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Mulher diz ter descoberto gravidez com ajuda do Apple Watch; é possível?

Luke Chesser/Unsplash
Imagem: Luke Chesser/Unsplash

Rosália Vasconcelos

Colaboração para Tilt, do Recife

07/10/2022 10h30Atualizada em 07/10/2022 14h45

O relato de uma mulher norte-americana de 34 anos com detalhes de como ela descobriu sua gravidez viralizou nesta semana aqui no Brasil. Segundo ela, o Apple Watch (relógio inteligente da marca) indicou aumento de seus batimentos cardíacos em repouso, de 57 BPM (batimento cardíaco por minuto) para 72 BPM, durante 15 dias.

Preocupada, ela, que já tem um bebê de 18 meses, foi ao médico. Suspeitou que pudesse ser covid-19 ou alguma outra virose que apresentasse alterações fisiológicas, como febre, que tende a alterar a frequência cardíaca. Tudo descartado. Até que veio a confirmação após um exame de sangue: estava grávida de quatro semanas.

O caso tem repercutido na internet e gerado dúvidas: é possível mesmo que um dispositivo consiga ajudar a detectar uma gravidez nessa fase da gestação? Tilt conversou com médicos para descobrir a resposta.

Entenda o caso

O relato foi compartilhado pela mulher no Reddit, maior comunidade de fóruns dos Estados Unidos. Na publicação, ela comemorou a eficiência do relógio, que indicou aumento de sua frequência cardíaca quando ela estava com duas ou três semanas de gestação pelos cálculos retroativos.

Assim como outros smartwatchs, o relógio da Apple tem uma função de monitorar os batimentos cardíacos. Em contato com a pele, ele rastreia a frequência de tempos em tempos. Assim, a tecnologia consegue calcular a média de batimentos em repouso, durante uma caminhada e outras atividades físicas, por exemplo.

No caso da mulher, a alteração foi observada por ela durante o repouso, quando a frequência costuma ficar mais baixa.

"O Apple Watch identificou a gravidez imediatamente, antes mesmo que eu percebesse. E eu não teria feito o teste tão rápido", disse. "Eu sei que isso pode ser um uso incomum para o relógio, mas se você é uma mulher em idade de gerar filhos e seu relógio mostra um aumento de frequência cardíaca, pode valer a pena fazer o teste."

A gravidez foi confirmada através de um exame de sangue, chamado Beta-hCG. Ela contou ainda que teria realizado um exame de ultrassom, mas pelo estágio de desenvolvimento do feto, não foi possível identificá-lo através das imagens.

Smartwatch é capaz de detectar gravidez?

A resposta é não, segundo especialistas ouvidos por Tilt.

Para o presidente da Sociedade Pernambucana de Cardiologia, Carlos Japhet, o caso da mulher dos Estados Unidos foi uma mera coincidência.

O especialista em cardiologia para gestantes explica que, entre a primeira e a quinta semana de gestação, é a fase da implantação do óvulo no útero. É um momento sem qualquer alteração no corpo da mulher. A única mudança que pode indicar gravidez é a amenorreia — o atraso na menstruação. Logo, os batimentos cardíacos da mulher não sofrem alterações nesse início.

Isso muda mais para frente, já entre a sexta e a nona semana de gestação, quando ocorre a embriogênese (desenvolvimento embrionário).

"A partir das 10 semanas de gestação, ou seja, com mais de dois meses, é possível dizer que a frequência cardíaca aumentou por causa da gravidez. Pois neste momento, o bebê já está formado, e há uma demanda maior da placenta e do volume sanguíneo", explica o médico.

Nem mesmo o teste de sangue beta hCG (gonadotrofina coriônica humana) pode detectar uma gestação imediatamente nos primeiros cinco dias após a fecundação. De acordo com a ginecologista e obstetra Cinthia Komuro, o hormônio hCG só é secretado na circulação materna seis dias após a ovulação — normalmente, ocorre entre oito a dez dias após a ovulação.

"Como é recomendado calcularmos o tempo gestacional baseado na data da última menstruação, então o teste de gravidez deve ser realizado quando a menstruação atrasa", explica Komuro.

A partir do segundo trimestre, a quantidade de sangue bombeado no coração da gestante aumenta entre 30% e 50%. "Neste momento, a frequência cardíaca em repouso pode variar entre 70 bpm e 100 bpm. Mas nem todas vão chegar a 100 bpm, mesmo no fim da gestação", afirma a obstetra.

Segundo os especialistas, de maneira geral, durante a gestação são considerados normais aumentos de 14 bpm a 16 bpm em repouso a partir das 10 semanas.

Alerta de estado de saúde alterado

O monitoramento de batimentos cardíacos, pressão arterial e oxigenação no sangue são funções comuns a diferentes modelos relógios inteligentes vendidos no mercado.

Mesmo assim, as fabricantes destacam em suas especificações técnicas que as tecnologias não são capazes de determinar diagnósticos. Isso só deve ser feito com profissionais especializados.

Por isso, alguns médicos aproveitaram o viral para fazer um alerta: se esses dispositivos apontarem alguma alteração, pode ser o indicativo de algum problema ou mesmo de doença. A recomendação é investigar possíveis motivos para os dados fora do padrão do usuário.

Aqui em Tilt, inclusive, já publicamos um relato de uma brasileira que descobriu, com ajuda de um smartwatch, que seu coração acelerado "sem motivo" era na verdade arritmia.

No caso da norte-americana que teve a frequência cardíaca alterada já no início da gestação, o médico cardiologista acredita que pode ter havido alguma condição associada.

No relato, inclusive, a mulher disse que estava sem menstruar há um ano e meio. "Ela pode ter tido um quadro de infecção associada, uma anemia, ou mesmo um distúrbio hormonal. Diversas doenças aumentam os batimentos cardíacos", ressalta Carlos Japhet.