redes sociais. Uma delas é a design de interiores Caroline de Sá, 41 anos. "Sempre que posso falo aos quatro ventos quem é esse homem maravilhoso, que defende a família, o seu país e que ama sua esposa. É isso que queremos, a união e a paz. Queremos que as pessoas valorizem a vida e a sua liberdade", pontua.

Quem também se denomina assim é Catarina Almeida, 36. "Falam que Bolsonaro tem robô, tem fake news, tem isso, tem aquilo, nós estamos aqui identificadas, vestindo as cores do nosso Brasil, para dizer que existimos e vamos defender os valores, a vida, sempre."

Mulheres envoltas a bandeiras do Brasil participam do evento com Michelle e Jair Bolsonaro - Franceli Stefani - Franceli Stefani
Plateia feminina do evento que teve a presença de Michelle e Jair Bolsonaro: gritos de "mito" e orações marcaram o apoio ao presidente
Imagem: Franceli Stefani

"Por que a mulher poderosa, potente, é masculinizada, bravona?

Conduzido por Denise Lorenzoni, presidente do PL Mulher (RS) e esposa do candidato a governador do Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni, e pela vice-candidata, Claudia Jardim; também passaram pelo palco Heloísa Bolsonaro, a ex-ministra Damares Alves, as bispas Lúcia Rodovalho, da Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra, e Dirce Carvalho, da Comunidade das Nações; além da cantora gospel Fernanda Brum. No centro do discurso, as mudanças feitas no país e os valores pregados pelo governo, "Deus, Pátria e família".

Embora a informação divulgada era a de que não se tratava de um evento religioso, as lideranças evangélicas eram a maioria. Logo no início da programação, Denise pediu que fosse feita uma oração, com olhos fechados e a mão junto ao peito. E assim foi. Muitas ergueram a mão em direção ao teto. Os depoimentos e conversas que foram ouvidos seguiram a mesma linha.

A primeira a se dirigir à plateia foi a bispa Dirce Carvalho, que afirmou ser preciso espalhar pelo país a ordem e o progresso. "Eu não vou fazer greve para meu marido, se estiver chateada. Vou levantar e vou preparar o café, não vou deixar louça na pia." Ela afirmou que é necessário adestrar o cérebro para o Brasil dar certo. "Não vamos fazer do país o melhor lugar do mundo para morar. Estamos aqui para apoiar homens e mulheres fortes, para implantar a ordem e o progresso."

Apoiadoras de Bolsonaro no evento Muleres Pela Vida e pela Familia - Franceli Stefani - Franceli Stefani
A dona de casa Edelma Matos da Silva, com cartaz na mão, junto a outras apoiadoras do presidente
Imagem: Franceli Stefani

Já a bispa Lúcia Rodovalho afirmou que Deus já criou a mulher empoderada. "Homem sozinho não consegue ter uma família, por mais que ele tente. Não é o plano de Deus." Mesma linha escolhida por Heloísa, esposa de Eduardo Bolsonaro, que, inclusive, criticou o uso do termo "empoderada". Conforme ela, a terminologia serve a um movimento e ideologia. Ela até disse que "tem medo dessas" e questiona: "Por que a mulher poderosa, potente é masculinizada, bravona? Será que a delicada e feminina não é poderosa, não tem valor?"

Um evento semelhante ao que ocorreu em Novo Hamburgo (RS) foi realizado em 7 de agosto em Belo Horizonte. Na ocasião, a primeira-dama afirmou que o Planalto era "consagrado a demônios" e, hoje, após a gestão de Bolsonaro, é "consagrado ao senhor". Não há confirmação de novos eventos do gênero, no entanto, Denise Lorenzoni informou que já há solicitação de que a programação vá para outros estados. Após o fim das falas, nenhuma das autoridades femininas conversou com a imprensa. Bolsonaro e Michelle saíram logo após o evento, rumo à Base Aérea de Canoas, onde embarcaram para Brasília.