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"Quando a vi pensei: é ela!": mãe fala da adoção de menina com microcefalia

A policial militar Taís Maraba, 33, de Maceió (AL), com a filha, Heloísa Angélica, 2 - Divulgação/Arquivo pessoal
A policial militar Taís Maraba, 33, de Maceió (AL), com a filha, Heloísa Angélica, 2 Imagem: Divulgação/Arquivo pessoal

Taís Maraba, em depoimento a Carlos Madeiro

Colaboração para Universa, em Maceió

28/05/2021 04h00

"Tenho 33 anos, sou 1° tenente da Polícia Militar de Alagoas e mãe de Heloísa Angélica, uma linda menina de dois anos de idade. A minha história se entrelaça com a dela por meio da adoção, ocorrida há um ano.

A vontade de ser mãe me acompanha desde a adolescência. Ainda tenho recordações daquela época, quando já projetava a maternidade. Mas foi só na fase adulta que comecei a me aproximar de pessoas — com leituras e conhecendo grupos — que faziam referência aos processos de adoção legal no Brasil. Foi quando eu tomei conhecimento que toda e qualquer pessoa , independente de sexualidade, gênero ou mesmo de estado civil, pode se inscrever no cadastro de adoção.

Passei três anos me aprofundando nos processos, tendo um amadurecimento espiritual e psicológico. Quando me senti pronta, procurei a Vara da Infância de Maceió e me inscrevi no SNA (Sistema Nacional de Adoção).

Penso que toda e qualquer pessoa que dá início a um processo de adoção tem como objetivo maior exercer a maternidade ou a paternidade. O que não faz muito sentido é alguém ser extremamente rigoroso no perfil de busca. O pai e a mãe amam o filho como esse filho é! Não tem lógica a gente eleger uma série de atributos, dizer: 'Ah, eu só posso amar se for dessa cor, se for desse gênero, se for dessa maneira.'

Como muitos pretendentes fazem esse checklist muito rígido, dificulta o encontro com as pessoas reais, que vivem nos abrigos. Ao passo que existem muitas crianças e adolescentes que passam anos na fila de adoção. Elas acabam entrando na maioridade e precisam abandonar as instituições de acolhimento, sem uma família, porque o perfil dos pretendentes é muito rigoroso.

A gente precisa ter uma flexibilização nesses critérios. Precisamos conversar sobre a adoção necessária, a adoção tardia, a adoção especial. São categorias que contemplam as crianças e adolescentes que não estão dentro daquele critério tão rigoroso e tão rígido elencado por tantos pretendentes à adoção.

A adoção precisa ser vista como uma mera maneira de se constituir uma família. É só um mecanismo, não tem que haver diferenciação.

Família a gente ama, acolhe, se esforça para suprir as necessidades, principalmente quando tem uma criancinha assim, como a Heloísa, que tem tantas dificuldades físicas e psíquicas.

"Fui a primeira pessoa a demonstrar interesse por ela"

A primeira vez que eu vi a Heloísa foi através de um vídeo no YouTube, no canal do TJ (Tribunal de Justiça) do Espírito Santo, em um projeto de busca ativa, que é quando os tribunais disponibilizam vídeos de crianças ou adolescentes fora do perfil mais apontado pelos pretendentes. Geralmente, são crianças com deficiência ou grupos de irmãos, ou até mesmo adolescentes em idade avançada, que tem suas chances bastante reduzidas de adoção.

Nesse vídeo, os pretendentes no SNA podem demonstrar interesse pela criança sem ter que necessariamente seguir a ordem cronológica de inscrição no sistema. Para busca ativa, a ordem que conta é a de demonstração de interesse àquela criança.

Quando eu vi o vídeo da Heloísa, disse: é ela! Inclusive eu tinha entrado havia pouco tempo no cadastro. Fui a primeira pessoa a demonstrar interesse por ela, e já foi dado início à aproximação on-line. Na época já estávamos na pandemia, e todo o procedimento de aproximação para eu ter o diagnóstico, a realidade médica dela ocorreu à medida que a aproximação acontecia.

Heloísa Angélica e Taís - Divulgação/Arquivo pessoal - Divulgação/Arquivo pessoal
Heloísa Angélica com a mãe
Imagem: Divulgação/Arquivo pessoal

Heloísa tem microcefalia, paralisia cerebral, epilepsia e faz uso de sonda gástrica. A rotina da Heloísa é bastante agitada: ela tem terapias quase todos os dias; faz acompanhamento com fisioterapia, terapeuta ocupacional, com fonoaudiologia, fisioterapia visual, neuropediatra, pediatra, nutricionista e gastropediatra também.

A equipe que cuida dela, que nos ajuda a cuidar dela, é bastante ampla. Hoje ela é atendida pela Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) aqui em Maceió em duas sedes: em uma trata as atividades físicas, e na outra trata sobre a deficiência visual dela (Heloísa tem perda visão severa também). E em paralelo, temos uma ONG aqui chamada Família de Anjos, onde ela tem o reforço do acompanhamento de fisioterapeuta, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo.

Devido ao meu trabalho, nem todos os dias tenho disponibilidade para levar Heloísa às terapias. Então eu conto com a minha mãe, que é superparceira nessa missão, é parte do alicerce fundamental da rede de apoio. Não só ela: têm os demais membros da minha família. Até Instagram dela criamos. (@heloisa_angelica19).

Todo mundo acaba assessorando com Heloísa, tanto na assistência médica e terapêutica dela, quanto nas relações familiares convencionais.

Aos leitores da nossa história, deixo uma reflexão: que a gente busque naturalizar a adoção e tornar o nosso olhar mais amoroso em relação a diversidades. E, assim, que a gente alcance essas pessoas que estão nos abrigos à espera de uma família."

* Taís Maraba, 33, de Maceió (AL), é 1° tenente da Polícia Militar de Alagoas e mãe de Heloísa Angélica, de dois anos