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Como emoji de raiva no Facebook pode ter facilitado propagação de fake news

Emojis recebiam peso diferentes no Facebook - Reprodução
Emojis recebiam peso diferentes no Facebook Imagem: Reprodução

Abinoan Santiago

Colaboração para Tilt, em Florianópolis

26/10/2021 15h38

Se você alguma vez reagiu a publicação no Facebook com um emoji, saiba que a sua interação valeu até cinco vezes mais do que uma curtida para engajar o conteúdo na plataforma. Foi assim que o algoritmo da rede social se manteve programado por três anos, segundo investigação do jornal Washington Post.

A descoberta faz parte das denúncias baseadas em documentos internos vazados da empresa de Mark Zuckerberg, chamadas de "Facebook Papers".

De acordo com a nova denúncia, ao dispor aos usuários, há cinco anos, os emojis "amor", "haha", "uau", "triste" e "zangado", o algoritmo estava programado para impulsionar nos feeds de notícias os conteúdos com reações mais emocionais e provocativos em relação aos que recebiam apenas curtidas.

Os documentos mostram que, a partir de 2017, cada reação emocional recebia de quatro a cinco pontos em relação à curtida, com um. A raivosa, contudo, era a única a valer a pontuação máxima, influenciando no conteúdo que aparecia ou era ocultado na linha do tempo de algum usuário.

Os emojis valiam muito mais porque o Facebook entendia que a interação por reação emocional apresentava maior potencial de engajamento, fazendo o usuário passar mais tempo na rede social, o que é bom economicamente para a empresa, segundo a reportagem.

Em 2019, cientistas de dados concluíram um efeito danoso dessa programação do algoritmo, pois verificaram que as postagens com reações emocionais possibilitavam a propagação de fake news, sobretudo, pelo impulso do uso do emoji de raiva.

De acordo com o Washington Post, o funcionamento do algoritmo afetou consideravelmente o trabalho da equipe de moderação de conteúdo do Facebook contra desinformações.

Ao jornal, um porta-voz do Facebook, Dani Lever, afirmou que a empresa trabalha "para entender qual conteúdo cria experiências negativas" para que possa "reduzir sua distribuição". "Isso inclui conteúdo com uma quantidade desproporcional de reações de raiva, por exemplo".

Após inúmeras propostas de funcionários, o alto escalão do Facebook reduziu a zero a pontuação do emoji de raiva somente em setembro de 2020. Isso aconteceu após usuários relatarem não gostar dessa reação em suas postagens.

Depois da medida, houve um declínio de oferta de postagens com conteúdo "perturbador" e com menos "violência gráfica", destacou o jornal.

O porta-voz do Facebook reafirmou ao veículo que esse peso ainda permanece, porém, o de "amor" e "triste" agora valem dois pontos, cada.

Único usuário, várias contas e nenhuma solução

O "Facebook Papers" também revelou hoje que a empresa pouco fez para coibir as chamadas Sumas (Single User Multiple Accounts, que em português significa Múltiplas Contas de Único Usuário). É aquela pessoa que abastece de conteúdo vários perfis na rede social.

Apesar de o Facebook pontuar em sua política de privacidade que não permite várias contas de uma única pessoa, a empresa soube da existência de milhões de Sumas, mas não conseguiu combatê-las, revelou o site "Político", dos Estados Unidos.

Uma pesquisa interna mostrou que, em 2018, as Sumas atingiam 11 milhões de norte-americanos por dia que consumiam conteúdos políticos, representando 14% desse público.

Apesar de muitos se mostrarem inofensivos, uma parcela de usuários utilizava esse mecanismo para propagar discursos de ódio e fake news na rede social, dizem os documentos.

Ao site "Político", um porta-voz do Facebook, Joe Osborne, pontuou que os documentos não mostram um quadro abrangente sobre as Sumas, como o fato de a rede social atuar para conter os perfis.

"Não é uma revelação que estudamos contas duplicadas, e este instantâneo de informações não conta toda a história", afirmou.