Topo

MMA


UFC Mambembe: de supercola a voo improvisado, evento já abusou do jeitinho

Maurício Dehò

Do UOL, em São Paulo

14/11/2013 12h00

Se hoje o UFC é considerado um megashow, com uma estrutura de primeira que roda o mundo e quase nunca falha, antigamente não era bem assim. Até se tornar o que é hoje, o evento teve mudanças de proprietários, de regras e evoluiu muito para se livrar de diversos “jeitinhos” que precisou usar durante sua jornada. Fotógrafo e jornalista, o carioca Marcelo Alonso cobriu boa parte destes primórdios e acompanhou de perto algumas histórias curiosas dos 20 anos de Ultimate Fighting Championship.

Alonso hoje é editor do site Portal do Vale Tudo e na revista PVTMag conta no “Baú do Alonso” alguns desses casos. Ao UOL Esporte, ele relembrou algumas histórias e escolheu as principais viagens de cobertura que lhe marcaram. Entre eles, aqueles já citados “jeitinhos” acabam se destacando por diferirem tanto do alto nível de organização visto hoje.

O UFC 9 foi o primeiro que Marcelo Alonso pôde fazer uma cobertura, quando ainda trabalhava na revista Tatame. À época, o evento já não tinha mais o dono Rorion Gracie e o campeão Royce. Além disso, o limite de tempo foi criado para favorecer as vendas de pay-per-view. Mas o clima do começo ainda estava lá.

“Lembro que pude sentir a febre do jiu-jítsu nos EUA assim que entrei no lobby do hotel dos lutadores em Detroit e avistei um festival de camisas curiosas: Gracie, Rickson, Machado Brothers, Pedro Sauer. Curiosamente, mesmo sem vencer desde o UFC 7, os brasileiros eram sempre favoritos. O clima de Brasil x EUA era forte”, conta ele.

Um dos improvisos no evento, que ainda não tinha toda esta facilidade em encontrar competidores, foi substituir um atleta lesionado no dia da pesagem. Dave Beneteau deveria enfrentar o vice-campeão do UFC 8, Gary Goodridge. Sem ele, começou a corrida para achar novo oponente e Pedro Sauer salvou o dia ao recomendar o vicecampeão olímpico de luta Mark Schultz. Sua fama lhe rendeu uma oferta de bolsa de 50 mil dólares. Ao vencer e ajudar na venda de PPVs, ganhou o dobro da organização.

  • Marcelo Alonso/Portal do Vale Tudo

    Marcelo Alonso ao lado de Vitor Belfort (abaixo, à esquerda) no dia em que teve de acompanhar de avião a mudança do UFC 12, que foi de Nova York para o Alabama

Todo mundo no avião!

Um caso famoso e que teve Marcelo Alonso no meio do impasse foi a realização do UFC 12, num card que marcou a estreia do “Fenômeno” Vitor Belfort, aos 19 anos. O problema naquela ocasião foi que o Ultimate marcou para Niágara Falls, estado de Nova York, o evento. Na época, não havia o veto que existe hoje, mas a oito dias do evento uma série de regras foi imposta, obrigando, por exemplo, o uso de capacetes protetores.

Sexo e músculos foram problema

  • Marcelo Alonso/Portal do Vale Tudo

    Outro evento que Marcelo Alonso acompanhou e que acabou com polêmica foi o UFC 15, com a primeira derrota de Vitor Belfort, em duelo com Randy Couture.

    Isso porque o técnico Carlson Gracie não gostou de algumas atitudes anteriores ao combate. A primeira reclamação foi que o carioca fez sua preparação com um fisiculturista e o resultado foi um Vitor pesado e lento, nocauteado em 8 minutos.

    A outra reclamação foi da vida íntima. Carlson criticou o excesso de sexo que Vitor estaria praticando: "Como é que alguém que passa duas semanas trancado no quarto com a namorada antes da luta pode vencer? Assim não há atleta que resista."

No impasse, a realização do UFC acabou proibida. “A 29 horas do evento, quando o octagon já estava montado, o show teve que ser transferido emergencialmente para Dothan, Alabama, onde o esporte era legalizado. Lembro que a notícia foi dada durante a reunião de regras do evento”, diz Alonso.

O “jeitinho” desta vez foi algo bem mais complicado. A SEG, empresa dona do Ultimate, desmontou tudo, alugou um Boeing e partiu para o Alabama com tudo e todos. Sobrava pouco espaço no avião, e a viagem de jornalistas, como Alonso, estava sem resolução. Ou ele pagava US$ 950 numa passagem emergencial, ou voltava para o Rio. Carlson Gracie interveio e conseguiu convencer a organização a liberar o embarque.

“Só mesmo Carlson Gracie e sua trupe de quase 20 lutadores para transformar um momento tenso daqueles em uma viagem das mais engraçadas que já fiz. Com os principais lutadores do mundo a bordo daquele voo, um brasileiro chegou a mandar a piada: ‘Se este avião cair acaba o vale-tudo no planeta’. Foram 14 horas de trabalho para deixar tudo pronto para a transmissão”, relembra.

Naquele UFC 12, Vitor Belfort nocauteou Tra Telligman em 1min17s, fez o mesmo com Scott Ferrozzo em apenas 42s, criando a fama que o acompanharia. Na época, ele levava o “Gracie” como um sobrenome adotivo, uma jogada de marketing e também uma mostra de sua proximidade de Carlson.

  • Marcelo Alonso/Portal do Vale Tudo

    Pedro Rizzo nocauteia Tank Abbott no UFC de São Paulo, em 1998

Supercola no UFC Brasil

A primeira edição do UFC no Brasil foi no hoje longínquo 1998, quando o ginásio do Canindé, em São Paulo, sediou o card. O evento ficou muito marcado pelo nocaute de Vitor Belfort sobre Wanderlei Silva, em menos de um minuto. O combate foi marcado por muita polêmica e provocações, inclusive com boatos de que Vitor estava doente e não lutaria.

Outro brasileiro que brilhou e foi carregado do octógono foi Pedro Rizzo. E sua vitória teve um detalhe interessante: ele teve de usar uma supercola para “consertar” um corte no supercílio ocorrido dias antes do combate com Tank Abbott.

"Quatro dias antes do evento, abriu um corte abaixo do olho, treinando com Ebenezer. Para não deixar o ponto fraco visível ao oponente, ele acabou usando um recurso nada ortodoxo, a cola super bonder. Ele falou: 'Eu sabia que o primeiro soco que entrasse abriria, mas não havia outro jeito'". Rizzo venceu por nocaute, aos 8 minutos de combate.

Alonso conta ainda que a primeira edição no Brasil trouxe diversas preocupações para os organizadores. A principal, e que se confirmou, foi com as invasões do octógono para cada vitória de brasileiros.

Rizzo disse à época: “Falaram que cada pessoa que invadisse descontariam 10% da minha bolsa. Quando eu vi aquela multidão comemorando comigo, achei que iria pagar pra lutar”.