Lutador de MMA tem duas mulheres e quer legalizar relação poliafetiva
Quando a lutadora Aline Sattelmayer contou às amigas que estava dividindo o marido com uma segunda mulher, ouviu na hora que tinha ficado maluca. “O marido é meu e eu faço com ele o que eu quiser”, respondeu ela.
Ricardo Sattelmayer amava Aline até descobrir que também amava Bianca, sua aluna da academia de MMA. Ele comunicou suas intenções às duas. Sendo amigas, Aline e Bianca não se importaram em compartilhar uma vida de casadas com seu professor de luta. Depois de superada uma pequena resistência entre a família e os amigos, os três foram morar juntos sob o mesmo teto.
Hoje os três dividem a mesma cama, o mesmo octógono na academia da família em São José do Campos, interior de São Paulo, além dos mesmos sonhos. Mestre de muay thai, uma arte marcial milenar de origem tailandesa, Ricardo Sattelmayer, de 35 anos, é também professor das artes marciais mistas.
Aline tem 26 anos. Já lutou no Jungle Fight, o maior torneio da América Latina, e já venceu no Glory of Heroes, o maior evento de MMA chinês. Ela acredita estar a um passo do UFC, a principal organização do mundo.
Bianca quer seguir o mesmo caminho, e enquanto as duas trocam socos e chutes no treinamento diário, compartilham o dia a dia na vida conjugal com Ricardo.
“Quando contamos para a família, foi um susto”, admite Bianca, de 21 anos, que conheceu o casal na academia e sempre gargalhou todas as vezes em que Ricardo contou seu sonho antigo de ter uma segunda mulher. “Minha mãe quase caiu pra trás, mas depois conseguiu entender que o que parecia uma zoeira era uma coisa séria, que seríamos uma família com respeito e amor.”
Quando um está lutando, os outros dois se revezam como os técnicos que sobem no córner do octógono. Tem sido assim há mais de um ano e, se depender deles, será assim para sempre. O que o cage uniu o conservadorismo não vai separar, eles parecem dizer quando explicam com naturalidade seu arranjo familiar heterodoxo.
“Tem muita gente aí que tem uma família tradicional, um homem uma mulher, mas no fundo está infeliz”, filosofa Ricardo, que diz estar vivendo hoje o melhor momento de sua vida. “O cara tem uma esposa, mas às vezes por baixo dos panos tem várias amantes. O que importa em qualquer relação é a sinceridade e a felicidade. Se todo mundo está feliz, ninguém tem nada com isso.”
Os três cuidam da pequena Bárbara, de 6 anos, filha de Ricardo e Aline. Antes de entrar de vez para a família, Bianca ajudava como baby-sitter da menina quando o casal precisava sair de casa. Essa companhia criou uma relação afetiva entre a criança e a “nova esposa do papai”.
“Às vezes a Bárbara chama a Bianca de tia-mãe”, diz Aline. “Se fosse outra pessoa qualquer, talvez fosse mais difícil eu aceitar. Mas como a Bianca já era minha amiga, a gente já se dava bem, então a relação ficou mais fácil.”
Nesse momento, alguém pode estar acusando Ricardo de machismo, de querer ter mais de uma mulher, mas não lhes permitir o mesmo benefício. Ele diz que não se oporia, a princípio, se Bianca e Aline resolvessem ter um segundo marido. “Mas nosso acordo é que seríamos só nós três, e nesse momento nenhum de nós quer uma quarta pessoa na relação”, afirma ele.
Bianca e Aline confirmam não ter interesse em encontrar outro marido.
O que os três estão buscando agora é a oficialização dessa união, o famoso papel passado, registrado em cartório, reconhecido por um juiz, sob as bênçãos do Estado brasileiro. Na prática isso traria ao trio as mesmas garantias legais conferidas a um casal tradicional, além da legitimação social diante dos conhecidos. “Isso seria muito importante para mim porque além de eu me tornar uma Sattelmayer legítima, seria uma forma de dizer à sociedade, aos vizinhos, que somos uma família séria”, afirmou Bianca.
Mas a lei brasileira permite casamento entre três pessoas?
Ainda não. Apesar de uma resolução recente do Conselho Nacional de Justiça que permite a cartórios celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo, ainda não há uma resolução semelhante que autorize casamento ou união estável envolvendo mais de duas pessoas.
A Constituição Federal fala em “o homem e a mulher” como membros da entidade familiar. Apesar disso, um cartório no Rio de Janeiro ficou conhecido no ano passado depois de oficializar duas uniões poliafetivas, ambas formadas por três pessoas (os “trisais”). Meses depois, provocado por uma associação que defende a monogamia, o CNJ recomendou que os cartórios deixem de reconhecer uniões poliafetivas até que um novo parecer técnico seja divulgado.
“A doutrina do direito da família têm visto com certa resistência às uniões poliafetivas”, disse Claudia Aoun Tannuri, defensora pública e membro do Instituto Brasileiro de Direito da Família. “Mas eu considero que é possível reconhecê-las como uma forma de família e garantir a elas todos os efeitos de uma união estável. O fator fundamento para que essa união seja considerada uma família é o consenso entre todos os membros e principalmente o afeto, o que me parece ser o caso desses casal de três.”
O código penal considera um crime punível com até seis anos de prisão a bigamia, que é o casamento com duas pessoas diferentes, geralmente sem a anuência dos cônjuges, e a constituição de dois núcleos familiares diferentes. Esse não é o caso dos Sattelmayer, em que os três são cientes e estão satisfeitos com a situação.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.