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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Grupos virtuais ajudam saúde mental de pacientes: "Relatos reduzem solidão"

nadia_bormotova/Getty Images/iStockphoto
Imagem: nadia_bormotova/Getty Images/iStockphoto

Roseane Santos

Colaboração para o VivaBem

24/10/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Pessoas com doenças físicas ou psicológicas criam grupos virtuais para troca de informações e experiências
  • Os grupos dão amparo emocional e podem ser importantes para os pacientes não se sentirem sozinhos
  • Entretanto, é preciso cuidado com o que se posta e acredita dentro desses grupos, já que informações errôneas podem circular
  • Moderar postagens é essencial para não atrapalhar o tratamento indicado pelo especialista

A aposentada Águeda Nunes, 59, viu sua vida mudar em abril de 2013, quando escutou o diagnóstico do câncer de mama. Ela sentiu a necessidade de conversar, mas queria dividir sua angústia com pessoas que realmente pudessem entender o que estava passando. Além de procurar o apoio de amigos, ela também resolveu criar uma página no Facebook para trocar experiências sobre o assunto.

Assim, surgiu o grupo "Câncer de Mama - Um desafio", onde atualmente mais de sete mil mulheres compartilham informações sobre o tema na rede social. "Eu me sentia sozinha, única e me perguntava se iria sobreviver ou se estava sentenciada. Criei essa página não para ter um apoio médico, e sim um apoio entre iguais", diz Águeda.

Muitos se sentem mais à vontade conversando virtualmente sobre assuntos relacionados a um conflito ou uma doença. Por esse motivo, pacientes formam grupos nas redes sociais com o objetivo de desabafar e adquirir mais conhecimento sobre o distúrbio.

Você não está sozinho

O psicólogo Oswaldo Rodrigues, mestre em psicologia social pela PUCSP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), analisa que iniciativas como a de Águeda têm um aspecto positivo. "Os indivíduos se sentirão amparados emocionalmente. A sensação de bem-estar sempre será importante", diz.

É o caso da estudante Paula Gomes, 30, que tem TOC (transtorno obsessivo-compulsivo). Ela está em um grupo de Whatsapp sobre o transtorno e se descreve como muito participativa nos debates entre os membros. "Acho que os relatos das pessoas que passam o mesmo que você diminui a sensação de solidão. Consigo conversar sem precisar de todas as convenções sociais de interação".

Apesar dessa vantagem, Rodrigues alerta para alguns pontos não tão favoráveis. "Esses grupos tendem a manter as pessoas iguais, portanto, impedindo que se tratem realmente. Alguns participantes podem ter opiniões errôneas a respeito do que devem fazer, e se estes são os controladores do grupo haverá mais problemas, aumentando a ansiedade", adverte.

O psicólogo ainda diz que alguns comportamentos devem ser vistos com bastante cautela. "Uma pessoa que já tem a crença de que os tratamentos científicos não são adequados, tentará mecanismos fantasiosos, mágicos, infantis para se 'tratar'. Acreditar que o grupo solucionará a questão é um pensamento mágico que apenas produzirá mais problemas futuros. Pertencer ao grupo pode trazer a sensação de alívio e postergar um tratamento eficaz", diz.

Ronaldo Coelho, mestre em psicologia institucional pela USP (Universidade de São Paulo) diz que, como em qualquer outro grupo, o papel da moderação é fundamental. "Uma moderação focada na tarefa e objetivo de seus administradores se mostra muito mais interessante e com informações mais valiosas do que os grupos que funcionam como um espaço de livre circulação de discursos, opiniões e pessoas", diz.

Segundo ele, a moderação não se trata de privar a liberdade, mas sim de cuidar para que a discussão e repercussão de informações sejam cumpridas de acordo com o objetivo do grupo. "Se a tarefa é cuidar das pessoas de modo que haja uma troca de experiências e de informações relevantes e úteis, é isso que deve ser cuidado. O que está fora disso deve ser desconsiderado".

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Grupos virtuais dão apoio emocional a pacientes
Imagem: Andrea Piacquadio/Pexels

Reuniões com especialistas

Tanto Rodrigues quanto Coelho frisam que as conversas de pacientes em grupos virtuais não podem ocupar o lugar da terapia. "As reuniões de tratamento ou de apoio, sob orientação de um profissional de saúde que faça intervenções cientificamente comprovadas, são o que trará a possibilidade de solução. Um método precisa ser seguindo, sem ele, nada adianta, será um desperdício de tempo", diz Rodrigues.

Coelho diz que, no caso de terapias em grupo, a ideia não é somente colocar um monte de gente para falar dos seus problemas e "deixar a coisa acontecer". Na verdade, ela pressupõe uma metodologia de intervenção para o analista que é específica e diferente daquela utilizada na terapia individual. "Algumas correntes de pensamento defendem que a terapia em grupo são os laços sociais, os vínculos e os discursos produzidos pelo grupo que está em análise, e não as pessoas individualmente".

Segundo ele, neste caso, seria impossível um grupo de Facebook substituir um grupo que tem um analista que guie as sessões pautadas nos objetivos supramencionados. Contudo, os grupos de redes sociais que possuem uma boa e honesta moderação podem ter muito valor para seus participantes.