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Impasse por transmissão tira seleção da TV e afasta jogadores da torcida

A TV Globo, de Galvão Bueno (foto), não transmitiu os jogos contra Peru e Uruguai pelas Eliminatórias para a Copa de 2022 - Reprodução
A TV Globo, de Galvão Bueno (foto), não transmitiu os jogos contra Peru e Uruguai pelas Eliminatórias para a Copa de 2022 Imagem: Reprodução

Gabriel Carneiro e Pedro Lopes

Do UOL, em São Paulo

18/11/2020 04h00

Ligar a televisão na última terça-feira (17) para assistir a Brasil 2 x 0 Uruguai pelas Eliminatórias, valendo pontos na disputa por uma vaga em Copa do Mundo, teria sido o programa da noite para milhões de brasileiros em meio a uma pandemia mundial que causa impactos há mais de oito meses. A transmissão, entretanto, ficou de fora da TV aberta (o confronto foi transmitido pela plataforma de streaming EI Plus, da Turner, e por um sistema de pay-per-view do Bandsports), em um novo capítulo de um afastamento crescente entre a seleção brasileira e seus torcedores.

As transmissões em TV aberta deixaram de ser a regra desde que a Conmebol alterou as normas de venda de direitos de transmissão, passando a dar às confederações dos países sul-americanos a prerrogativa de negociá-los. Com isso, as partidas em território brasileiro são transmitidas em TV aberta pela Globo, parceira da CBF; no caso dos jogos em outros países, as empresas interessadas precisam negociar diretamente com a confederação da seleção mandante, e, a cada rodada, há o risco de que o Brasil fique de fora da TV aberta.

A seleção se despediu de 2019 de mal com a torcida, e o título da Copa América em julho foi uma oportunidade desperdiçada de reaproximação entre o time comandado por Tite e quem o acompanha dos sofás e arquibancadas. A relação que ameaçou esquentar foi esfriada com amistosos em lugares longínquos, como Singapura, Emirados Árabes e Arábia Saudita, e adversários que não empolgam, como Nigéria, Senegal e Coreia do Sul.

Os estádios onde a seleção jogou no segundo semestre de 2019 também foram vazios e sem clima, com uma taxa de ocupação de 54% - quase metade de seus assentos vazios. Com a bola nos pés, a equipe atravessou uma fase de oscilação natural em um momento no qual Tite procurou fazer mais testes e experiências. O conjunto pouco atrativo derrubou o interesse e a paixão dos torcedores.

Pandemia impediu reaproximação anterior

As Eliminatórias apareceram no horizonte como oportunidade perfeita para a reaproximação entre seleção e torcida. Primeiro, porque são jogos competitivos, contra rivais tradicionais, que valem vaga na Copa. Segundo porque metade dos confrontos seriam em estádios brasileiros, normalmente preteridos em amistosos.

O fator público foi atingido quando a pandemia do novo coronavírus pegou o mundo de surpresa. Marcadas para março, as Eliminatórias só começaram em outubro, sem torcida nos estádios. Restaria aos brasileiros acompanhar os jogos pela televisão, mas, como ficou claro ontem, nem sempre isso será possível.

No Brasil, cerca de 46 milhões de pessoas não tem acesso a internet, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística coletados. Apenas 66 milhões dos 209,5 milhões de brasileiros possuem TV por assinatura, segundo o mesmo levantamento, atualizado até 2018.

Jogadores lamentam distância

"O povo brasileiro quer acompanhar a seleção, estar mais próximo, e isso dificulta um pouco. Com essa pandemia, que o pessoal está em casa, tinha que aproveitar mesmo. O povo quer acompanhar a seleção, estar por dentro de tudo, e não consegue por essas negociações da TV. Sentimos falta também do torcedor, e esperamos que isso seja resolvido o mais rápido possível", lamentou Richarlison, depois do confronto de ontem.

Com a fragmentação das transmissões, a CBF tem procurado agir para reaproximar a seleção dos torcedores, tanto na transmissão dos jogos quanto no dia a dia. Na segunda rodada das Eliminatórias, em outubro, a entidade conseguiu um acordo com a Mediapro, que detém os direitos de comercialização dos direitos da federação peruana, e realizou a transmissão de Brasil 4 x 2 Peru na rede estatal TV Brasil e em seu próprio canal, a TV CBF. A audiência, no entanto, não chegou a 20% da média dos jogos da equipe.

A equipe de comunicação da seleção brasileira também tem feito transmissão de treinamentos e entrevistas, divulgado vídeos com bastidores da equipe e mantido um intenso trabalho de atendimento à imprensa de forma remota, com realização de zonas mistas virtuais após os confrontos, mantendo o fluxo de conteúdo aos brasileiros durante a pandemia da covid-19.

A decisão da Conmebol quanto à forma de negociação dos direitos é, entretanto, irreversível. A cada rodada das Eliminatórias as transmissões dos confrontos que o Brasil tiver fora de casa serão incertas, e sujeitas a processos individuais de negociação - há risco de que várias acabem ficando fora da TV aberta. A seleção volta a campo em março, quando viaja para a Colômbia e enfrenta os donos da casa, e recebe a Argentina em Recife.