Empresas apostam em estratégias para reduzir pegada de carbono

A crescente preocupação com a sustentabilidade está transformando a maneira como as empresas operam em todo o mundo. Conforme a consciência ambiental da população aumenta, a pressão sobre as organizações para adotarem práticas mais sustentáveis se intensifica. Nesse cenário, quantificar e reduzir a pegada de carbono torna-se essencial para o mundo dos negócios.

"Cada vez mais as empresas vão enfrentar resistência se não se comprometerem com processos produtivos que poluam menos, seja na hora de captar recursos em bancos ou mesmo do próprio consumidor", diz Roberto Gonzalez, consultor de governança corporativa e ESG (Ambientais, Sociais e de Governança) para empresas, professor universitário em cursos de pós-graduação e autor do livro "Governança Corporativa - o poder de transformação das empresas". "Portanto, quanto mais cedo se prepararem para isso, melhor será sua atuação no mercado."

A previsão é de que os investimentos das empresas em práticas ESG atinjam globalmente a marca de US$ 53 trilhões até 2025, de acordo com um levantamento divulgado no ano passado pela multinacional de tecnologia da informação Infosys.

O primeiro passo para qualquer empresa embarcar em iniciativas de sustentabilidade é conhecer sua pegada de carbono, ou seja, seu total de emissões de gases causadores de efeito estufa. Em outras palavras, seu impacto climático.

Isso envolve uma avaliação detalhada dos processos da empresa para identificar as fontes de emissão e quantificá-las. "Há outros gases de efeito estufa, como o metano e o dióxido nitroso, mas eles são traduzidos para o formato carbono para que se tenha uma métrica só", explica Marina Esteves, coordenadora de Projetos em Práticas Empresariais e Políticas Públicas no Instituto Ethos.

A tecnologia tem papel essencial na identificação das principais fontes de emissões nas cadeias de valor e na medição precisa da pegada de carbono. Isso pode ser feito por meio de softwares fornecidos por empresas como IBM e SAP, que utilizam modelagens matemáticas e análises de amostragem, garantindo uma verificação de precisão externa e independente.

Além da tecnologia, a criatividade é essencial para implementar medidas eficazes de redução de emissões e tornar os processos produtivos mais sustentáveis.

"Não há bala de prata: a empresa pode remodelar processos, expandir para outros nichos de mercado, diversificar a carteira", diz Esteves.

Eficiência energética

A Localiza, empresa de aluguel de carros, desde 2017 adota medidas para reduzir suas emissões, como o uso de energia solar e veículos flex. Parcerias com fazendas de energia solar em Minas Gerais, Rio de Janeiro e Pernambuco e a instalação de placas fotovoltaicas permitiram que a empresa alcançasse a marca de 100% de energia limpa e renovável em suas unidades de atendimento em 2022.

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Com a maior parte de suas emissões proveniente dos 600 mil carros de sua frota de aluguel, a empresa aposta na conscientização coletiva dos clientes para que façam a opção pelo etanol na hora de abastecer. Com a adesão em massa, seria possível reduzir a pegada em mais de 70%.

Por isso, passou a priorizar veículos flex, que hoje compõem cerca de 95% da frota. No entanto, passar para uma frota elétrica ainda não é viável. "Apesar de as expectativas serem boas, com novos fabricantes entrando no mercado e baixando o preço, o carro elétrico ainda é caro", afirma Daniel Linhares, diretor executivo do comitê de sustentabilidade.

Da mesma forma, a Unilever investiu em energia verde, reduzindo significativamente suas emissões de CO2. A maior fábrica de detergente em pó do Brasil, instalada em Indaiatuba (SP), acaba de completar sua transição para energia verde, com investimento de R$ 48 milhões. O projeto, em parceria com a ComBio, que atua com geração de vapor e energia elétrica com biomassa, garantiu a redução de 96% da emissão de CO2 da planta, o que representa cerca de 37 mil toneladas por ano.

Em Pouso Alegre (MG), uma outra fábrica da companhia é movida a biomassa de eucalipto certificado e conta com um biodigestor, que produz energia térmica renovável. "Essa combinação permitiu zerar as emissões no local, onde também tratamos 80% dos resíduos orgânicos de nosso processo produtivo", conta Suelma Rosa, diretora executiva de reputação e assuntos corporativos da Unilever Brasil e América Latina.

A Unilever também aposta na redução da pegada de carbono por meio da adoção de uma frota ecoeficiente. No ano passado, passou a utilizar seus primeiros veículos elétricos. E não se trata de qualquer tipo de automóvel: além de rodar pelas ruas, as vans conseguem manter a refrigeração dos sorvetes que transportam.

Até o momento, foram implementados 25 veículos, responsáveis por baixar 5,6% das emissões de CO2 relativas a transporte - a ideia é que essa redução chegue a 30% nos próximos 3 anos, contribuindo para a meta global da companhia, que é zerar suas emissões de escopos 1 e 2 até 2030. As emissões de escopo 1 são aquelas liberadas na atmosfera por resultado direto da atuação da empresa. Já as de escopo 2 são as emissões indiretas, causadas pelo uso de energia.

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Outra empresa atenta à pegada associada ao transporte é a Cargill. Em 13 de março, a gigante do agronegócio anunciou os resultados dos testes com um navio de carga movido a vento. A embarcação tem duas asas gigantes de quase 40 metros de altura que captam o vento e impulsionam o navio para frente, sendo capaz de economizar 3 toneladas de combustível por dia.

"Acreditamos que as tecnologias que aproveitam o vento podem ser uma forma importante e econômica de alcançar nossas metas de descarbonização a curto, médio e longo prazos", diz Jan Dieleman, presidente da área de Transporte Marítimo da Cargill.

De olho nos fornecedores

Além de reduzir suas próprias emissões, as empresas também estão de olho em seus fornecedores, responsáveis pelas emissões de escopo 3. A Vivo, por exemplo, identificou os 125 com maior pegada de carbono - dos setores de equipamentos eletrônicos (B2B e B2C), equipamentos de redes (energizados), materiais e serviços de rede, logística e transportes. Com esses dados em mãos, iniciou um trabalho de apoio e orientação para ações de melhoria.

"Conseguimos que 60% dessas empresas, que representam 82% das nossas emissões, estabelecessem ações climáticas, com a mensuração de impacto ou de medidas de redução de emissões ", diz Joanes Ribas, Diretora de Sustentabilidade da Vivo.

Em 2015, quando o Acordo de Paris foi definido, a Vivo definiu suas principais metas de sustentabilidade: trabalhar com 100% de energia renovável até 2030, reduzir em 90% as emissões do escopo 1 até 2025 e atingir 90% de redução de emissões do escopo 3 até 2040. As duas primeiras metas já foram batidas.

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"Em 2018, atingimos a primeira antecipadamente e, no ano passado, conseguimos reduzir em 90% nossas emissões, saindo de 264 mil toneladas para 25 mil toneladas", conta Joanes Ribas, Diretora de Sustentabilidade da Vivo. "Mas nosso grande desafio - na verdade, não só nosso, mas de qualquer setor - é o escopo 3."

Reflorestamento

Empresas como a Suzano estão investindo em reflorestamento para compensar suas emissões de carbono. Essa abordagem não apenas ajuda a reduzir as emissões, mas também contribui para a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas.

"Nós somos cultivadores de florestas: plantamos, colhemos e plantamos de novo", diz Sarita Severien, gerente de Mudanças Climáticas da Suzano.

Com quase 2 milhões de hectares de áreas de plantios de eucalipto voltados para a produção de papel, a premissa da empresa hoje é expandir sempre para áreas degradadas ou de pasto - nunca para florestas. Outro diferencial é contar com cerca de 1 milhão de hectares de conservação de matas nativas, com mais de 10 milhões de árvores já plantadas.

"Com isso, aumentamos o sequestro de carbono, que é o movimento de fazer o carbono ser adquirido pela floresta, contribuindo não só para a redução das emissões como também para tirar os gases de efeito estufa da atmosfera", diz Severien.

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