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Para brasileiras, Malala lembra atentado e pede: "Nunca subestime sua voz"

Malala Yousafzai - Getty Images/Getty Images for EIF & XQ
Malala Yousafzai Imagem: Getty Images/Getty Images for EIF & XQ

Nathália Geraldo

De Universa

18/07/2020 17h11Atualizada em 18/07/2020 17h11

Uma das mais famosas ativistas na luta pelo direito à educação para meninas, a paquistanesa Malala Yousafzai, 23, participou neste sábado de evento Expert XP, promovido pela XP Investimentos, e falou, entre outros assuntos, sobre o desdobramento da pandemia para jovens estudantes e a importância de manter sua voz em defesa da emancipação feminina por meio da educação.

Após o evento, Universa também participou de um bate-papo de Malala com cerca de 20 brasileiras —entre elas a deputada federal Tabata Amaral, a ativista Stephanie Ribeiro, Luana Génot, diretora executiva do Instituto Identidades do Brasil, e Maite Schneider, fundadora da Transempregos e embaixadora da Rede Brasil Empreendedora.

"Não podemos deixar milhões de meninas sem educação", disse a ativista. "Os problemas variam conforme as regiões. No Brasil, há meninas que saem da escola por gravidez precoce e por outros motivos, como não ter o apoio financeiro da família. Eu dou apoio às ativistas do Brasil, que lutam pela igualdade de gênero, pela educação e também pelos professores". O Fundo Malala atua prioritariamente no Brasil, Afeganistão, Índia, Líbano, Nigéria, Turquia e Paquistão. Universa já contou sobre um desses projetos.

Uma provável evasão escolar pós-pandemia, fruto do aprofundamento da crise econômica derivada da crise sanitária, também foi motivo de preocupação da ativista. "Depois da pandemia, elas têm o direito de voltar à escola", pede. Um relatório do Fundo Malala estima que 20 milhões de garotas em idade compatível com o ensino médio no mundo poderão ficar fora da escola depois que a crise do coronavírus passar. O número é associado ao medo de retomar a vida cotidiana das famílias e à necessidade de elas contribuírem financeiramente, deixando os estudos para trabalhar.

Depois de encerrar o evento ao lado do pai e cofundador do Fundo Malala, Ziauddin Yousafzai, a jovem conversou com um grupo de cerca de menos 20 mulheres, entre jornalistas e lideranças políticas, do qual Universa fez parte.. Veja os principais trechos dessa passagem virtual de Malala pelo Brasil.

Ativismo pela educação e outras pautas

Mais jovem vencedora do Prêmio Nobel da Paz, em 2014, Malala completou 23 anos no dia 12 de julho. Na vida pessoal, celebrou recentemente mais uma conquista: concluiu a faculdade de Filosofia, Política e Economia na Universidade de Oxford, no Reino Unido. Equilibrar o ativismo e os estudos, aliás, apontou, é a parte mais difícil de ser Malala.

A projeção mundial conquistada por ela por conta da defesa do direito à educação veio cedo. "Eu tinha 11 anos e a educação era precária. Meu direito à educação foi extirpado de mim. Foi quando comecei a divulgar a necessidade das meninas estarem na escola. A educação era só para homens, e tínhamos que ouvir a voz das mulheres."

Foi por conta da expressiva atuação pela educação feminina no Paquistão que Malala foi alvo de tentativa de assassinato, aos 15 anos, baleada na cabeça ao sair da escola, em um ataque talibã. "Eles tentaram me silenciar com um tiro, porque tinham medo de uma adolescente."

O episódio foi relembrado por ela na apresentação para dizer como uma única voz pode ser potente na transformação de um mundo melhor.

É importante que você faça sua parte e nunca subestime sua voz. A idade não é uma limitação. Quando eu fui atacada, entendi que minha voz era mais poderosa do que eu achava

Malala - Getty Images/Getty Images for EIF & XQ - Getty Images/Getty Images for EIF & XQ
"É importante que você faça sua parte", disse a ativista, em evento, a respeito da necessidade de vozes se erguerem por um mundo melhor
Imagem: Getty Images/Getty Images for EIF & XQ

Greta é uma inspiração para ela

Exemplo para milhares de meninas pelo mundo, Malala conta que também se inspira em ativistas jovens, como a sueca Greta Thunberg. As duas se conheceram no início do ano.

"São ativistas que estão lutando pelas condições climáticas, que são mais sensíveis e não ficam em silêncio: querem as mudanças rapidamente. Acreditam em um mundo melhor e querem ver isso agora", afirma Malala, sobre a geração ainda mais jovem do que ela que já se movimenta para pressionar lideranças mundiais sobre temas que consideram urgentes.

Questionada sobre eventuais dificuldades que as futuras gerações de mulheres enfrentarão, ela aponta a pluralidade de causas com que precisarão lidar para conseguir um mundo mais justo.

"Eu tenho fé na missão da educação para mulheres, mas também fico pensando em como focar em outras questões, como meio ambiente, mudanças climáticas, igualdade de gênero. Ao mesmo tempo, percebo que elas estão associadas, porque, com a educação as mulheres estarão sentadas nas mesas em que as decisões serão tomadas, e serão mais capacitadas para isso."

A ativista considera fundamental que os governos ofereçam educação em dois níveis: universal, ligada a assuntos como educação financeira, de direitos humanos, ciências e tecnologia, e local, para que as crianças dialoguem com suas origens e cresçam atreladas a suas raízes. Em tempos em que notícias são distorcidas ou mesmo inventadas, "as crianças devem ter pensamento crítico", opina Malala.

Transformação vem de ação e estudo

Para Malala, a conquista da equidade de gênero passa por ação — não à toa, ela mencionou mais de uma vez a ideia de "desafiar o sistema".

"Meu objetivo desde o início era que todos estivessem na escola. E eu queria que fosse simples", conta. "Aprendi com o tempo que é mais complicado, requer paciência, há um grande rombo de investimentos na educação."

Ela sugere, então, que se olhe para quem mais precisa de atenção. "Precisamos focar mais nas crianças marginalizadas, trabalhar em nível local e internacional, e com pessoas que identifiquem os problemas e provoquem os líderes a fazerem mudanças."

A mesma necessidade de "agir" passa pela educação antirracista, tema que se tornou pauta após o movimento Black Lives Matter ganhar as ruas pelo mundo. "Há muito o que aprender, especialmente sobre antirracismo. George Floyd foi uma perda trágica, e também uma forma de nos acordar para pensarmos sobre o que estamos fazendo, se estivemos cegos para o sistema racista nas nossas próprias organizações e salas de aulas", comentou a ativista.

Mala considera que é preciso "desafiar o sistema" e atuar no aspecto individual e no coletivo para que as mudanças sociais, como o fim do racismo e do machismo, aconteçam.

Comecemos nos educando. A educação é importante; mas é incompleta sem ação.