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Milly Lacombe

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro só sai depois de destruir tudo, inclusive a si mesmo

Presidente Jair Bolsonaro (PL) - Isac Nóbrega/PR
Presidente Jair Bolsonaro (PL) Imagem: Isac Nóbrega/PR

Colunista do UOL

04/08/2022 14h24

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Jair Bolsonaro não é muito bom de guardar segredos.

Desde sempre, o político Jair avisa o que vai fazer para quem estiver disposto a escutar.

Os que o tomam por palhaço agem movidos por desinteresse factual ou por conveniência eleitoral.

Matar muitos de nós era um sonho antigo, verbalizado à exaustão, e que, com a ajuda de uma pandemia e das políticas liberais de Paulo Guedes, vem sendo realizado com enormes índices de sucesso.

O bolsonarismo sempre foi movido por pulsão de morte. É sua base mais sólida, mais antiga, mais celebrada.

E é esse justamente um dos fortes elos entre o bolsonarismo e o fascismo.

Trata-se de uma pulsão de morte tão arrebatadora que, ao final, nenhum deles se importará em destruir a si mesmo se for essa uma etapa necessária para completar a missão, que é a de arruinar o tecido social até o último farrapo.

Enquanto o fascismo realiza sua missão e a sociedade de esfacela, a elite econômica que sempre o apoiou segue em sua jornada de acúmulo de riqueza e de gozo capitalista.

Essa é, na base, outra característica do fascismo: sempre apoiado por uma elite econômica (caso contrário, não se sustentaria no poder), ele não se importa em destruir a si mesmo a caminho da danação total de tudo e de todos.

Mas, inevitavelmente, o dueto entre capitalismo e fascismo, que serviu tão bem a ambos, terá que ser rompido para que o Capitalismo se reinvente.

Vendo o abismo, o poder concentrado do capital empurra o fascismo para o vazio - e é ali que eles se separam.

O fascismo, que atuou como a salvação do capitalismo, uma bem-vinda válvula para aliviar a insustentável pressão social que o sistema vai construindo com os anos, já não se faz mais necessário diante de uma sociedade em ruínas e de joelhos.

Agora, fascismo em queda livre, a elite econômica que o apoiava dá um passo atrás e se apresenta como a gestora da barbárie, a salvadora da pátria.

Magnânima e benevolente, aponta o dedo para o seu candidato ou para a sua candidata, aquele ou aquela que trabalharão para que nossas vidas sejam reconstruídas.

O caminho para a reconstrução está asfaltado, eles dizem.

Para que tenhamos o direito de interromper nosso sufocamento e andar por essa via precisamos apenas fazer empréstimos em seus bancos.

Tudo pré-aprovado.

A loucura de Bolsonaro serviu muito bem a essa classe até aqui. Mas a aliança com os dias contados.

E Bolsonaro, que de burro não tem nada, sabe.

Por isso ele está avisando que não sairá. Ou que só sairá morto.

Está avisando que não será preso porque no dia em que tentarem prendê-lo sai atirando feito um maluco para matar quem estiver por perto.

Está avisando que sua tropa civil, que ele armou legalmente com o incentivo das políticas liberais que colocam as tais liberdades individuais acima de qualquer coisa, fará o que for preciso ser feito para a fim de salvar o Brasil (do comunismo, dos nordestinos, das bichas, das lésbicas, das travestis, das trans, da Anitta, do funk, das artes cênicas, dos ETs, seja lá de quem mais não se parecer com ele e com os seus).

Aos olhos de todos, Jair está pedindo que seus fãs repitam em tom de culto: "eu juro dar minha vida pela minha liberdade".

O que ele seria capaz de fazer diante da certeza de derrota nas eleições?

As suspeitas de crimes cometidos por ele em quatro anos como presidente são tantas (desde sua atuação na pandemia até ataques ao processo eleitoral e ameaça de golpe de estado, passando por ações que já estão no STF como, por exemplo, a da sua declarada afeição ao crime de estupro) que, sem foro privilegiado, Bolsonaro não aguentaria muito tempo em liberdade.

Nesse cenário, o que ele seria capaz de fazer?

Talvez saibamos no desfile de sete de setembro, que, estranha e destrambelhadamente, ele transferiu da Presidente Vargas para a praia de Copacabana no Rio.

Talvez saibamos antes mesmo de setembro.

A jornalista Monica Bergamo apurou que Bolsonaro está transtornado com a possibilidade de ser preso em caso de derrota nas urnas.

O que um desesperado Bolsonaro seria capaz de fazer antes de deixar seu posto?

A essa altura da destruição, duvidar de Bolsonaro não é nem sensato nem justo.

Nunca foi, é verdade.

Mas em 2018 ainda havia algum espaço para chamar de imparcial os que fingiam ver na candidatura de um pária - que nunca escondeu seus desejos de morte e de extermínio - algum paralelo com Fernando Haddad.

Passou da hora de levar as coisas que Bolsonaro diz muito a sério.