Conmebol quer abafar críticas à Copa América com pena exagerada para Tite

O tribunal da Conmebol decidiu multar o técnico Tite por ter criticado a organização da Copa América. O treinador foi enquadrado em um artigo que fala de insultos e difamação. A punição foi vista como desproporcional e exagerada por três especialistas ouvidos pelo blog.

A CBF, que também é organizadora da Copa América, não tinha como recorrer por causa do código de disciplina da Conmebol que só permite contestação com penas maiores. Mas a entidade também foi bem tímida na defesa do seu treinador, limitando-se a tentar suavizar suas palavras.

Desde antes da competição, Tite e os jogadores se mostraram incomodados com a realização da Copa América do Brasil. O torneio foi articulado pela CBF, Conmebol e governo federal. Antes da estreia diante da Venezuela, o treinador fez críticas em uma entrevista:

"Quando um campeonato é feito de forma atabalhoada, rápida, está sujeito a essa situação. E vai modificar de novo. Independentemente de que país fosse", disse o técnico Tite. E completou: "É uma crítica direta à Conmebol e a quem decidiu, dentro da CBF, ser a Copa América aqui [no Brasil]."

A Conmebol abriu um procedimento disciplinar contra o treinador por ferir o artigo 12 do seu código. Enquadrou em cinco itens:

1) Comportar-se de maneira ofensiva, insultante ou realizar manifestações difamatórias de qualquer índole.

2) Violar as pautas mínimas do que há de se considerar como um comportamento aceitável no âmbito do esporte e do futebol organizado.

3) Insultar de qualquer maneira e por qualquer meio a CONMEBOL, suas autoridades, oficiais etc.

4) Utilizar um evento esportivo para realizar manifestações de caráter extraesportivo.

5) Comportar-se de maneira tal que o futebol como esporte em geral e a CONMEBOL em particular possam ser desacreditados como consequência desse comportamento.

Na defesa do treinador, a CBF tentou argumentar que Tite dizia que a Copa América fora feita às pressas e não de forma desastrosa, como interpretou a Conmebol na denúncia. Mas o treinador foi punido mesmo assim com multa de US$ 5 mil.

"Claramente existe um exagero por parte da Conmebol quanto à aplicação de punição disciplinar contra quem faça qualquer crítica contra a entidade ou a competição. Uma coisa é alguém insultar, acusar levianamente ou desrespeitar. Isso não é compatível com as regras do jogo. Outra coisa é a liberdade e expressão e a liberdade de apresentar um ponto de vista diferente. Contudo, os órgãos disciplinares da Conmebol parecem querer mandar uma mensagem de que nenhuma espécie de divergência pública ou crítica será admitida e isto, na minha opinião, é equivocado e desproporcional. Jogadores e treinadores devem ter, sim, a capacidade de opinar e divergir publicamente, sem que isso represente uma ofensa aos regulamentos", avaliou o advogado Eduardo Carlezzo, que é bastante atuante em tribunais esportivos na Fifa e Conmebol.

Outro advogado ouvido pelo blog, que preferiu o anonimato e também transita em tribunais esportivos, concordou com a avaliação. Entende que, se houvesse possibilidade de recursos, seria bem plausível derrubar a decisão no tribunal de apelações já que a atitude é considerada como uma censura.

Um terceiro advogado, que também milita em tribunais esportivos, lembrou que a corte da Conmebol tem uma natureza de punir em vez de tentar educar. Por isso, o tribunal costuma ser muito rigoroso na aplicação da norma em quase todos os casos.

Além de Tite, o atacante boliviano Marcelo Moreno também foi punido no mesmo artigo por críticas à organização da Copa América pela Conmebol. Ele fez uma alusão ao número de infectados por covid dentro da competição e atribuiu culpa à Conmebol. Ainda afirmou que se houvesse mortes seria responsabilidade da entidade. Sua pena foi uma suspensão de um jogo e US$ 20 mil de multa.