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Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


Ela se casou 44 dias após operar tumor cerebral, com 73 pontos na cabeça

Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Therrie

Colaboração para VivaBem

05/06/2022 16h00

A coach e programadora neurolinguística Daiene Berdoldi, 39, descobriu um tumor maligno no cérebro quando estava prestes a se casar. Ela cancelou tudo para fazer a operação e adiou o sonho de celebrar a união com o noivo junto dos amigos. Porém, como a recuperação da cirurgia foi melhor do que o esperado, conseguiu realizar o casamento no mesmo dia e local que tinha planejado antes. A seguir, Daiene conta como foi sua luta contra o câncer:

"Os primeiros sinais de que tinha um câncer cerebral foram as convulsões, mas não eram aquelas que a gente logo associa a uma pessoa passando mal no chão. Eram diferentes, eu tinha visões parciais que eram reais, mas que não estavam acontecendo naquele momento, eram memórias recentes.

Um desses episódios foi uma vez em que tinha passado o dia inteiro mexendo na planilha do Excel do casamento. À noite, meu noivo me perguntou alguma coisa sobre o buffet, olhei para ele e do lado de sua cabeça apareceu a planilha do casamento flutuando no ar. Simultaneamente a isso, senti um mal-estar e calafrios. Fiquei assustada, mas como estava cansada, imaginei que fosse algo da minha cabeça.

Daiene Berdoldi - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Outro exemplo de convulsão aconteceu durante uma reunião do trabalho. Estava ouvindo todo mundo falar, gritar e do nada o som sumiu. A sensação era como se eu estivesse assistindo à cena de uma TV no mudo.

Também teve uma situação em que eu tinha acabado de conhecer uma pessoa que lembrava a fisionomia de um conhecido. À medida que eu estava falando, as imagens do rosto das duas pessoas se mesclavam e isso me gerava dúvidas. Eu não sabia com quem, de fato, estava conversando.

Já estava perdendo a visão e noção periférica há algum tempo, mas a constatação de que havia algo de errado e estranho comigo veio após eu receber uma multa de trânsito por ter passado no farol vermelho —fazia anos que eu não era multada. Certamente, passei no farol fechado sem me atentar, foi aí que percebi que estava colocando em risco a minha vida e a de outras pessoas e decidi procurar por um médico.

Em novembro de 2019, passei com o neurologista e expliquei tudo o que estava acontecendo. Ele disse que aqueles episódios que eram um tipo de convulsão. Solicitou alguns exames para investigar o problema e me disse que, se tivesse que apontar um diagnóstico naquele instante, diria ser um tumor cerebral. Não acreditei, mas confesso que fiquei preocupada.

A confirmação

Daiene Berdoldi, cirurgia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Daiene fez a operação no dia 30 de janeiro
Imagem: Arquivo pessoal

No dia 27 de dezembro fiz a ressonância magnética, notei que os médicos que fizeram o exame ficaram desconfortáveis com o que viram, mas eles não falaram nada, disseram para eu aguardar o resultado, no dia 4 de janeiro.

Na véspera, acordei angustiada. Fui ao laboratório e consegui pegar o resultado. Ao abrir, não acreditei no que li: "tumor cerebral primário infiltrativo e expansivo". O câncer já recobria 25% do meu cérebro, atingindo principalmente o lado direito e expandindo para o lado esquerdo. Na hora, travei e entrei em choque. Depois, quando cheguei em casa e contei para o meu noivo à época, desabei de chorar.

Na consulta, o oncologista confirmou o diagnóstico e disse que o meu caso era cirúrgico. Em um intervalo de três semanas e meia, passei com quatro neurocirurgiões para ouvir opiniões diferentes —o penúltimo foi extremamente grosseiro comigo.

Perguntei quando ele poderia me operar, pois estava preocupada com o casamento, marcado para o dia 14 de março de 2020. Contei que já estava com tudo contratado e fechado, incluindo a lua de mel.

O cirurgião disse: 'Esquece isso, pode desmarcar o casamento. Você está agitada demais. O que vai matá-la não é o seu tumor, é a sua ansiedade'. Fiquei chateada com o comentário e com outras condutas dele, e troquei de médico.

O quarto neurocirurgião me acolheu e me tratou de forma mais humana, mas disse que, como não sabíamos como seria a cirurgia nem o tratamento, o mais recomendado seria adiar o casamento.

Fiquei arrasada. Eu e o Marcos estávamos juntos há quatro anos, morando na mesma casa há três. Formalizar a união junto aos nossos amigos e familiares era um sonho. Mas, em comum acordo, decidimos cancelar tudo até que eu ficasse bem.

Além disso, a descoberta do tumor veio em uma fase em que estava no auge da minha carreira, aos 36 anos de idade. Sou médica veterinária formada, mas atuo como coach e programadora neurolinguística e tenho uma empresa de consultoria e gestão de pessoas. Minha empresa estava 'voando', eu tinha dobrado o faturamento e estava abrindo novas turmas.

A operação

Daiene Berdoldi, pontos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Daine levou 73 pontos na cirurgia
Imagem: Arquivo pessoal

Fiz a cirurgia no dia 30 de janeiro. Os médicos tiraram de 70% a 80% do tumor e tentariam eliminar o restante com o tratamento oncológico. Tive algumas convulsões no pós-operatório e depois nunca mais. Minha recuperação foi tão rápida e surpreendente que o médico me liberou para remarcar o casamento antes de começar a radioterapia.

Tive uma conversa séria com o Marcos e perguntei se ele realmente queria isso. Eu tinha um câncer cerebral, não queria que ele carregasse esse fardo. Ele respondeu: 'Eu caso com você careca, de peruca, de cadeira de rodas, se tiver que te carregar até o altar, eu carrego. Tudo o que quero é casar com você'.

Quarenta e quatro dias após fazer a cirurgia, casei com 73 pontos na cabeça (2 infeccionados) e uma cicatriz enorme. A cerimônia ocorreu exatamente no mesmo dia e lugar que estava marcada antes da operação, do jeito que planejei desde o início.

O casamento representou a celebração do meu renascimento, da minha vida, foi maravilhoso"

Daiene Berdoldi, casamento - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Em abril, iniciei a primeira das 30 sessões de radioterapia e fiz 12 ciclos de quimioterapia oral. Meu tratamento deu certo devido à forma positiva como eu encarei. Perdi metade do cabelo, sofri com os efeitos colaterais, fiquei enjoada, indisposta, sonolenta, dei uma pausa no trabalho, mas sempre foquei na solução e não no problema, visava o resultado final.

Ao receber o diagnóstico, virei minha própria coach, usava as ferramentas de coaching como a ponte para o futuro. Eu me visualizava recuperada, trabalhando, atendendo meus clientes. Também usava a programação neurolinguística: treinava as várias vozes internas que eu ouvia e tentava entender qual mensagem positiva elas estavam tentando me dizer. Além disso, cuidava da minha alimentação e praticava atividade física.

Daiene Berdoldi - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Em meio a esse processo, lancei meu primeiro livro, 'Por trás da cicatriz', cujas primeiras páginas foram escritas no hospital poucos dias antes de operar. O livro é um legado, uma fonte de inspiração para ajudar as pessoas nos momentos desafiadores da vida delas. Nele, narro a minha trajetória e o dedico ao meu parceiro e alicerce, o Marcos.

O título do livro é inspirado no orgulho que eu tenho da minha cicatriz na cabeça, ela representa um processo que foi doloroso, mas também de muitos significados e aprendizados. O câncer no cérebro me ajudou a ressignificar as minhas prioridades, a falar mais 'não' para os outros e mais 'sim' para mim, a tomar decisões mais assertivas, a viver mais intensamente e a me amar em primeiro lugar."

Tumor cerebral: tipos, sintomas e tratamento

1 - Quais os tipos de câncer cerebral?

Segundo Daniel Cubero, médico oncologista do Centro de Oncologia CEON+ e professor assistente da Faculdade de Medicina do ABC, o cérebro é formado por várias células com diferentes funções. Cada tipo de célula pode dar origem a um câncer diferente.

Entre os mais comuns estão aqueles originados nas células da glia, responsáveis por sustentar, proteger e nutrir os neurônios —a este grupo de tumores damos o nome de gliomas. Outro câncer frequente é o meningioma, que tem origem nas células das meninges, membrana que reveste o cérebro.

É importante diferenciar os cânceres cerebrais daqueles originados em outras partes do corpo. "Neste caso, chamamos de metástases cerebrais, que têm tratamento e prognóstico diferentes dos tumores que se originam no cérebro", diz Cubero.

2 - Quais as causas?

A maioria dos tumores cerebrais é esporádica, não havendo até o momento causas claras, fatores de risco ou doenças genéticas familiares conhecidos. No entanto, algumas famílias com doenças genéticas raras podem estar mais propensas ao desenvolvimento de câncer cerebral.

3 - Quais os sintomas?

No início, os tumores cerebrais não provocam sintomas. À medida que o câncer cresce e comprime as estruturas ao seu redor, pode provocar dores de cabeça persistentes e progressivas, além de convulsões.

"Outras manifestações dependem da localização do câncer no cérebro, podendo aparecer distúrbios visuais, alterações do equilíbrio e de memória ou falta de coordenação motora", diz o oncologista Daniel Cubero.

4 - O câncer cerebral causa diferentes tipos de convulsão?

Sim. As convulsões podem ser parciais, quando apenas uma parte do cérebro é afetada, ou generalizadas.

As convulsões parciais podem se manifestar como alucinações visuais, auditivas ou contrações involuntárias de partes do corpo. Já nas convulsões generalizadas, o indivíduo perde a consciência e sofre contrações musculares generalizadas por alguns minutos. As convulsões ocorrem porque a área doente do cérebro passa a enviar impulsos elétricos que estimulam todo o restante do órgão, como em um "curto-circuito".

5 - Como é feito o diagnóstico?

É realizado por meio de exames de imagem, principalmente a ressonância nuclear magnética. Quando presentes, os tumores cerebrais aparecem de forma clara nesse exame.

6 - Como é o tratamento?

A base do tratamento dos cânceres cerebrais é a cirurgia, exceto em subtipos raros como o linfoma, onde a intervenção cirúrgica não costuma trazer benefício.

Uma vez que as estruturas cerebrais são muito delicadas e nobres, a remoção do câncer deve ser feita com a maior margem de segurança possível, havendo risco de sobrarem células tumorais. Por essa razão, muitas vezes o tratamento local é complementado com a radioterapia.

Já a quimioterapia, considerada um tratamento sistêmico, é capaz de chegar através do sangue a todos os tecidos, inclusive em áreas contaminadas com células tumorais que não podem ser detectadas pelos exames de imagem.

7 - Quais sequelas uma pessoa com câncer cerebral pode ter?

As sequelas do tratamento vão depender do tamanho e da localização do tumor inicial. "Felizmente, em boa parte dos casos as áreas mais nobres e essenciais do cérebro não estão comprometidas. Sendo assim, é possível que o paciente permaneça apenas com a cicatriz na pele e as questões psicológicas relacionadas ao processo", diz Daniel Cubero.

Entretanto, perda de memória e até velocidade de raciocínio podem ser consequências do tratamento. Em casos mais graves, déficits motores, alterações de coordenação motora e equilíbrio também podem ocorrer.

8 - O câncer cerebral tem cura?

Muitos subtipos de câncer cerebral têm remissão, especialmente os chamados tumores de baixo grau (menos agressivos) e os casos mais iniciais. Mas mesmo nos casos mais avançados e com subtipos mais agressivos, existem tratamentos que permitem que o paciente viva com qualidade por um bom tempo.