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Técnico revela toque de recolher às 15h e medo de não voltar da Arábia

André Gaspar, técnico do Al Hazm, da Arábia Saudita - Divulgação Al Hazm
André Gaspar, técnico do Al Hazm, da Arábia Saudita Imagem: Divulgação Al Hazm

Alexandre Araújo

Do UOL, no Rio de Janeiro (RJ)

25/04/2020 04h00

André Gaspar, técnico do Al-Hazm, é um dos brasileiros que estão na Arábia Saudita no aguardo para embarcar para a terra natal em meio à pandemia de coronavírus. O movimento junto à embaixada do Brasil no país para que o retorno fosse viabilizado contou também com nomes como Fabio Carille, do Al Ittihad, e Luis Antônio Zaluar, do Al Akhdoud, além de alguns jogadores, como Marcelo Grohe, do Al ittihad, e Alemão, do Al Hazm.

Gaspar conta que as atividades relacionadas ao futebol foram suspensas há pouco mais de um mês e as cidades adotaram diversas medidas em relação às restrições das pessoas nas ruas. Quando o campeonato foi paralisado por tempo indeterminado, as fronteiras já estavam fechadas e não havia mais voos com destino ao Brasil.

"No dia 13 de março, o campeonato parou. Os treinamentos, no dia seguinte, também pararam. A princípio, não sabíamos se íamos voltar ou não. Então, ficamos aguardando e, duas semanas atrás, os presidentes dos clubes resolveram fazer uma reunião e paralisar o campeonato por tempo indeterminado. Provavelmente, até agosto. Nisso, a cidade já tinha fechado, o país já tinha fechado... Não tinha mais voos para sair do país e a gente ficou desesperado. Aqui [região de Ar Rass], tem o toque de recolher e às 15h tem de estar em casa. Tem cidade que está fechada 24 horas, só podendo sair para ir à farmácia e supermercado. Foi aí que começamos a entrar em contato com a embaixada para ver se conseguia um voo. Foi uma luta diária", lembra ele, antes de completar:

"Conseguimos e vamos embarcar. Amanhã [hoje, 25], vamos saber ao certo se terça ou quarta-feira. Só o pessoal do futebol são 110 pessoas, mas tem pessoas de outros esportes e outros brasileiros que aqui estão, totalizando 180. Dentre eles, o Carille, o Zaluar, que estava até mais tempo que a gente aqui na Arábia."

André Gaspar, do Al Hazm, cumprimenta Fabio Carille, do Al Ittihad, da Arábia Saudita - Divulgação Al Hazm - Divulgação Al Hazm
Imagem: Divulgação Al Hazm

As incertezas impostas diante do cenário da pandemia deixaram o grupo apreensivo, mas André celebra o final feliz das conversas.

"Tememos bastante porque tinha apenas um voo da Lufthansa, que saiu com os repatriados alemães. Eram poucas vagas, mas tiveram alguns brasileiros que conseguiram, como o [Péricles] Chamusca [técnico do Al-Faisal]. Nos vimos no escuro. 'E aí, não vai mais ter voo? Só daqui a 40 dias, daqui a dois meses?'. E aí surgiu essa ideia... Eu, Carille, Zaluar, alguns jogadores. Conversamos bastante, fizemos reuniões com o embaixador [Marcelo Della Nina] e conseguimos esse voo, da Etiópia Airlines, para voltarmos em segurança."

Apesar de toda a tensão que atravessa, o treinador do Al-Hazm elogia as ações do governo da Arábia Saudita para controlar o contágio de coronavírus. Até o momento, foram 15.102 casos confirmados e 127 mortes.

O país vive sob uma monarquia absoluta, o que significa que o Rei Salman não é apenas o chefe do Estado, mas também do governo.

"Vi um país muito educado no sentido de controle dessa pandemia. Controle de fronteiras muito rápido, voos e chegadas de estrangeiro, algumas cidades em fechamento total, outras em fechamento após às 15h. E os números de casos são bem pequenos, de mortes menor ainda. 'Menor ainda' comparado a outros países, né? Porcentagem acho que não chega nem a 1% de mortalidade. Isso foi um ponto positivo que vi aqui".

André Gaspar havia chegado pouco antes de eclodir a crise, depois de cinco anos no comando de Daegu, da Coreia do Sul. Ele indica que a impressão do nível técnico do campeonato foi positiva, salientando o número de estrangeiros que podem atuar por clube.

"Trabalhei cinco anos na Coreia e recebi a proposta em janeiro para vir trabalhar aqui. A princípio, fiquei um pouco apreensivo, mas aceitei. Quis abrir portas também. Minha impressão foi muito boa. Aqui, podem jogar sete estrangeiros e isso ajuda bastante o nível. Tempo foi muito curto, na verdade. Foram dois meses de trabalho, mas o resultado veio. O time estava perto da zona de rebaixamento e conseguimos fazer pontos importantes. Todos gostaram e estávamos em um caminho certo. Com essa paralisação... Na volta, vou ganhar mais tempo para que eles possam assimilar e para que possamos dar continuidade", apontou ele, que indicou que a permanência por mais uma temporada está alinhada.

Esta, porém, não chega a ser a primeira vez que Gaspar atravessa um problema com uma doença. Quando atuava na China, lembra ter passado por algo parecido, mas com proporções bem menores.

"Em 2003, teve uma doença respiratória na China e eu estava lá naquela época [atuava no Qingdao Janoon]. Mas foi bem curto, teve e eles contiveram rapidamente. Ficou só lá mesmo, não saiu para outros países", recorda.

"Acompanho as notícias do Brasil, aqui tem canais brasileiros. Essa pandemia pegou o mundo inteiro e, infelizmente, chegou ao Brasil em um momento forte. Vou chegar [ao Brasil] em um momento difícil também, mas a gente espera que se resolva o mais rapidamente possível", concluiu.