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Ser 'grandinho' não é motivo: o que mães levam em conta ao fazer o desmame?

Thays amamentou a filha Lavínia até os 4 anos - Acervo pessoal
Thays amamentou a filha Lavínia até os 4 anos Imagem: Acervo pessoal

Ana Bardella

De Universa

10/12/2021 04h00

Quando pensamos em amamentação, normalmente nos vem à mente a imagem de um recém-nascido no colo da mãe. Já quando se trata de uma criança de tamanho maior no peito, as reações ainda são de estranhamento e, em muitos casos, de julgamento.

De fato, o aleitamento materno nos primeiros seis meses de vida é de extrema importância — e, caso não possa acontecer, deve ser substituído por fórmulas, com o acompanhamento de um pediatra.

Conforme o desenvolvimento avança, tem início a introdução alimentar. A orientação da Organização Mundial de Saúde é de que, após completar seis meses, o bebê passe a ter um contato gradual com outros tipos de alimento, como frutas e legumes, o que faz com que a demanda pelo leite materno naturalmente diminua.

Mas, quanto maior a criança fica, mais o ato de mamar é visto como socialmente inadequado, como se o fator principal para encerrar o processo do aleitamento materno fosse o tamanho ou a idade da criança em questão.

O que diz a ciência?

A Universa, Daniela Anderson, especialista em neonatologia e doutora em saúde da criança e do adolescente, explica que não existem regras para o desmame. "A única recomendação da Sociedade Brasileira de Pediatria é de que a criança continue sendo amamentada até completar dois anos. Na prática, isso varia de acordo com a disponibilidade de cada mãe", adianta. Após esse período, não existe mais a necessidade nutricional do leite materno, mas o vínculo pode ajudar no desenvolvimento cognitivo e emocional.

Por isso não existe idade máxima para interromper o processo. "Se os pais optarem for fazer o desmame de maneira espontânea e amorosa, o principal caminho é o de escuta. Nesses casos, a amamentação é interrompida quando a criança não demonstra o mesmo interesse de antes e para de solicitar o leite", diz.

Ou seja, além do tamanho ou da idade, diversos outros fatores podem — e devem — ser levados em conta ao realizar o desmame.

"Aos 4 anos, o desmame aconteceu naturalmente, do jeito que eu queria"

Thays Nascimento, de 34 anos, mora em São Paulo, trabalha como analista de seguros e é mãe de Lavínia, de 4 anos e meio. Ela conta que, no início da amamentação, encontrou dificuldades. "Eu produzia muito leite e ela não mamava o suficiente. Por causa disso, tive mastite [inflamação da mama] em um dos seios e precisei fazer um tratamento com antibiótico. Depois disso, comecei a retirar o excesso e doar para um banco de leite materno, um hábito que mantive por dois anos", conta.

Por um desejo seu, o desmame da filha aconteceu de forma natural. "Mesmo nas fases em que estava mais cansada ou estressada, eu não negava o peito. Aos poucos, ela passou a mamar em quantidades menores e foi pedindo cada vez menos", relembra. A fase final veio com o divórcio. "No início, foi como se ela regredisse e pedisse para mamar mais quando estava comigo. Depois, com os dias ao lado do pai, acabou desapegando do peito naturalmente. Nada foi forçado", explica.

A decisão de permanecer amamentando até o quarto ano de vida da filha trouxe como consequência comentários indesejados. "Cheguei a ouvir que ela estaria 'com 18 anos e mamando', que leite é para recém-nascido, que ela estava usando meu peito como chupeta e mais uma série de absurdos", relata. Em um determinado momento, começou a se irritar mais com esses comentários e responder à altura. "Eu logo questionava se o peito era da pessoa. Já que era meu, a escolha só cabia a mim", diz.

Agora que o processo encerrou, acredita ter feito a melhor a escolha. "O tempo da criança é diferente daquele dos adultos e da sociedade. Respeitei seu processo natural e foi muito tranquilo", avalia.

"Substituímos o leite por outras formas de afeto"

Cintia amamentou Amanda até 2 anos  - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Cintia amamentou Amanda até 2 anos
Imagem: Acervo pessoal

Cintia Manoel tem 37 anos, mora em Adamantina (SP), trabalha como funcionária pública e é mãe de Amanda, de 12 anos, e de Alice, de 2. Ela relembra que, na primeira gestação, tinha a ilusão de que a amamentação seria um processo intuitivo e por isso cometeu erros. "Tive bastante dificuldade, fissura e dor, mas achava que era aquilo mesmo. Da segunda vez, estudei sobre o assunto e descobri sobre a pega, a posição da língua e tratamentos com laser que ajudam na cicatrização, caso haja algum problema", diz.

Por causa disso, amamentou a segunda filha até que ela completasse dois anos — seis meses a mais do que a primeira. "Escutei de algumas pessoas que ela já estava grande para o peito, mas nunca levei em consideração. Sempre soube que iria continuar até o momento em que fosse bom para ambas", conta.

Então, conforme Alice foi crescendo, naturalmente diminuiu as mamadas. "Se tornou um ato de afeto: quando ela vivia alguma situação de frustração, pedia e eu não negava. Aos poucos, no entanto, fomos substituindo essa forma de carinho por outras: ficamos juntas, abraçadas, eu canto uma música ou coloco ela para ninar. Com isso, ela parou de pedir pelo peito, sem trauma, nem despedida. De uma forma bastante natural", avalia.

"Quando cheguei ao meu limite, pedi que ela desse tchau para o tetê"

Karine teve dificuldade no início da amamentação - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Karine teve dificuldade no início da amamentação
Imagem: Acervo pessoal

Karine Araújo tem 30 anos, é psicóloga e mãe de Helena, de 1 ano e 10 meses. Antes mesmo do nascimento da filha, já estava familiarizada com o universo da maternidade: por atuar também como doula pós-parto, sabia muito sobre as questões físicas e emocionais do puerpério, incluindo as possíveis dificuldades da amamentação.

"Porém, depois que ela nasceu, foi como se eu esquecesse tudo que já sabia", diz. Nos primeiros dias, no hospital, se saiu bem com o auxílio dos enfermeiros e médicos. Mas, ao chegar em casa, o choro da filha a deixou tensa e começou a amamentar de forma errada, mesmo sentindo dor. "Com isso, meus seios inflamaram em questão de horas. Sem saber como faria, tive minha primeira crise de ansiedade", conta.

O quadro foi revertido com o auxílio de uma consultora de amamentação. Ainda assim, o processo foi difícil. "Eu colocava pequenas metas, como chegar aos três meses, depois aos cinco meses e assim por diante", relembra. O que mais a deixava cansada eram as mamadas noturnas, que impediam o sono. Ainda assim, conseguiu manter a rotina por 1 ano e 4 meses. "Mas sentia falta do meu corpo, das minhas roupas e de revezar as manhãs acordada com meu marido", conta.

Até que foi a uma festa de casamento e acabou com os seios doloridos por não amamentar por dois dias. "Quando voltei, ela pediu para mamar e eu avisei que estava dodói. Pedi que ela desse um beijinho e então desse tchau para o tetê porque a partir daquele momento usaria a mamadeira", conta. Assim, encerrou o processo. "Achei que iria demorar mais, mas entendo que durou o quanto foi possível e o quanto foi importante para o seu desenvolvimento", conclui.