Paula Gama

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Carro elétrico: quem serão os maiores prejudicados pela volta do imposto

A isenção de imposto de importação para carros elétricos - o que 'barateia' modelos a bateria em até 35% - está com os dias contados. Conforme apurado pela coluna, atendendo à pressão da indústria automotiva nacional, o governo federal estuda anunciar a volta de, pelo menos, uma parte da alíquota nas próximas semanas. As montadoras estão divididas sobre o tema: enquanto algumas comemoram, outras desaprovam a medida. Afinal, quem serão os maiores prejudicados?

A resposta pronta para a pergunta acima é: o consumidor final, é claro, que terá que lidar com aumento nos preços dos modelos e redução da concorrência. No entanto, é fato que algumas marcas saem mais prejudicadas do que outras.

As montadoras com fábricas no Brasil, por exemplo, defendem uma espécie de cota para importação isenta por parte de quem produz automóveis por aqui. Por outro lado, marcas de elétricos recém-chegadas, como BYD e GWM, argumentam que o mercado ainda é muito pequeno para a volta do imposto.

Para Cássio Pagliarini, sócio da consultora Bright Consulting, tudo depende do formato em que o imposto virá. "Se ele vier de forma muito gradativa e protegendo quem tem planos de fabricação no Brasil, essas empresas não serão impactadas. Mas se ele vier de forma equitativa, o que vai acontecer é atrasar a eletrificação no Brasil, porque tirando Toyota, Caoa e Land Rover, que produzem híbridos, nenhuma outra produz eletrificados no Brasil. Se o aumento da taxa for linear, de 10%, por exemplo, todas elas serão prejudicadas e aumentarão o preço de todos os eletrificados, o que vai diminuir a demanda", analisa.

Proteção à indústria nacional

Milad Kalume, diretor da Jato Informações Automotivas, explica que a América Latina vive uma verdadeira invasão de produtos chineses, principalmente em países menos regulamentados que o Brasil, como México e Chile. E que a indústria nacional está brigando para que o cenário não chegue até aqui.

"Os dois chineses que aportaram recentemente no mercado chegaram chegando. Posicionaram veículos com preço baixo para o segmento. Não dá para negar que causou um mal estar. A grande preocupação da indústria nacional é proteger o mercado dessas e de outras chinesas, mas isso vai impactar todos que importam carros para o país, o que inclui as marcas de luxo", opina.

Para Kalume, é provável que a taxação de carros híbridos, hoje em 4%, volte a 35%. E a dos elétricos, hoje zerada, será fixada em 20%. Se esse caminho for seguido, a beneficiada imediata será a Toyota, que produz o Corolla Cross no país e verá subir o preço do GWM Haval H6, hoje o mais barato da categoria.

A primeira disputa a ser impactada pela volta do imposto será entre Toyota Corolla Cross e GWM Haval H6
A primeira disputa a ser impactada pela volta do imposto será entre Toyota Corolla Cross e GWM Haval H6 Imagem: Divulgação
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"É mais barato fazer lá fora", diz presidente da Anfavea

A Anfavea, associação das montadoras que produzem carros no país, já confirmou que está de acordo com a solução encontrada pelo governo. Segundo Márcio de Lima Leite, presidente da entidade, no último ano o Brasil deixou de arrecadar R$ 2,2 bilhões com a redução do imposto - destes, R$ 1,1 bilhão são referentes a carros chineses.

"A China tem um custo de produção muito mais baixo que o nosso no Brasil. Então, esses veículos são, sim, uma ameaça. Temos conversado isso com o governo. O que temos hoje é 0% de imposto de importação sem data para acabar. É mais barato fazer lá fora do que nas nossas próprias fábricas, mesmo para montadoras que produzem no Brasil. Mas precisamos de uma regra de transição, ninguém quer chocar o mercado de uma hora para outra com mudanças abruptas", disse durante uma coletiva de imprensa.

A associação também pleiteia um regime de cotas de importação sem imposto para não prejudicar as montadoras de menor volume, ou seja, as de carros de luxo. "Elas precisam disputar com os chineses com o mínimo de competitividade, para que não haja uma enxurrada no mercado brasileiro", pontuou o presidente da Anfavea.

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Mercado ainda é incipiente

Na direção oposta da Anfavea está a ABVE (Associação Brasileira do Veículo Elétrico). De acordo com dados da entidade, em agosto, a venda de modelos eletrificados bateu um novo recorde mensal, com 9.351 emplacamentos - 25% acima do recorde anterior de julho (7.462) e 120% sobre agosto de 2022 (4.249).

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Em oito meses de 2023, o Brasil emplacou 49.052 eletrificados leves, praticamente o mesmo número de todo o ano anterior, 49.245. O total da frota de eletrificados leves em circulação no Brasil chegou a 175.491 veículos (janeiro 2012 a agosto 2023). Ou seja, apesar do crescimento rápido, o mercado ainda é muito pequeno comparado com os cerca de 2 milhões de modelos à combustão vendidos anualmente.

Segundo a ABVE, as vendas de veículos eletrificados no Brasil representam cerca de 2% do mercado. A proposta da associação é que a retomada da tributação ocorra a partir de 2025, quando esse percentual deve chegar a 6%.

De acordo com Ricardo Bastos, presidente da ABVE e executivo da GWM, a mudança da regra não será bem vista pelas marcas que ainda não estão produzindo no país. "Colocar em debate uma mudança de regras que reduz o acesso ao carro elétrico dá um sinal muito ruim para as marcas que estão aqui, e para quem está estudando o mercado. Não é legal falar em mudança de regra enquanto não se tem a tecnologia dominada no país", opina.

Sobre o tema, o presidente da JAC Motors - que só vende veículos eletrificados no país -, Sérgio Habib, pontuou à coluna que, em países com renda per capita semelhante ao do Brasil, como a Tailândia, o mercado de elétricos, via de regra, representa menos de 1% do total de venda de veículos. Por lá, o governo deu um incentivo de 5 mil dólares para quem comprasse modelos a eletricidade, então, passou para 3%. Ainda assim, um percentual pouco expressivo.

"Os carros puramente elétricos representam menos de 0,5% do total de vendas de veículos do país, e vai continuar assim por muito tempo. A Anfavea é essencialmente protecionista, sempre foi. Mas quando o assunto é carro elétrico não tem de quem se proteger. O volume é muito baixo".

A BYD também já se posicionou sobre o assunto, dizendo que "o segmento de veículos elétricos é muito recente no Brasil e ainda não possui maturidade e volume suficientes para se consolidar de imediato no mercado. Representa um importante instrumento de modernização da própria indústria automotiva e não podemos dizimá-lo antes que consiga a sua própria sobrevivência".

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A Volvo, que vende apenas carros eletrificados e não tem planos de produzir no país, diz que prefere não se pronunciar neste momento de indefinições.

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