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Noah Scheffel

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Você ainda não encontrou o rumo da sua vida?

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Imagem: iStock

13/06/2022 06h00

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É muito interessante falar sobre rumos e destinos, quando desde pequenos temos a responsabilidade de trilhar um caminho para nossas vidas. "O que você quer ser quando crescer?", ressoa para todas as crianças com a mesma intencionalidade de não curiosidade, mas de uma cobrança implícita em uma pergunta disfarçada de curiosidade. E tantos outros símbolos vão reforçando esse compromisso com o futuro durante nosso desenvolvimento enquanto indivíduos.

E como pode a gente se comprometer com um futuro quando estamos vivendo, e entendendo, as complexidades do presente?

Quando era criança, eu era aficionado por bússolas. Nunca tinha chegado a refletir o motivo, mas se eu pudesse eleger um único item que me fascinava, seria esse. E eu buscava por bússolas em todas as oportunidades, fossem dos modelos tradicionais que eu, horas admirava em vitrines, hora tinha o raro privilégio de tê-la para mim e guardar com todo carinho dentro da única gaveta que eu tinha em meu quarto, fossem as feitas em copo plástico usando água e imãs nos trabalhos escolares.

Me encantava o fato de olhar para elas e elas apontarem uma direção. Haja o que houvesse, elas sempre encontravam essa certeza. O magnetismo e o "como" elas funcionavam me interessava, mas não eram esses os motivos da minha fascinação. E naquela época eu não procurava encontrar outras respostas, como o porquê delas serem tão importantes para mim, pois me bastava aquela resposta sempre certeira que era o apontar para um caminho.

O tempo passou, e as diferentes respostas que eu dei à pergunta do que seria ao crescer, se mostraram todas erradas. E em momentos tão impossíveis de serem controlados como os que vim enfrentando desde que me lembro, no que naquela época era "o futuro", atual presente, eu costumo repetir a frase "eu dei errado".

Mas ainda bem que sempre tem um "mas". Dia desses, em mais um daqueles que me parecia uma injustiça de uma vivência interminável de ir sem um fim, e refletindo sobre o desperdício de gastar energia pensando nesse ciclo que se retroalimenta justamente dessa minha indignação da falta de perspectiva deste não fim, a frase dita na música da cantora Nenny que tocava de pano de fundo desse meu sentimento de "desencontro" ecoou o seguinte: eu vou me perder, depois vou me encontrar. O nome da música? 'Bússola'.

Foi como se eu tivesse feito, naquele momento, o caminho inverso. Ao invés do caminho no presente em tentativa de encontrar o necessário futuro, eu fui desse distante futuro para o entendimento do passado. O meu passado. E eu fui diretamente para o instante em que minha mão encostava no puxador dourado daquela única gaveta, para abri-la e encontrar aquela que era minha bússola preferida, guardada cuidadosamente em sua caixinha.

E ali eu entendi a minha fascinação. Por mais que eu não tenha feito essa pergunta, eu encontrei a resposta de por qual motivo esse era meu item preferido dentre tantos outros que poderiam simplesmente representar uma infância presente. Eu encontrava nas bússolas o que me parecia a única certeza de rumo, de uma possibilidade de futuro para mim. E eu me agarrava a esta linearidade de tempo e caminho. A segurança que a bússola tinha de sempre confiar para onde apontava, me trazia conforto. Talvez eu pudesse ser uma bússola.

Da única gaveta, da única certeza de possibilidade de rumo, a frase da música desconstruiu um castelo de cartas dentro de mim que eu acreditava até então ser uma muralha. Não há uma linearidade de caminho, nem de tempo. E eu não dei errado por não ter sido igual a bússola. Eu me perdi incontáveis vezes, assim como eu também me encontrei tantas outras. E entender que é isso "o presente" foi um alívio. Foi libertar "o futuro" para que ele seja o que quiser, quando eu quiser que ele seja. E que todo esse processo não está preso a "únicos".

Como diz a mesma música, eu posso focar a bússola. E isso não quer dizer que eu vá conseguir alterar o magnetismo do planeta Terra e virar tudo tão de cabeça para baixo quanto parece o cenário daquele meu "presente", mas que eu posso ter vários caminhos e segui-los com a mesma confiança que meu item preferido da vida têm.

E assim eu fecho aquela única gaveta e volto para um novo presente, de múltiplas oportunidades de construção de futuros possíveis, onde eu reinvento o tempo e respondo a pergunta de "o que eu quero ser quando crescer" com a única coisa que ainda precisa ser uma certeza: eu quero ser eu.