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Mulheres virgens após os 20 falam de tabu: 'Parece que se não transa é ET'

tomazl/Getty Images
Imagem: tomazl/Getty Images

Danúbia de Holanda

Colaboração para Universa, de Lagoa do Carro (PE)

12/05/2022 04h00

A iniciação sexual das mulheres brasileiras acontece, em média, aos 17 anos, segundo a pesquisa "The Face of Global Sex 2007 - First Sex: An Opportunity of a Lifetime". Quem decide iniciar a vida sexual mais tarde do que isso muitas vezes sofre preconceito, reprovação e tem, até, sua maturidade contestada.

É o que dizem três mulheres ouvidas por Universa para esta reportagem. Elas têm entre 26 e 42 anos e, apesar da pressão social, contam que se sentem tranquilas pela escolha de ter uma iniciação sexual mais tardia do que a média das mulheres.

Se por um lado a virgindade é considerada por muitos um rito de passagem, especialistas chamam a atenção para fato de que, numa discussão mais moderna sobre sexualidade, esse conceito mudou.

"A virgindade é uma condição psicológica, pois o sexo vai além da penetração. Ele compreende desde o despertar do desejo sexual, da masturbação ao sexo oral, anal e até mesmo virtual", afirma a ginecologista e sexóloga Michelly Pascareta, da Maternidade Professor Barros Lima, em Recife.

Em se tratando de mulheres lésbicas, o assunto surge ainda mais repleto de preconceitos estruturais devido à ideia heteronormativa de que uma iniciação sexual se dá através do rompimento do hímen.

Para Pascareta, é importante deixar claro que a iniciação sexual não tem a ver necessariamente com penetração. "Não ser mais virgem significa ter tido alguma experiência sexual. Não é uma estrutura anatômica que define se uma pessoa é virgem ou não, principalmente o hímen, que pode não existir, romper parcialmente, não romper e pode também não sangrar."

Os especialistas ouvidos por Universa também destacam que para cada mulher, dependendo de sua vivência, esse conceito pode ser diferente e que o mais importante é saber respeitar o que cada uma estabelece como marco desse despertar sexual. Para algumas pode, sim, ter a ver com penetração. Para outras, mesmo isso pode não ser considerada uma experiência relevante, que simbolize a perda da virgindade.

Essencial é viver e falar disso sem tabus nem preconceitos.

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"É uma escolha pessoal"

"Nunca tive vergonha nem precisei mentir sobre minha virgindade. Minha virgindade é uma escolha pessoal, não é nada relacionado a família ou religião, por exemplo.

Transar está dentro dos meus planos, mas não sinto necessidade de me relacionar com qualquer pessoa apenas por prazeres momentâneos.

Idade e virgindade são coisas totalmente diferentes. Uma pessoa pode sentir-se bem começando sua vida sexual cedo, outras não.

A sociedade impõe regras que precisam serem quebradas. Ninguém é obrigado a nada, muito menos a "perder" algo que, ao meu ver, é tão importante. Precisamos estar preparadas e com a pessoa que acharmos certa para esse momento, pois é único."

Gabriela Pimentel, advogada 28 anos, de Lagoa do Carro (PE)

*

"Se você é virgem aos 40, é motivo para chacota"

"Quando era mais nova, sentia muita vergonha de dizer que era virgem. Hoje, em rodas de amigos comento com mais tranquilidade sobre o assunto. Eles não acreditam, alguns brincam, eu levo na boa e fica por isso mesmo. Não é desconfortável falar sobre sexo dependendo com quem eu esteja.

Sou bissexual e, apesar de ter tido relações sexuais, me considero virgem pelo fato de não ter havido penetração.
Já tive orgasmo nas relações com mulheres, mas continuo com o tal do hímen.

Já cheguei perto de transar com homem quando era mais jovem, mas acabei travando e desistindo. O parceiro super entendeu e até hoje somos amigos.

Transar está dentro dos meus planos sim. Acho que já me anulei demais. Mas a sociedade cobra mais de mim que eu mesma.

Se você é virgem aos 40 é motivo para chacota. Sei que um dia vou conhecer alguém bacana, vai chegar o momento e, se não chegar, tudo bem. Eu não me cobro por isso."

Janaína Santos, comerciante, 42 anos, de Recife

*

"Não deveria ser tão tabu e vergonhoso"

"Sinto que existe uma pressão hoje sobre isso com todo mundo, e as pessoas que não transam parecem ETs. Nunca gostei de fazer o que me falavam que deveria ser feito, eu não quero fazer agora porque tenho convicção da minha fé.
Sou cristã protestante e essa foi uma escolha pensada que envolve o que eu acredito. Então, não me sinto ansiosa sobre isso ou com algum peso.

Sempre tive convicção do porque estava fazendo essa escolha e nunca me envergonhei quando alguém conversava sobre o assunto comigo.

Não me sinto desconfortável quando alguém fala de sexo. Já namorei sério, não cheguei perto de transar, mas senti desejo. Meu parceiro respeitava minha decisão e nós dois nos controlávamos.

Acho que esse tema não deveria ser tão tabu e vergonhoso, pois ajudaria as pessoas que escolheram não fazer sexo por algum motivo a não ter vergonha de falar abertamente sobre suas escolhas. Transar é uma prática adiada, nunca descartei a ideia." Aline Antunes, jornalista, 26 anos, de Carpina (PE)

Desmistificando a 1ª vez

A cobrança social em torno da mulher adulta que se mantém virgem existe e pode resultar em problemas psicológicos. Iniciar uma vida sexual sem estar preparada emocionalmente para o momento pode acarretar, no mínimo, em alguma frustração.

"A gente não pode sair de um extremo e cair no outro. Sair de um momento em que a virgindade deixa de ser um tabu para cair em outro extremo de que toda mulher deve deixar de ser virgem numa determinada altura da vida", diz a sexóloga Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da USP.

Nesse sentido, a falta de educação sexual contribui para que erroneamente as pessoas vejam a virgindade na vida adulta como um problema. Uma mulher pode iniciar a vida sexual cedo, demorar em iniciar ou até mesmo não ter vida sexual. É uma questão de escolha dela e não traz nenhum risco à saúde.

"Não ter vida sexual não traz nenhum prejuízo à saúde do corpo. Agora ter relação sexual sem estar preparada ou não ser uma situação desejada pode trazer tanto problemas físicos como emocionais" afirma a ginecologista Michelly Pascareta, da Maternidade Professor Barros Lima, no Recife.

Outro fantasma cultural que assombra as mulheres de hoje são os relatos negativos acerca da primeira vez. A maioria das pessoas descrevem a primeira relação sexual como uma experiência negativa, e tanto descrever como aceitar essa teoria é reflexo da falta de educação sexual e conhecimento do próprio corpo.

De acordo com Carmita Abdo, a dor na primeira vez não é uma regra e acontece muitas vezes devido ao fato da mulher não estar confortável o suficiente para lubrificar. Com planejamento, tempo e dedicação é possível que uma mulher possa ter uma primeira vez positiva.

As especialistas afirmam que ter uma conversa franca com a parceria e se conhecer sexualmente, através da masturbação, são os pontos mais importantes.

"Antes de entregar o seu corpo a outra pessoa, entregue a você. Conheça as partes do seu corpo, as sensações, o que gosta e o que não gosta. Não delegar o prazer ao outro evita frustrações e faz com que o ciclo da resposta sexual feminina seja positivo", diz Aline Teixeira, professora da Universidade de Brasília.