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Pandemia mudou Natal: como será passar sem festa e lidando com luto?

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Imagem: iStock

Roseane Santos

Colaboração para o VivaBem

24/12/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Muitos passarão as festas de fim de ano afastados de suas famílias, mas é possível amenizar problema
  • Estar próximo, mesmo que por uma ligação ou chamada de vídeo, traz mais conforto e diminui sofrimento
  • Mas também que é preciso aceitar o momento anormal que estamos passando, e não ficar imaginando o que poderia ser

Neste Natal, duas situações delicadas podem ocorrer: algumas pessoas não poderão encontrar a família, por conta do isolamento social, enquanto outras ainda estão aprendendo a conviver com a perda de um ente querido.

"O afeto e o abraço vão ser diferentes, mas precisamos manter esse afago. Sentir falta disso tudo vai deixar uma mudança para os Natais futuros também", diz o psicoterapeuta Leonardo Morelli, mestre em psicologia pelo Centro Ericksoniano do México e com especialização em psicoterapia ericksoniana pela The Milton H. Erickson Foundation (EUA).

De acordo com ele, os valores da festa natalina mudaram. "Valorizávamos muito almoços, jantares, trocas de presentes, mas podemos dizer que o abraço é hoje o presente mais caro (e que talvez não fosse tão valorizado). Mas é preciso lembrar que estar presente nem sempre significa estar fisicamente no mesmo espaço", diz.

A psicóloga Renata Silva, 46, está nessa situação. Pela primeira vez, ela vai passar o Natal longe da família, por conta da pandemia. "Primeiro pensamos em combinar um isolamento mais radical 15 dias antes, para que todos estivessem bem nessa data, mas isso não seria possível para todos. Decidimos então não nos reunir, porque meus pais têm comorbidades, como pressão alta e diabetes. Passarei, a princípio, eu e meu marido. Estamos planejando uma reunião virtual", diz.

Algo parecido acontecerá com o redator publicitário e escritor Henrique Machado, 52. Ele se separou há poucos meses e agora mora apenas com a filha, que planeja passar o feriado com a família, no interior. Neste ano, o Natal será solitário. "Não penso em passar com amigos, tenho uma cardiopatia e pressão alterada que já me renderam três AVCs isquêmicos. Não quero arriscar, melhor ficar vendo filmes e séries".

Morelli diz que é preciso aceitar o momento anormal que estamos passando, e não ficar imaginando o que poderia ser, pois isso traz sofrimento. "É necessário encarar e fazer o melhor possível dentro dessa realidade. É possível dar abraços virtuais! No momento de crise, a gente tem que ser criativo".

O psicoterapeuta sugere usar as redes sociais para gravar mensagens de vídeo para os familiares, fazer a ceia de Natal cada um na sua casa, mas conectados de alguma forma. "É possível até fazer amigo-oculto à distância, enviando os presentes um pra casa do outro, mandando um vídeo especial para um amigo secreto do grupo. O que a gente valorizava antes não tem tanta importância, vamos viver o Natal pelo que ele é", diz.

Lugar vazio

A jornalista Lucia Souza, 50, não sabia o que era morar sozinha até novembro deste ano. Naquele mês sua mãe morreu em decorrência de uma parada cardíaca e em menos de uma semana depois, perdeu um primo pelo câncer. "Decidi passar o Natal só, não tenho vontade de ir para lugar nenhum e já peço desculpas aos meus amigos, porque esse ano não ligarei para todos, desejando boas festas. O máximo que vou fazer é ver televisão e dormir", conta.

O psicólogo Christian Kristensen, professor titular do Programa de Pós-Graduação em psicologia da PUCRS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), explica que com a proximidade do Natal e Ano Novo, e devido a todo simbolismo que envolve esta época do ano, é natural que as pessoas enlutadas possam experimentar sentimentos mais intensos relacionados à perda.

Entretanto, ele diz que o ideal seria se manter próximo de alguma forma das pessoas que se ama, mesmo que de forma virtual. "Particularmente neste contexto da pandemia de covid-19, com todo o distanciamento social, é importante considerarmos formas de nos mantermos conectados a elas. A conexão emocional é mais do que apenas uma chamada de vídeo (embora isso seja importante), é uma atitude de disponibilidade afetiva".

Segundo Kristensen, o ideal é se mostrar disponível para escutar e acolher, ou mesmo permanecer em silêncio, quando a pessoa não sente vontade de conversar. É exercer empatia, procurando se colocar no lugar da pessoa que está elaborando a perda, colocar-se disponível para resolver problemas de ordem prática, como tarefas do cotidiano, oferecer, de forma respeitosa e não invasiva, opções de atividades.

Por outro lado, deve-se cuidar para não minimizar a dor ou o sofrimento da pessoa que está passando por este processo. "Ainda que a intenção de ajuda seja genuína, frases como 'há coisas piores na vida' ou 'não se preocupe, isso logo vai passar' não são recomendadas", diz.