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Roberto Sadovski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Pouco inspirado, 'Sorria' é terror movido a sustos baratos

Sosie Bacon em "Sorria" - Paramount
Sosie Bacon em 'Sorria' Imagem: Paramount

Colunista do UOL

29/09/2022 04h00

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Sabe a reunião que poderia ser um e-mail? Pois "Sorria" é um filme que não precisava ser esticado em um longa. A estreia do roteirista e diretor Parker Finn, que expande seu próprio curta-metragem "Laura Hasn´t Slept", é uma ideia esperta esvaziada em uma coleção de sustos fáceis.

O cinema de terror sempre floresce quando existe algo humano nas entrelinhas de uma premissa fantasiosa. No caso de "Sorria", Parker busca a exploração do trauma escondida em uma trama de maldição sobrenatural. O problema é que um filme não se sustenta baseado em boas intenções.

Rose Cotter (a ótima Sosie Bacon, de 'Mare of Easttown') é uma terapeuta que testemunha o suicídio brutal de uma nova paciente. A moça, petrificada de medo, acalma a postura e abre um largo sorriso antes de rasgar a própria garganta. Apavorada, Rose aos poucos percebe que pode ter herdado o mesmo mal que afligia a suicida.

É o começo de uma espiral descendente que lentamente mina seu pensamento racional. Longe de ter alucinações, porém, Rose agora é assombrada por uma entidade que amarra suas vítimas em uma corrente de suicídios violentos e traumas irreparáveis. O gatilho são pessoas aleatórias que surgem para ela com um sorriso largo e desconfortável.

"Maldição em série" não é nem de longe uma novidade no gênero. No começo do século, o cinema japonês dominou essa fatia do mercado, em especial com as séries "Ju-On" e "Ringu", adaptadas no mercado ianque como "O Grito" e "O Chamado". Em 2014 a ideia de uma maldição sendo passada como um vírus ganhou uma tradução cinematográfica apavorante no ótimo "Corrente do Mal".

"Sorria" é basicamente uma miscelânea dessas mesmas ideias sem nenhum tempero. Parker Finn se mostra um diretor interessante, capaz de criar momentos de tensão genuína. Como roteirista, porém, seu trabalho é inconsistente e desleixado.

smilefilme head - Paramount - Paramount
'A senhora quer comprar um pano de prato que eu mesma faço?'
Imagem: Paramount

Existe a tentativa em desenhar uma cronologia lógica em "Sorria", uma trama a qual a personagem de Sosie Bacon possa se agarrar - e em que possamos nos agarrar. A impressão, entretanto, é que nenhuma ideia é boa o bastante para o tabuleiro de Parker.

Existe a figura do noivo cético (Jessie T. Usher), da irmã suburbana (Gillian Zinser) e da psiquiatra condescendente (Robin Weigert). Um ex-namorado (Kyle Gallner) é um policial com acesso ao registro de dúzias de mortes brutais que, mesmo conectadas, nunca despertaram a menor suspeita. A certa altura, o próprio trauma de Rose, que testemunhou quando criança o suicídio da mãe, parece se encaixar na ação da tal entidade sobrenatural. Fica na promessa.

Parker Finn não parece interessado em contar uma história, abandonando todas as pistas no meio do caminho. Sua opção é amarrar os fiapos com sustos vulgares e sem sentido, estourando o volume da trilha e dos efeitos sonoros sem deixar nenhum espaço para sutileza. A entidade aos poucos se revela, mas em nenhum momento entendemos exatamente o que ela é.

Se estivéssemos nos anos 1990, "Sorria" seria aquele filme que você soma à sua seleção de fim de semana da videolocadora para pegar na sexta e devolver na segunda. É inofensivo e perfeitamente esquecível. É também irritantemente derivativo e arrastado ao extremo. Tem até um monstrinho no final. Não vai deixar saudade.