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Escola denuncia mãe ao MP por "mau desempenho no ensino remoto" do filho

Cristina Machado foi denunciada pela escola do filho por ser a responsável pelo mau desempenho dele - Reprodução/Instagram @plantao_materno
Cristina Machado foi denunciada pela escola do filho por ser a responsável pelo mau desempenho dele Imagem: Reprodução/Instagram @plantao_materno

Luiza Souto

De Universa

20/03/2021 10h31

Mãe solo de adolescente de 12 anos e uma criança de 7, a consultora de amamentação Cristina Machado, 43, viu o filho mais velho, como muitos pais e cuidadores durante a pandemia, apresentar dificuldades em acompanhar as aulas online. Para tentar contornar a situação pediu ao colégio um plano pedagógico transitório para conseguir organizar a vida com todos em casa devido à pandemia. Mas ela não apenas não recebeu o documento como acabou sendo intimada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul e pela 2ª Microrregião do Conselho Tutelar de Porto Alegre por ser a responsável pelo mau desempenho do filho.

Segundo sua advogada, Rita Braun, a escola encaminhou um relato da situação escolar do adolescente, como baixa frequência às aulas online e baixo rendimento nas tarefas, alegando que a mãe é difícil e pouco disposta ao diálogo. Ela, que é dona do perfil @plantao_materno, publicou um desabafo em sua página no mês passado. O caso aconteceu no ano passado e ela agora espera parecer do MPRS.

Em entrevista para Universa, Cristina conta que a relação com a escola ficou estremecida quando ela e um grupo de pais de alunos começaram a pedir, ainda no ano passado, desconto na mensalidade escolar, já que não haveria mais aula presencial. O pedido, segundo ela, foi aceito após muita insistência.

Em seguida, solicitou à escola plano pedagógico para este ano de 2021, já que as turmas permaneceriam tendo aulas remotamente. Como não recebeu, pediu ajuda para uma amiga, especialista em defesa do consumidor, que elaborou um plano e enviou, ela mesma, para o colégio dos filhos. A instituição ao receber a proposta, solicitou reuniões online sempre em horários que Cris não poderia, e ela insistiu que a troca fosse feita por e-mail, ou por aplicativo que pudesse gravar a conversa, para ter como registro.

"Eles propuseram horários tipo 19h. Tenho dois filhos e fico online o dia inteiro, então a hora que fecho o computador, quero que eles fechem também. A partir daí a escola começou a falar da conduta do meu filho", descreve Cristina.

A mãe afirma que com o impasse, a direção ameaçou repetidas vezes de reprovar seu filho, uma vez que ele não estava comparecendo nem entregando os trabalhos. Ela admite que o garoto realmente apresentou dificuldades de ensino mas enxerga que houve pouco acolhimento para resolver a questão.

"Meu problema não é com os professores. Eu sou professora, e sei que eles também estão sofrendo. O problema é com a conduta da direção da escola", afirma. Cristina prefere não citar o nome do colégio, para evitar exposição dos filhos.

Consultora de amamentação, Cristina trabalha diretamente com mães e conta que recebe relatos desoladores de outras mulheres que são cobradas por escolas pelo desempenho dos filhos.

"As mães estão se autoagredindo, arrancando os cabelos de tanta exaustão. Já perdi oito quilos, e as pessoas ainda vêm com a frase 'como você está linda magra'. Isso é só mais uma violência. Acho forças graças a muita sessão de terapia e em grupo de mulheres", relata.

A intimação

Em vez de receber alguma sugestão da escola do filho para resolver o impasse, Cristina foi denunciada no Conselho Tutelar e no Ministério Público.

O Conselho esteve na sua casa em setembro último e, segundo a advogada Rita Braun o órgão percebeu que Cristina é uma mãe consciente e que as crianças estão com suas necessidades atendidas e ainda que seu filho não tinha criado vínculo com os colegas e professores, uma das causas das dificuldades apresentadas no sistema de aula remota.

Já o MPRS enviou uma notificação para que Cristina enviasse todos os e-mails trocados com a escola.

As crianças seguem matriculadas na mesma unidade. Cristina justifica: "Quero dar o benefício da dúvida à escola, que também se perdeu durante a pandemia. Mas se o MP for favorável à escola, provavelmente ele vai para outra escola."

Enquanto isso, a escola ainda não forneceu o que Cristina solicita: o plano pedagógico transitório, documento que é direito do aluno e da família. Sua defesa ainda vê machismo contra a autônoma: "Em momento algum o pai da criança foi mencionado ou notificado. Somente a Cristina, como se ela fosse a única responsável legal pelo filho", pondera Rita.

Procurado, o MPRS respondeu que após receber comunicação sobre a baixa frequência do aluno, instaurou um procedimento (que está em andamento) de acompanhamento e mediação para o retorno do aluno à regularidade. Segundo o órgão, "o caso está em análise e pode configurar em violação do direito à educação".