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"Mulher também pode ser cafajeste", diz cantora do hit "Não, não vou"

Aos 20 anos, Mari Fernandez domina o topo das paradas musicais no Brasil - Divulgação
Aos 20 anos, Mari Fernandez domina o topo das paradas musicais no Brasil Imagem: Divulgação

Júlia Flores

De Universa

08/07/2021 04h00

"Cadê o amor que você me trocou e falou que era melhor que o meu? Tô vendo que mal começou, que a cara quebrou, já se arrependeu". A letra da música "Não, não vou", sucesso de Mari Fernandez que ocupa o primeiro lugar entre as mais tocadas do Spotify Brasil nessa semana, pode parecer falar de uma mulher com baixa autoestima - afinal, a pessoa está aceitando que o ex de quem levou um fora passe na sua casa, tira sua roupa e... quebre sua cama, de novo! - mas sua intérprete garante que não é nada disso. A cearense de 20 anos afirma que é feminista e que seu hit pode ser interpretado por outro viés: "'Não, não vou' é unissex", afirma Mari em entrevista Universa. "Quem disse que quem está cantando é uma mulher?"

Comparada à Marília Mendonça, que também dominou o país ainda jovem cantando músicas sobre desilusões amorosas, Mari é o novo nome da "sofrência" nacional. Autodidata, ela aprendeu a tocar violão observando o padrasto enquanto crescia em Alto Santo, no interior do Ceará. Aos 15 anos, começou a compor suas primeiras canções. Aos 18, se mudou para Fortaleza para investir na carreira de compositora. Seu primeiro álbum "Piseiro Sofrência" foi lançando no final de abril. Em um mês e meio de carreira (sim, você leu direito) Mari já alcançou a impressionante marca de 19 milhões de reproduções no Spotify.

Além de cantar, é Mari quem compõe as próprias letras e cria as coreografias do TikTok - os vídeos com a dancinha da sua música na rede social viralizaram e são um dos grandes motivos do seu sucesso. Apesar de escrever sobre amor, seu foco no momento é 100% a vida profissional. "Não tenho tempo e nem tenho interesse em namorar sério. No momento, é só beijinho quando for lá em casa e tchau", diz. Leia a entrevista com a cantora do momento a seguir:

UNIVERSA Em pouco tempo você dominou as paradas musicais do Brasil. Antes disso, o que você fazia?
MARI FERNANDEZ Eu cresci no interior do Ceará. Me mudei para Fortaleza aos 18 anos. Decidi que queria escrever letras autorais, então antes de conhecer o meu empresário, eu só trabalhava como compositora. Nesse ano me aventurei como cantora e gravei o álbum "Piseiro sofrência". E logo a fama chegou, graças ao sucesso que a música "Não, não vou" fez no TikTok. Minha carreira é curta, tem só 1 mês e meio, mas eu tenho trabalhado muito.

Mari Fernandez compõe todas suas músicas e está sendo comparada a Marília Mendonça - Divulgação - Divulgação
Mari Fernandez compõe todas suas músicas e está sendo comparada a Marília Mendonça
Imagem: Divulgação

O interior do Brasil ainda é marcado pelo sexismo. Você teve que enfrentar comentários machistas para chegar onde chegou?
Como disse, minha carreira estourou muito rápido, não tive dificuldades. Nunca fui criticada por "ser mulher" - é claro que já recebi várias críticas, principalmente quanto a questões técnicas.

Sempre fiz de tudo para que as pessoas respeitassem o meu comportamento, a minha maneira de falar, meu jeito de me posicionar. Em um ambiente novo, eu chego e falo: 'Sou a Mariana, sou compositora, sou cantora e meu trabalho é assim'.

No final do ano passado, Universa fez uma matéria sobre "Mulheres na pisadinha" e as entrevistadas comentaram várias situações de machismo que enfrentaram no meio musical. Para você, então, foi diferente?
Eu acho, sim, que existe machismo no Brasil inteiro - e não só na música -- mas comigo nunca aconteceu. Acho que se eu vivenciasse uma situação sexista, iria saber. Ninguém jamais pode criticar uma mulher, ou impor regras a ela, por causa de seu gênero.

Tenho opinião muito forte. Se eu acredito em algo, vou lá e falo - nem que depois eu precise pedir desculpas. Mas, ao mesmo tempo, gosto de ouvir conselhos. Ainda sou uma menina, né? Tenho 20 anos

Você se considera feminista?
Sim, sou feminista, porém não sou militante. Espero levar mais mulheres ao piseiro porque ainda é um ritmo dominado por homens, sei que tem muita gente capaz.

Hoje eu só sou - e estou me tornando - quem eu sou, porque eu nunca desisti. Recebi vários "nãos", mas não gosto de pensar que foi pelo fato de ser mulher. Acho que tem espaço e mercado para o piseiro feminino: as artistas precisam botar a cara a tapa aqui no Nordeste, tirar fotos legais, cavar projetos únicos, caprichar na make e arrasar; tem que ir pra cima.

O piseiro está dominando o Brasil e fico orgulhosa de ser a primeira mulher no estilo, mas pra mim, quanto mais cantoras, melhor. As pessoas precisam se acostumar a escutar o piseiro feminino.

Você está sendo chamada de "nova Marília Mendonça". Você já disse que é muito fã dela, mas além da sertaneja, quem a inspira musicalmente?
Sem dúvidas, Alceu Valença e Marília Mendonça são minhas grandes inspirações. Deixo bem claro para o meu público que me inspiro na Marília. Ela começou compondo como eu e logo ganhou espaço como cantora. A gente também se parece na idade, no estilo de cantar. Fico honrada de ser comparada a ela.

Mari Fernandez já dividiu o microfone com Solange Almeida e Vitor Fernandes - Divulgação  - Divulgação
Mari Fernandez já dividiu o microfone com Solange Almeida e Vitor Fernandez
Imagem: Divulgação

Você enfrenta críticas sobre seu corpo ou sobre a sua aparência?
Não, nunca fui cobrada por isso. Eu decidi emagrecer logo que comecei a fazer sucesso. Não por ter recebido críticas, até porque eu não me importo, mas porque quando eu subir em um palco, quero dar o melhor de mim, ter uma performance excelente. Perdi 10 quilos em um mês com a ajuda de profissionais da área e ainda quero perder mais 7.

Suas músicas impressionam pela "sofrência" das letras. De onde vem tanta dor?
(Risos) Compor é uma profissão. Em algumas letras eu expresso meu sentimento, mas nem sempre. Eu paro para estudar o sentimento dos outros, ou escrevo sobre algo que vi. Recentemente lancei uma música com o Vitor Fernandes que diz : "E agora minha agonia é esperar ela errar pra você me amar". Logo já acharam que eu era amante de alguém, mas eu não sou. Essa é uma situação alheia, eu só presto atenção no que os outros estão passando. Meu bordão, inclusive, é "para lascar o coração". O termo lascar é nordestino, como se fosse "para machucar o coração".

Tem uma música que falo: 'Eu não preciso de homem cafajeste'. E a gente sabe que a mulher não precisa de homem para nada e, se ela quiser, ela também pode ser cafajeste. Não precisa sofrer por ninguém, é capaz de ir em qualquer esquina e conhecer outra pessoa

A letra de "Não, não vou" é sobre uma mulher com autoestima baixa, que aceita o homem de volta mesmo depois de ter sido trocada. E a canção "Amizade colorida" fala de talaricagem. Como você se sente escrevendo canções assim?
Eu acho que a música precisa mostrar a realidade, o que as pessoas sentem. Ser amante e talarica não é legal, mas pessoas assim existem. Já quanto à letra de "Não, não vou", ninguém disse que a personagem da canção é uma mulher. A letra é unissex, poderia ser a história de um homem.

Além disso, se "Não, não vou" for sobre uma mulher, mostra que ela é empoderada, que pode fazer o que quiser, ficar com quem ela quer, não ter algo fixo.

A Jojo Toddynho gravou um vídeo dizendo que não concorda com a letra, que a mulher não pode se rebaixar tanto, eu curti o ponto de vista dela, mas não é sobre isso.

Você já sofreu muito nos seus relacionamentos?
Sim, a cantora sofre, mas é por causa dela mesmo, que tem o dedo podre em relação a homem. (risos) Eu já namorei, tive um relacionamento de dois anos, foi um relacionamento tranquilo, sem abusos.

Recentemente as pessoas passaram a usar a letra de "Não, não vou" para dar em cima de mim. Dizem: "Vou passar na sua casa, tirar a sua roupa"... eu acho até engraçado, levo na brincadeira.

Com tanto show, parceria, live, entrevista, você tem tempo para um namoro agora?
Não tenho tempo e nem tenho interesse em namorar sério. Estou muito focada na minha carreira. Além do mais, sou aquariana -- meu signo é muito desapegado. Não tenho paciência pra ficar me relacionando. No momento, é só beijinho quando for lá em casa e tchau.