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Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Brinquedos são fundamentais para o desenvolvimento infantil; saiba por quê

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Bruna Alves

Do VivaBem, em São Paulo

07/07/2021 04h00

Resumo da notícia

  • Antigamente, os brinquedos eram vistos apenas como um passatempo, algo sem necessidade. Mas hoje a realidade é outra
  • Especialistas concordam que eles são peças fundamentais para o desenvolvimento das crianças em diversas áreas
  • O mundo do "faz de conta", no qual as crianças imaginam que estão vivenciando determinadas situações, estimula a criatividade e vários outros fatores
  • Quanto mais a criança tiver que pensar, imaginar, memorizar, criar estratégias, lidar com suas frustrações, melhor será o seu desenvolvimento

Por muito tempo, os brinquedos foram vistos apenas como uma distração para as crianças, uma forma de mantê-las entretidas, enquanto os adultos faziam suas atividades. No entanto, análises do psicólogo russo Lev Semenovitch Vygotsky (1896-1934) ganharam destaque a partir do século 20, ao mostrarem que brinquedos são fundamentais para o desenvolvimento infantil.

Entre outros temas, Vygotsky escreveu sobre o avanço da capacidade cognitiva da criança ao brincar e ressaltou as interferências do contexto social ao qual ela está inserida. Segundo o pensador, que hoje é reconhecido por especialistas do mundo inteiro, as crianças têm mais dificuldades de desenvolvimento quando não são estimuladas a brincar desde cedo.

Deborah Kerches, neuropediatra, coordenadora e professora de pós-graduações do CBI of Miami, membro da Abenepi (Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil e Profissões Afins), da SBNI (Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil) e da Associação Francesa La Cause Des Bébés, cita diversos benefícios conquistados pelas crianças por meio dos brinquedos:

  • Experimenta situações diferentes;
  • Processa informações;
  • Planeja;
  • Executa ações;
  • Organiza suas emoções;
  • Constrói autonomia e independência;
  • Trabalha a atenção, concentração e memória;
  • Aprende a seguir regras;
  • Enfrenta desafios;
  • Lida com as frustrações;
  • Aprende a compartilhar;
  • Reforça vínculos com seus familiares e pessoas próximas.

O ato de brincar, vale lembrar, está previsto no ECA (Estatuto da criança e do Adolescente), ou seja, é um direito da criança.

A imaginação começa a se intensificar a partir dos três anos, dependendo da criança - iStock - iStock
A imaginação começa a se intensificar a partir dos três anos, dependendo da criança
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O "mundo do faz de conta" ajuda a criarem autonomia

Atualmente, a brincadeira é tida como uma ferramenta fundamental de aprendizado, expressão, comunicação e socialização. O famoso "mundo do faz de conta", um universo imaginário criado com a ajuda dos brinquedos, permite uma certa autonomia, já que ali, naquele mundinho, quem manda são elas.

"A fantasia pode mostrar como consentir e existir nesse mundo. Então ela é muito importante para o desenvolvimento da criatividade, espontaneidade e autonomia da criança. E é muito interessante, porque a partir desse faz de conta, a criança tem a necessidade de contar sua realidade, então nós conseguimos compreender o seu objetivo a partir dessa imaginação", avalia Yadja do Nascimento Gonçalves, psicóloga da pediatria do Hospital Universitário Walter Cantídio/Ebserh (CE).

O "faz de conta" ajuda no processo de desfralde, a se alimentar melhor, perder o medo de ir ao médico e de ir ao primeiro dia de aula. Por isso, de acordo com os especialistas, a imaginação, que normalmente começa a se intensificar a partir dos três anos, precisa ser respeitada, pois também é uma forma de preparo para várias habilidades, inclusive, acadêmicas, nas quais a criança usa a criatividade para fazer uma redação, por exemplo.

Kerches, que também é autora do livro "Compreender e Acolher - Transtorno do Espectro Autista na Infância e Adolescência", acrescenta que os brinquedos podem fazer com que os pais percebam algum atraso no neurodesenvolvimento dos filhos e busquem ajuda especializada precocemente.

Quanto mais cedo, melhor - iStock - iStock
Quanto mais cedo elas começarem a brincar, melhor
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"Por volta de um aninho, por exemplo, a criança já tem que saber a função do brinquedo, e tem crianças que ficam ali manipulando de maneira não usual, então pegam um carrinho e viram de ponta cabeça, ficam só rodando a rodinha, ou ficam movimentando um brinquedo só para cima e para baixo, sem qualquer sentido, ou nunca conseguem variar na brincadeira", exemplifica Kerches, ressaltando que "ali percebemos pistas muito importantes para avaliar uma criança".

Além disso, quando observamos uma criança brincar, é possível perceber algum sentimento que ela não consegue nomear. Lucas Alves, neurologista infantil do IMIP (Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira), do Hospital da Restauração e do Hospital das Clínicas/ Ebserh da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), diz que a brincadeira vai além dessa questão da recreação, é uma dinâmica completa onde a criança pratica a comunicação com ela mesma e com o mundo ao seu redor. "Por isso que nós preconizamos muito o brincar das crianças para o desenvolvimento neurológico".

Não precisa gastar tanto para ver a alegria de uma criança - iStock - iStock
Não precisa gastar tanto para estimular o brincar
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Incentive seu filho a criar o próprio brinquedo

É só entrar com uma criança em uma loja de brinquedos para ver os olhinhos brilharem. Normalmente indecisas, elas querem levar vários brinquedos com altas habilidades: que anda, fala, corre, tem som. No entanto, tudo isso tem um preço, e não é barato. Mas a pergunta é: os brinquedos mais caros realmente são os melhores? Quem nunca viu uma criança pequena ganhar uma boneca e brincar mais com a caixa e o embrulho do que com a própria boneca?

Segundo os especialistas, é importante deixar as crianças criarem seus próprios brinquedos com produtos recicláveis ou brinquedos que permitam explorar a imaginação. Em outras palavras: o dinheiro não faz com que os pequenos se desenvolvam mais, ao contrário, quanto mais facilidade, menos criatividade.

Mas veja bem, isso não significa que é ruim dar brinquedos para as crianças, mas é importante optar por aqueles que vão trazer algum benefício. Hoje em dia há várias lojas com brinquedos educativos para diferentes faixas etárias, e conhecer esse universo pode ser uma boa opção.

O hábito de usar eletrônicos traz muitos prejuízos para o desenvolvimento das crianças - iStock - iStock
O hábito de usar eletrônicos traz muitos prejuízos para o desenvolvimento das crianças
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Cuidado com eletrônicos

Não é segredo para ninguém que o excesso de tela faz mal para as crianças. No entanto, os especialistas alertam que cada vez mais cedo elas estão tendo acesso a celulares, tablets e televisão, com os quais trocam o mundo real pelo virtual.

Mas vale ressaltar que a OMS (Organização Mundial de Saúde) lançou um guia recomendando que crianças de até dois anos não tenham nenhum contato com qualquer tipo de tela. Já as que têm entre dois e cinco anos podem ser expostas por no máximo uma hora por dia.

A SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), por sua vez, reforçou a recomendação da OMS e acrescentou que crianças com idades entre seis e 10 anos podem ficar entre uma ou duas horas por dia em frente às telas. "Quanto mais as crianças usam eletrônicos, menos elas brincam naturalmente e deixam de estimular os sentidos", alerta o neurologista infantil do Hospital das Clínicas da UFP.

Para os que têm até dois anos de idade, por exemplo, os brinquedos acabam sendo um objeto de intermediação entre os pais e a criança, uma forma de aproximá-los. Os coloridos, que têm luzes, emitem som, chamam muito a atenção dos bebês, que estão descobrindo o mundo. "O aprendizado da criança nos primeiros anos de vida se dá essencialmente pelas vias sensoriais e pela experimentação de todos os sentidos. Então tem que ser em 3D: eles querem pegar, cheirar, levar à boca, sentir o peso", comenta Kerches.

A partir dos dois anos começa a fase do "faz de conta". Durante esse período, surgem os pequenos cozinheiros, castelo de princesas, motoristas, heróis, médicos.

A partir dos cinco vem os quebra-cabeças, jogos de memórias, blocos para montar, jogos de tabuleiro, e por aí vai. Cada fase é um novo universo que a criança está descobrindo, e os brinquedos fazem parte de todas. "A gente pode ensinar absolutamente tudo através do brincar", diz Kerches.