Por que homem não geme no sexo? Vulnerabilidade e pornô explicam tabu

"Mano, por que homem não geme? A gente ta lá no maior esforço, sabe, rebolando pra c* e o cara não faz um 'hã'."

A reclamação, que viralizou no X (antigo Twitter), diz muito sobre o comportamento sexual dos homens cisgêneros heterossexuais — aqueles que foram identificados como homens ao nascer — que transam com pessoas que se identificam como mulheres.

Para quem estuda a sexualidade humana, a questão toca em pontos sensíveis: entre mostrar vulnerabilidade e a exigência de fazer sexo performático, os homens se calam.

A influência da pornografia, que reforça papéis de gênero pré-estabelecidos, deixa para as mulheres a tarefa de expressar o prazer com caras, bocas e voz.

Ou seja, aquela "carinha de quem tá gostando demais" (como diz a letra de um pagode do grupo Molejo da década de 1990) ainda é coisa de mulher. Mas de onde vem essa cultura?

Apesar de o ato de "abafar os gemidos" ser a deixa para quando o casal quer uma rapidinha, mulheres descrevem que, mesmo com tesão, seus parceiros mantêm os olhos fechados — como se estivessem dormindo, ou não emitem nenhum som, ainda que atinjam o orgasmo.

Afinal, gemer é um tabu?

A postura durante o sexo depende do "estilo" de cada um na cama. Mas, o fato de o homem não gemer pode ter a ver, entre outros fatores, com uma grande pressão da sociedade com relação à demonstração de sentimentos.

Segurar o gemido é uma questão cultural masculina, que tem a ver com poder e com a dificuldade de mostrar vulnerabilidade.

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Ou seja, gemer é uma forma de mostrar prazer e, em uma relação sexual destinada ao prazer do homem, o fato de ele mostrar que está gostando do que ela está fazendo pode ter a ver com a perda de poder.

Isso passa pela vulnerabilidade de não querer se mostrar fraco.

Além do mais, gemer pode ser visto como 'algo feminino' e, nesse sentido, o homem entende que vai perder potência, perder masculinidade.

A mesma lógica se aplica ao mito de que 'homem não nega fogo', por exemplo.

A pressão por exercer a masculinidade na hora do sexo pode ainda refletir em ansiedade de desempenho e na vontade de proporcionar uma experiência performática demais para a parceira, que fica "distante do sentir".

Ele se esquece de verbalizar o que está sentindo, porque está mais preocupado em fazer a parceira obrigatoriamente gozar, o que constitui uma ditadura do orgasmo.

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Gays e a cultura do machismo

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Imagem: DmitryTkachev/iStock

A mesma lógica do "homem mudo" pode ser reproduzida em relações homossexuais, dependendo do grau com que a cultura do machismo está impregnada em cada indivíduo.

Ao se determinar quem é ativo ou passivo, por exemplo, pode-se reproduzir a ideia de que alguém ali vai ser "uma mulher", estabelecendo-se uma lógica heteronormativa. Com isso, o passivo poderia gemer, e o ativo, não.

Pornografia x espontaneidade

A pornografia, além de estimular comportamentos sexistas nos homens, também entra nessa conta.

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O pornô dá ao homem a falsa ideia de potência, de intensidade, mas ninguém lembra que aquilo é editado. Além disso, o que aparece lá é que o papel dele não é gemer, é fazer a mulher gemer.

Só que sexo, na vida real, tem a ver com espontaneidade.

Fazer barulho, contrair o corpo, mostrar que está gostando é sempre mais interessante, porque a espontaneidade caminha ao lado da criatividade, e ambas são fatores estimulantes.

O homem ainda deve estar atento às possibilidades do prazer do corpo, com regiões de prazer não habituais.

Gemer pega bem

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Imagem: AleksandarNakic/iStock
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Se para as mulheres que levaram o tema ao X, "pega bem gemer", essa é uma postura que ainda precisa ser negociada entre os casais, como muita coisa no sexo.

É preciso conversar sobre sexualidade fora da cama, do mesmo jeito que se faz com amigos em uma mesa de bar. Há homens e mulheres cis que têm dificuldade de falar que está gostando, por isso o caminho para o desbloqueio é gradual.

Mesmo no sexo casual, é fundamental estabelecer a "liberdade de se expressar". E, se passar do casual, você já construiu uma relação com liberdade, que pode render outros encontros mais gostosos ou um relacionamento, sem fingir que gostou de algo.

Fontes: Saulo Ciasca, psicoterapeuta especialista em sexualidade humana, identidade de gênero e orientação sexual; e Thais Plaza, terapeuta sexual, com matéria publicada em 06/08/2019

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