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Olhar Olímpico

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Valieva cai no doping e Rússia é protagonista de novo escândalo olímpico

Kamila Valieva durante apresentação nas Olimpíadas de Inverno 2022 - SEBASTIEN BOZON / AFP
Kamila Valieva durante apresentação nas Olimpíadas de Inverno 2022 Imagem: SEBASTIEN BOZON / AFP

11/02/2022 01h00

As Olimpíadas de Inverno de Pequim estão manchadas por um escândalo de doping e, novamente, tendo a Rússia como protagonista. Desta vez, em uma crise de proporções inéditas no esporte.

Em resumo: Kamila Valieva, adolescente de apenas 15 anos que era a grande estrela das Olimpíadas, testou positivo em um exame realizado em dezembro, foi suspensa automaticamente na terça (8), teve a suspensão revogada pela Rússia na quarta (9) e, agora, o Comitê Olímpico Internacional (COI) trabalha para proibi-la de continuar competindo na China.

Na segunda-feira (7), Valieva deu um show em sua segunda apresentação na prova por equipes da patinação no gelo, fechando com chave de ouro a participação do time russo, que faturou a medalha de ouro. Invicta desde que estreou internacionalmente como adulta, no ano passado, depois de ser a melhor patinadora júnior da história, Valieva acertou dois saltos quádruplos, exercício que ainda era inédito para mulheres em Jogos Olímpicos.

O resultado teve grande importância na geopolítica internacional, porque a patinação foi disputada de manhã em Pequim para ser exibida em horário nobre na TV dos Estados Unidos, para uma enorme audiência. A Rússia venceu a disputa com os americanos, com um desempenho fenomenal de Valieva. Mas agora, diante de mais um caso de doping, pode entregar o ouro de bandeja para os arquirrivais.

Por enquanto, as medalhas do time russo nem sequer foram entregues. E foi exatamente o cancelamento da cerimônia de premiação que deu início a um burburinho em Pequim. Na quarta, o site Inside The Games, especialista em movimento olímpico, noticiou que Valieva, menor de idade, teria sido pega no doping — e o COI estava resolvendo o que fazer.

Foi a fagulha ser acesa e diversos sites publicaram textos sobre um suposto doping de adolescente russa, mas nenhuma autoridade falava sobre o assunto.

O silêncio foi quebrado na manhã desta sexta-feira em Pequim pela ITA, uma agência independente que tem administrado a área de combate ao doping de diversas federações internacionais e do Comitê Olímpico Internacional (COI). Em nota, a ITA disse que o código antidoping proíbe que se exponha Valieva, que é menor de idade, uma "pessoa protegida", mas que a complexidade do caso no meio de uma Olimpíada e a divulgação do ocorrido pela imprensa exigia posicionamento distinto.

A ITA, portanto, confirmou que Valieva testou positivo para trimetazidina, um modulador metabólico, em exame colhido no Campeonato Russo no dia de Natal pela agência antidoping da Rússia, a Rusada. Como o laboratório de Moscou segue fechado, a amostra foi enviada ao laboratório de Estocolmo, na Suécia, que na terça (8) informou a Rusada do resultado positivo para o modulador.

Como a trimetazidina é uma substância não especificada (mais grave) na lista de proibições do Código Mundial Antidoping, a suspensão provisória é obrigatória. Foi isso que fez a Rusada na terça. Suspensa, a patinadora deveria perder a credencial olímpica, que também vale como visto para permanência na China, e voltar para casa. Em 2018, em caso idêntico, uma atleta de bobsled da Rússia, que testou positivo para a mesma substância, foi expulsa da Olimpíada de Pyeongchang, na Coreia do Sul.

Mas, segundo a ITA, antes que isso acontecesse, Valieva contestou a suspensão perante o comitê disciplinar da Rusada que, no mesmo dia, quarta-feira, decidiu retirar a punição. Assim, a patinadora obteve autorização para continuar competindo em Pequim. Diante do histórico da Rússia de acobertar casos de doping, o que inclusive impede o país de competir mais uma Olimpíada com sua bandeira, a postura causou incômodo.

De acordo com a ITA, o COI vai exercer seu direito de recurso e apelará à Corte Arbitral do Esporte (CAS), que montou um escritório provisório em Pequim para tomadas de decisões rápidas na Olimpíada. A Rússia tem jurisdição sobre o caso, mas o COI entende que tem direito a não aguardar o resultado do julgamento da agência antidoping russa e deve recorrer à CAS para discutir a suspensão provisória de Valieva.

Para o COI, é preciso que seja tomada uma decisão antes da próxima participação de Valieva, que é a disputa feminina da patinação, com início na segunda-feira, e na qual a russa é ampla favorita. Enquanto isso, os outros atletas russos, que ganharam a competição por equipes, ficam sem saber se receberão suas medalhas de ouro. O futuro da premiação será decidido pela Federação Internacional da patinação, a ISU, após o julgamento final do caso de doping de Valieva.